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Cultura política, democracia e hegemonia

Henrique Carlos de Castro - 2000
 

Uma tentativa de explicação do comportamento político não-democrático

Introdução

Quais as condições necessárias para a instalação e a manutenção da democracia em sociedades - como as latino-americanas - nas quais o capitalismo se constituiu tardiamente? Dito de outra forma, quais são as características políticas e sociais que devem possuir países periféricos no sistema político e econômico mundial para a instalação da democracia? Ou ainda, como explicar a existência de um comportamento político que combina comportamentos autoritários com atitudes democráticas? E qual o papel da Cultura Política nesse processo? Embora questões como essas venham tomando a atenção de diversos pesquisadores contemporâneos, as explicações para estes fenômenos geralmente ou têm se limitado à sua descrição no nível micro, sem apontar as suas causas, ou a explicações gerais, sem considerar evidências empíricas.

Há, no entanto, outro caminho, que parece ser o mais adequado: considerar simultaneamente aspectos macro e micro para a explicação. Desta forma, o presente trabalho se constitui em uma tentativa de unir perspectivas micro e macroanalíticas com o objetivo de: 1) explicar o comportamento político que combina uma baixa adesão manifesta a valores ligados a políticas concretas, a governos, a governantes, ou sua efetividade com uma alta adesão manifesta a atitudes relacionadas com as características subjetivas do sistema (participação, eleições periódicas, democracia, igualdade, entre outras); e 2) debater a institucionalização entre nós de uma concepção de democracia que privilegia a sua forma, em detrimento de seu conteúdo. As duas perspectivas acima, devido às suas características, são apresentadas como dois paradoxos que merecem ser estudados. O que se pretende assim é buscar uma explicação de Cultura Política para ambos os fenômenos.

A base de dados empíricos utilizada neste artigo faz parte da Pesquisa de Cultura Política do Centro Educacional La Salle de Ensino Superior. Esses dados foram coletados no município de Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, durante os meses de julho e setembro de 1996 e de julho de 1997. Foi utilizada uma amostra de cotas proporcionais, e as perguntas utilizadas objetivaram permitir a comparação dos resultados com os de outras pesquisas de Cultura Política. Já a análise macro baseou-se no conceito de hegemonia de Gramsci, resgatado com vistas a ajudar na explicação dos fenômenos.

Este trabalho se divide em três partes. Na primeira, são discutidos os conceitos de Cultura Política e de democracia utilizados; na segunda, são descritos dados das pesquisas empíricas e propostos dois paradoxos de comportamento político; na terceira, por fim, é apresentada a proposta de hegemonia como explicação, não apenas dos paradoxos, mas do comportamento político não-democrático.

Cultura Política: um conceito que evolui

O conceito de Cultura Política foi originalmente introduzido pela obra fundacional The Civic Culture: political attitudes and democracy in five countries, de Gabriel A. Almond e Sidney Verba, lançada em 1963. A tese que embasa todo aquele trabalho é a de que existe uma relação causal entre a opinião da população e a possibilidade de surgimento do sistema democrático e sua estabilidade. É importante considerar que essa hipótese subverte o caminho usual da análise política até então: segundo ela, o centro explicativo da política deixa de ser as instituições políticas e passa a ser o eleitorado, com suas atitudes e ações (Baquero, Castro, 1996; Castro, 1996).

Segundo Baquero e Prá (1992, p. 6), o conceito de Cultura Política se refere ao processo através do qual as atitudes dos cidadãos são estruturadas em relação ao sistema político (grifos meus). O pressuposto básico do conceito de Cultura Política é que existe um comportamento político e que ele pode ser conhecido pelo uso de pesquisas e técnicas específicas. Em suma, essas técnicas permitiriam o conhecimento do comportamento do eleitorado e, em conseqüência, das relações existentes entre as opiniões sobre a democracia e a estabilidade democrática.

Desde o seu surgimento, no entanto, o conceito e os pressupostos envolvendo Cultura Política têm sofrido uma série de críticas, não apenas por parte daqueles que não os aceitam, mas, sobretudo, e especialmente, de estudiosos que atuam no campo de conhecimento inaugurado por Almond e Verba. E a principal e mais séria crítica diz respeito aos pressupostos da obra The Civic Culture: a postulação de um determinado tipo de Cultura Política como requisito necessário e absoluto para a constituição e consolidação da democracia, no caso, a Cultura Cívica existente no Estados Unidos e na Grã-Bretanha (Pateman, 1989) [1]. Essa perspectiva não considera que as diferentes Culturas Políticas são fruto de diferentes experiências históricas e que não necessariamente caminham para a mesma conformação institucional. Além disso, coerente com a Ciência Política norte-americana da época do pós-guerra, Almond e Verba defendem a democracia liberal como modelo ideal de sociedade.

Podem-se citar ainda autores como Kurt von Mettenhein, que, em recente livro chamado The Brazilian Voter, em uma clara alusão ao clássico The American Voter, de Campbell, Converse e Stocks, utiliza de forma esquemática os conceitos originais de Cultura Política, sem uma mediação que permita a adequação às realidades brasileira e latino-americana. Livros como esse, não obstante sua importância pelo exaustivo trabalho de coleta de dados empíricos e de revisão, contribuem para que cada vez mais se consolide uma visão sobre a política (no caso, a brasileira) construída a partir e sob a ótica de valores científicos, políticos e culturais distintos dos nossos.

A proposição dos fundadores desse campo de conhecimento, porém, apesar das críticas (e mesmo autocríticas) posteriores, possui tal força argumentativa, que muitos dos estudiosos contemporâneos continuam a basear os seus trabalhos, mesmo implicitamente, na necessidade da constituição de uma cultura cívica nos moldes das encontradas por Almond e Verba em seu estudo de 1963 [2]. Como exemplos de estudos que caem nessa armadilha (ou a aceitam), devem ser citados dois importantes livros cuja análise se funda em vasta base de dados coletados respectivamente na Argentina e no Brasil: Argentina frente a la política, de Edgardo Catterberg, e Os brasileiros e a democracia: bases sócio-políticas da legitimidade democrática, de José Álvaro Moisés (Catterberg, 1991; Moisés, 1995). Ambos os autores nos livros citados analisam as Culturas Políticas de seus países utilizando basicamente variáveis atitudinais, limitando-se no fundamental ao modelo analítico proposto em The Civic Culture. Em suas conclusões, embora em sentidos diversos [3], Moisés e Catterberg encontram relações de causalidade entre democracia e Cultura Política, apontando dessa maneira para a necessidade de existência de uma cultura cívica.

Ainda que não haja um consenso na literatura pertinente, uma série de autores advoga a necessidade de ser feita uma adequação dos conceitos originais de Cultura Política, tornando-os mais próximos da realidade latino-americana (Turner, 1995). À conclusão semelhante chegaram Brown e Gray (1979), em outro contexto, ao estudar com seus colegas, na década de 70, a política dos países do Leste Europeu. Concluíram que há a necessidade de serem incorporados aspectos que contemplem crenças e valores subjetivos sobre o conhecimento e as expectativas políticas, que são produto da experiência histórica das nações e dos grupos políticos. Em outras palavras, como argumenta Street (1993), não basta serem verificadas as atitudes e as opiniões políticas de determinada sociedade para que se compreenda adequadamente o papel que a Cultura Política exerce sobre a ação política [4].

Essa preocupação também pode ser verificada entre autores brasileiros. A obra de Baquero, por exemplo, é uma tentativa de estudar a Cultura Política da América Latina a partir de uma visão distinta da encontrada em The Civic Culture. Com outros objetivos, mas abrindo caminhos para estudos de Cultura Política mais voltados para a nossa realidade, podem ser citados Schwartzman ou ainda Faoro, que, com diferentes enfoques, objetivos e conclusões, dão elementos para que se possa entender como os fatores da formação política, econômica e social do Brasil afetam as atitudes políticas nos dias de hoje (Baquero, 1994; Baquero, Prá, 1992; Schwartzman, 1988; Faoro, 1987).

Assim, o conceito de Cultura Política foi originado a partir de uma concepção normativa de sociedade baseada em um determinado tipo de experiência histórica vivenciada por determinados países. Dito de outra forma: o conceito original, além de ser etnocentrista, não consegue dar conta das realidades não consideradas em The Civic Culture. Mas, se as proposições de Almond e Verba não conseguiram dar conta das inúmeras realidades, inauguraram uma nova forma de analisar e explicar a política. A partir daí, a evolução do debate teórico sobre o tema, bem como a possibilidade e a disseminação de novos estudos empíricos, permitiram que hoje se possa falar em uma teoria de Cultura Política [5] que vai além da classificação proposta em 1963. Dessa forma, em vez de enquadrar as diferentes sociedades em uma tipologia construída a priori, os estudos de Cultura Política devem servir para que se construa uma compreensão da realidade que considere as diferentes experiências históricas.

Democracia: uma inteligente invenção [6]

Um dos centros das atenções dos estudiosos da política nas últimas décadas tem sido a democracia. E não poderia ser diferente, uma vez que a invenção democrática [7] foi fruto de um misto de proposição intelectual normativa, em certa medida idealista, com uma profunda ligação orgânica de seus fundadores com o mundo em que viviam. Nos países que foram gestores e berço desta construção simbiótica de capitalismo e democracia, como a Inglaterra e os Estados Unidos, esse sistema político faz parte do cotidiano das pessoas (não é por outro motivo que os dois países são os estereótipos da cultura cívica no modelo de Almond e Verba). A valorização do sistema democrático foi internalizada pelos cidadãos desses países, através de um sólido processo de socialização política.

A realidade latino-americana, entretanto, é substancial e historicamente diferente. Por exemplo, aqui o surgimento do capitalismo se deu sem que existisse uma base social, política, econômica ou ideológica de cunho liberal. Dessa forma, ao contrário do que acontece com os povos chamados desenvolvidos, a democracia liberal não é tão natural na América Latina. Não é sem fundamento, portanto, o questionamento das bases de legitimação da democracia em seu modelo liberal entre nós. As interrogações sobre o que se entende por democracia e quais são as condições e vias possíveis para a sua consolidação nos países latino-americanos têm produzido debates em múltiplas dimensões. Para resolver esse impasse, talvez a melhor solução seja a divisão analítica de democracia em duas perspectivas (não mutuamente exclusivas): uma, que prioriza seus aspectos formais ou suas singularidades; outra, que prioriza (ou centraliza a atenção em) o seu conteúdo.

Essa divisão foi utilizada em detrimento de outras talvez mais usuais, como, por exemplo, o binômio democracia majoritária-consensual (ou consociacional) de Lijphart (1984), ou a divisão minimalista versus maximalista, de Di Palma (apud Moisés, 1995), por parecer mais adequada a um estudo sobre a América Latina, onde a democracia como regra tem se restringido aos seus procedimentos, e por não sugerir a existência de um gradiente de democracia, quando o que parece ocorrer é, em realidade, uma dicotomia. Por outro lado, essa divisão analítica permite a constatação empírica dos paradoxos tratados neste trabalho, bem como a operacionalização do conceito de democracia, a partir de uma perspectiva de Cultura Política.

Em um extremo da divisão conceitual realizada, estão as concepções que entendem democracia como princípios a serem seguidos ou respeitados. Para elas, mais que saber ou estudar como funciona uma democracia real ou procurar listar requisitos mínimos que a caracterizariam, importaria definir ou caracterizar os seus limites substantivos. Dito de outra forma, a democracia não se limitaria à existência de determinadas regras, procedimentos e ritos, mas fundamentalmente à qualidade a ela inerente.

Dentro dessa perspectiva, democracia não poderia receber qualquer tipo de adjetivação: ou a sociedade seria democrática, ou não. Assim, com base nessa concepção, de forma alguma se poderia pensar na existência de uma democracia relativa (eufemismo criado durante o regime militar brasileiro), na qual algumas regras, procedimentos ou princípios estivessem sendo respeitados em detrimento de outros. É possível, defendendo a mesma perspectiva, argumentar em sentido exatamente inverso, como faz Augustín Cueva (1988): a democracia realmente existente necessitaria de qualificativos para dar-lhe um real conteúdo, como, por exemplo, através da sua vinculação com o Estado de Bem-Estar.

Uma outra característica deste enfoque de democracia como conteúdo (na realidade, seu corolário) é o entendimento de que ela é um meio de resolução de problemas políticos, não um fim em si: ao serem enfatizadas a tecnologia eleitoral, as instituições e os procedimentos formais, se estaria invertendo esta premissa.

No outro extremo da divisão proposta, encontramos a democracia como forma. O termo forma é utilizado aqui como Bobbio (1989, p. 157-8) o empregou, ou seja, limitando o conceito de democracia basicamente às suas regras, aos seus procedimentos e aos seus ritos. Assim considerada, a democracia nada mais seria que um conjunto de regras (primárias ou fundamentais) que estabelecem quem está autorizado a tomar as decisões coletivas e com que procedimentos (grifos do autor).

Joseph Schumpeter, por sua vez, escreveu um profundo tratado, no qual realiza uma crítica à concepção clássica de democracia. Para tanto, utilizou conceitos de sociologia política que os autores clássicos desconheciam, como socialismo e classes, entre outros. Em seu trabalho, fica implícita a necessidade de operacionalização do conceito de democracia, ao vincular uma determinada forma (de adquirir o poder) a uma determinada função (tomada de decisões políticas). Nesse sentido, a questão de forma toma relevância por ser um modo (institucional) de resolver uma função, cuja necessidade de resolução, de sua parte, independe das regras que a sociedade adota para a sua consecução. Dito de outra forma, o conceito de democracia estaria intrinsecamente ligado a uma opção social. E conclui quando se refere ao método democrático, enfatizando que não existe [...] nenhuma razão geral contra ou a favor dele (Id., p. 352). Ou seja, o que caracterizaria a democracia seria o método democrático, e não seus aspectos substantivos.

Outro autor que se preocupou com a democracia enquanto forma foi Robert Dahl (1956), que sintetizou o conceito de democracia em uma série de princípios. Rebatizando-a de poliarquia, Dahl constrói uma definição de democracia que ao mesmo tempo a caracteriza e operacionaliza.

Será, contudo, outro autor - Anthony Downs (1957, p. 23) - que irá tratar a democracia essencialmente como sua forma. Downs, para evitar premissas éticas, irá definir democracia pela enumeração de certas características, as quais evidenciam que os procedimentos e as regras do jogo são, para o autor, o que a singulariza. Assim vista, ela existiria se uma série de condições fosse satisfeita. Diferentemente de Robert Dahl, portanto, Anthony Downs não postula a possibilidade de níveis de democracia, mas tão-somente considera sua existência ou não, se atender aos requisitos absolutos que enuncia. Não existe em Downs espaço para qualquer tipo de debate sobre o conteúdo da democracia: uma sociedade é democrática ou não é, bastando para tanto cumprir determinadas condições.

O importante a ser considerado nesses autores é que, em menor ou maior grau, manifesta ou latentemente, de modo proposital ou não, todos eles contribuíram para a criação de uma concepção de democracia que a trata essencial ou principalmente em sua forma, procurando considerá-la (alguns de modo explícito) como um método universal (Coutinho, 1980).

A relação entre cultura política e democracia

Desde os estudos que pretendiam encontrar uma causalidade entre desenvolvimento econômico e construção da democracia na década de 60, passando pela teoria da dependência dos anos 70, sempre esteve subjacente ao debate acadêmico sobre a democracia na América Latina a indagação sobre quais são os reais pré-requisitos para a sua instalação e estabilidade (Smith, 1995).

O fato de ser um assunto muito estudado não significa que haja consenso em relação à importância da opinião pública para o estabelecimento e a manutenção de instituições políticas democráticas: além dos pesquisadores que não encontram evidências de uma relação (causal ou não), há aqueles que simplesmente desconsideram a própria possibilidade de sua existência.

Esse é o caso de Susan Tiano. A partir de consagrado trabalho quantitativo no qual analisa a Cultura Política na Argentina e no Chile nos anos 60, conclui que não se pode, para aqueles casos, estabelecer uma relação causal entre Cultura Política e estrutura política. Partindo da hipótese de que o Chile teria uma Cultura Política mais democrática que a Argentina, em função de questões históricas, e que isto implicaria uma maior adesão à democracia pelos chilenos, a autora conclui que não houve diferenças estatisticamente significantes entre as atitudes de trabalhadores de ambos os países, as quais pudessem sustentar a existência de uma relação entre estrutura e cultura (Tiano, 1986) [8].

No âmbito deste artigo, porém, serão analisadas concepções que defendem, sob diferentes aspectos, a existência de algum nível de relação. Nesse campo, há desde trabalhos clássicos como os de Kornhauser (1959); Downs (1957); Lipset (1960); Almond, Verba (1989a) ou Budge (1971), até trabalhos mais recentes como os de Diamond (1993); Tulchin, Romero (1995) e Camp (1996).

Há, em princípio, duas posições entre os autores que trabalham sob a concepção de que existe uma relação entre Cultura Política e democracia. Uma entende que existe um caminho unilinear na relação entre democracia e Cultura Política: uma cultura cívica (no dizer de Almond e Verba) pode ter um efeito na democracia, mas a democracia não tem efeito na constituição de uma cultura cívica (Almond, Verba, 1989a; Inglehart, 1988, 1990; Dahl, 1971; Moisés, 1995). Outra, que parte do princípio de que a Cultura Política pode também ser influenciada pela democracia (Dahl, 1989 [9]; Catterberg, 1991; Muller, Seligson, 1994).

Entre os autores que entendem existir a relação, nenhum imputa, porém, unicamente à Cultura Política a responsabilidade pelo estabelecimento da democracia ou de sua estabilização, no caso da América Latina. Diamond e Linz, por exemplo, argumentam que o desenvolvimento e a manutenção da democracia são grandemente facilitados por valores e comportamentos ligados a tolerância, moderação, etc. (Diamond, Linz, 1989). À mesma conclusão chegam os autores do livro editado por Diamond em 1993. O argumento básico é que a mudança no status, na força ou na estabilidade da democracia raramente ocorre sem algum envolvimento visível de mudanças (ou não) da Cultura Política [10] (Diamond, 1993, p. 27). Se essas concepções estão minimamente corretas, o estudo da Cultura Política, de forma empírica e teórica, adquire importância singular, na medida em que, ao ser associado com outros estudos, pode permitir que se desate o nó górdio da democracia na América Latina.

É possível argumentar que talvez não se encontrem evidências empíricas de que a existência de uma Cultura Política democrática implique o estabelecimento ou a manutenção de uma democracia. Se, no entanto, a Cultura Política pode não ser determinante para a instalação de uma democracia, ela pode vir a ser o diferencial em caso de um retrocesso. Em outras palavras, um país com uma Cultura Política democrática é capaz de garantir (ou ao menos influir em) a manutenção das regras do jogo no caso de alguma tentativa de golpe ou de ruptura institucional. Podemos, por outro lado, considerar às avessas o argumento de que a crença na democracia seria um fator de sua estabilidade: o descompromisso da cidadania com a democracia abriria espaço para rupturas institucionais.

A análise de algumas variáveis

A partir da obra clássica The Civic Culture, de Almond e Verba, o recurso metodológico das pesquisas tipo survey, consagrado desde então, possibilitou a verificação empírica de muitas das hipóteses sobre a estabilidade democrática. Uma das constatações foi um comprometimento com a democracia bastante menor do que se acreditava existir (Almond, Verba, 1989a). Com essa descoberta, houve um aumento significativo de estudos sobre democracia e Cultura Política, retomados com intensidade ainda maior nos últimos anos (Smith, 1995).

No que tange à América Latina, estudos sobre Cultura Política e democracia têm recorrentemente indicado a existência de um padrão que combina atitudes e comportamentos políticos autoritários com democráticos [11] (Baquero, Castro, 1996; Castro, 1996; Moisés, 1995; Pontes, 1995; Baquero, 1994; Catterberg, 1991; Echegaray, 1989; Brunner, 1987).

O mesmo padrão foi verificado na população estudada. A análise das respostas dos entrevistados nas três pesquisas realizadas permite que verifiquemos uma aparente incoerência entre as respostas dos entrevistados a perguntas relacionadas com democracia como forma e com democracia como conteúdo, bem como um certo desencanto com a democracia. Para tanto, será feita a análise descritiva de algumas variáveis.

A primeira questão que se buscou verificar diz respeito ao interesse por política. O estudo dessa variável se torna importante por dar a dimensão de comprometimento dos eleitores com o processo político. Como se pode notar na tabela abaixo, os entrevistados tendem a não possuir interesse por política. Comparando-se as respostas extremas - Muito interesse e Não se interessa -, observa-se que existe uma clara tendência para a falta de interesse por política (13,1% e 47,4% em julho de 1996, 11,9% e 50,6% em setembro de 1996, e 8,5% e 47,9% em julho de 1997).

Tabela 1
De um modo geral, o(a) sr. (a) se interessa muito, se interessa só
um pouco ou não se interessa por política?
Pesquisa
Respostas jul. 1996 set. 1996 jul. 1997
Muito
Um pouco
Não se interessa
NS
NR
Total
13,1%
37,0%
47,7%
0,9%
1,4%
(405)
11,9%
37,0%
50,6%
0,5%
-
(403)
8,5%
42,6%
47,9%
1,0%
-
(390)
Fonte: Pesquisa Cultura Política Centro Educacional
La Salle de Ensino Superior

Questionados então sobre a importância do voto, nos três momentos estudados verificou-se uma alta importância manifesta do voto, ou seja, do procedimento mais característico da democracia como forma. Como se pode ver na Tabela 2, nos levantamentos de dados de 1996, entre 62,5% e 64,0% dos entrevistados disseram achar que o voto é muito importante, enquanto que, em 1997, o número é maior ainda: 78,2%. Talvez essa variação se deva ao fato de ter havido eleições para prefeito em 1996, o que pode ter implicado um desgaste conjuntural do processo eleitoral.

Tabela 2
O (A) Sr.(a) acha que o voto é importante?
Pesquisa
Respostas jul. 1996 set. 1996 jul. 1997
Muito
Um pouco
Não se interessa
NS
NR
Total
64,0%
19,3%
16,0%
0,5%
0,2%
(405)
62,5%
23,6%
13,6%
0,2
-
(403)
78,2%
11,5%
10,3%
-
-
(390)
Fonte: Pesquisa Cultura Política Centro Educacional
La Salle de Ensino Superior


O interesse pelo voto pode ser interpretado como uma defesa da democracia. No entanto, a análise de outras variáveis permite que se possa ao menos relativizar essa conclusão.

Uma das variáveis diz respeito à percepção dos entrevistados sobre a existência ou não de democracia no Brasil. Uma pequena maioria dos entrevistados disse existir democracia no Brasil (cerca de 58% nas duas pesquisas em que a pergunta foi feita).

Tabela 3
Em sua opinião, existe democracia no Brasil?
Pesquisa
Respostas set. 1996 jul. 1997
Sim
Não
Total
57,1%
42,9%
(303)
57,3%
42,7%
(344)
Fonte: Pesquisa Cultura Política Centro Educacional
La Salle de Ensino Superior

Essas respostas, no entanto, não permitem o conhecimento do que as pessoas entendem por democracia. Foi solicitado então que os entrevistados se posicionassem em relação ao conteúdo da democracia. As respostas se encontram na tabela abaixo.

Tabela 4
Com qual das seguintes afirmações o(a) Sr.(a) concorda mais?
Pesquisa
Respostasset. 1996jul. 1997
Democracia significa as pessoas poderem votar
Democracia é as pessoas terem boas condições de vida
Total
23,4%
76,7%
(351)
23,7%
76,3%
(358)
Fonte: Pesquisa Cultura Política Centro Educacional
La Salle de Ensino Superior

Como se vê na Tabela 4, cerca de dois terços dos entrevistados que responderam a essa pergunta relacionaram democracia com boas condições de vida (variável relacionada com democracia como conteúdo), enquanto que apenas cerca de um terço, com o voto (relacionado com democracia como forma).

Interessou então saber a opinião dos entrevistados sobre a consolidação da democracia. Como se pode notar na Tabela 5, a maioria dos entrevistados disse existir perigo para a consolidação da democracia. Mais uma vez chama a atenção o fato de que na pesquisa de 1997, ano não-eleitoral, as respostas dos entrevistados foram mais negativas, o que é coerente com as respostas da Tabela 2.

Tabela 5
Algumas pessoas estão começando a duvidar da democracia.
Qual a sua opinião?
Pesquisa
Respostas jul. 1996 jul. 1997
A democracia vai se consolidar
Existe perigo para a democracia
Total
42,2%
57,8%
(308)
33,0%
77,0%
(309)
Fonte: Pesquisa Cultura Política Centro Educacional
La Salle de Ensino Superior

O conjunto destas respostas indicava uma aparente contradição entre uma forte adesão a valores democráticos ligados à forma da democracia e uma baixa adesão ao seu conteúdo. Ao mesmo tempo, há um certo desencanto com a possibilidade de consolidação da democracia. Como se discutirá abaixo, esse comportamento se constitui em dois paradoxos, que podem ser mais bem explicados através do recurso da teoria da hegemonia.

O paradoxo das atitudes polítícas

O primeiro paradoxo se deve ao fato de que existe um descompasso entre as atitudes políticas ligadas à democracia como forma e as atitudes ligadas à democracia como conteúdo. Esse paradoxo - uma forte adesão manifesta a questões ligadas aos procedimentos democráticos (democracia como forma) e uma fraca adesão aos valores democráticos (democracia como conteúdo) - tem sido caracterizado pela literatura como uma dupla racionalidade (Keller, [1991]) ou como a manifestação da existência de um apoio difuso, por um lado, e de um apoio específico, por outro (Easton, 1968; Baquero, Castro, 1996; Castro, 1996).

Essas caracterizações, se permitem uma adequada descrição das constatações empíricas, não nos dão uma explicação suficiente da essência do fenômeno. Em outras palavras, e utilizando as categorias de Easton, deixam a desejar quanto à explicação da origem do paradoxo existente entre os apoios difuso e específico. Daí a necessidade de outro recurso explicativo.

O paradoxo da democracia e da estabilidade na América Latina

Pode-se afirmar que sempre esteve subjacente ao debate acadêmico a respeito da democracia na América Latina a indagação sobre qual ou quais são os reais pré-requisitos para a sua instalação e estabilidade [12]. Esse debate, no entanto, sempre partiu da premissa ideológica de que a democracia - entendida como as suas regras, procedimentos e ritos - é um valor em si, um bem a ser alcançado. Subjacente a essa concepção, vem a defesa de um tipo de sociedade que se constituiu a partir do advento do capitalismo na Europa [13]. Este posicionamento a priori, se pode, por um lado, ser fator da construção e da consolidação do processo democrático em sua forma, através da constituição de uma democracia minimalista (Moisés, 1995), parece, por outro lado, desconsiderar ou subvalorizar uma concepção de democracia como conteúdo (ou maximalista).

Este privilégio à concepção minimalista como forma de garantir (ou propugnar) a estabilidade democrática se constitui em um paradoxo, porque a instituição dos procedimentos democráticos formais não garante por si a adesão da população, uma vez que os problemas sociais não são resolvidos. No entanto, há a aceitação da democracia minimalista (ou existe um apoio difuso ao sistema). E o paradoxo está justamente na aceitação (mesmo que pela passividade) de um sistema que não resolve os problemas sociais.

Uma tentativa de explicação dos paradoxos

Uma explicação para ambos os paradoxos será encontrada na teoria da hegemonia de Antonio Gramsci [14]. Esse polêmico conceito, construído a partir de Marx, possui uma relação dialética com o conceito de dominação, na medida em que a função de liderança econômica, social, intelectual e moral da(s) classe(s) (ou frações de classe) hegemônicas (dominantes) forma ou constitui um consenso (a partir dos valores dessas classes), que é, na visão de Gramsci, um modo de dominação mais eficaz que a coerção (Gramsci, 1995). A hegemonia de uma classe, fração de classe ou conjunto de classes no poder se manifestaria através do consentimento espontâneo dado pelas grandes massas da população à direção geral imposta à vida social pelo grupo dominante [15] (Gramsci, 1995, p. 12).

O conceito de hegemonia é pertinente porque incorpora a dimensão do poder ao debate da Cultura Política, usualmente não considerada nas análises. Assim, vai além da caracterização e descrição dos fenômenos do comportamento político ou da postulação de determinado tipo de Cultura Política, criando as condições para que se possam explicar as suas origens.

Segundo essa teoria, os setores dominantes da sociedade - a fração no poder - constroem uma hegemonia que é simultaneamente a garantia e a justificativa de seu domínio. Em outras palavras, os setores hegemônicos constituem um sistema de crenças e de valores que passam a ser considerados senso comum, ao mesmo tempo que essas crenças e valores, por sua vez, são constituintes da sociedade. Desta forma, os valores e crenças hegemônicos - que se manifestam na Cultura Política - são simultaneamente uma apreensão e uma construção dinâmica da realidade, a partir de determinada concepção de mundo.

A explicação dos paradoxos a partir dessa perspectiva teórica se dá em dois momentos: no primeiro, cabe identificar as contradições, no sentido da dialética, que não seriam explicadas em uma primeira abordagem; no segundo, deveria se verificar quais os interesses da fração no poder que estariam em jogo, ou seja, os interesses hegemônicos. Essas contradições podem ser resumidas nos dois paradoxos: o paradoxo das atitudes políticas e o paradoxo da democracia e da estabilidade na América Latina.

O paradoxo das atitudes políticas se deve à incoerência entre uma atitude política de apoio à enunciação genérica de um fenômeno ou assunto (apoio difuso) e uma atitude de refutação das suas manifestações concretas (apoio específico). O paradoxo da democracia e da estabilidade na América Latina se deve à contradição entre a defesa de um sistema que privilegia ou entende a participação política como um sinônimo de voto e a existência de uma sociedade que exclui pela desigualdade social.

Essas contradições são explicadas com base nos interesses da fração no poder. A tese pode ser resumida da seguinte maneira: é do interesse da fração no poder que os de baixo se mantenham como tal e, para tanto, criam um sistema de crenças e de valores adequado a tal finalidade. É claro que isto não implica uma visão simplista, de orquestração da política, mas que interesses convergentes tendem a constituir ações políticas convergentes.

A explicação dos paradoxos, no entanto, se dá na ordem inversa de sua enunciação: primeiro cabe explicar, com base na teoria gramsciana, os motivos da contradição existente num sistema que combina igualdade política com desigualdade social, para, então, explicar como isso se reflete no comportamento político [16].

Do ponto de vista de Gramsci, com base em Marx e Lenin [17], é a divisão da sociedade em classes antagônicas o que explica a origem da desigualdade social. Numa sociedade de classes, uma delas (ou várias, ou uma fração de classe) detém o poder político, utilizando-se para tanto de todos os meios disponíveis, desde a opressão física (através da repressão aos movimentos que possam de alguma forma ameaçar o poder da classe), até (e principalmente, para Gramsci) mecanismos de dominação ideológica.

No caso da sociedade capitalista, a fração no poder é ligada ao capital e aos seus interesses. Dessa forma, a sua atuação mais ampla será no sentido de garantir a manutenção e a reprodução do capital, fazendo uso dos mecanismos aos quais tem acesso. Como a exclusão social é inerente ao desenvolvimento do capitalismo dependente (Fernandes, 1987), setores da população cada vez maiores tendem a ficar à margem da distribuição da riqueza social.

A existência de uma sociedade que exclui econômica e socialmente, porém, não implica uma atitude passiva por parte de quem é excluído. Já foi dito que nenhum povo se deixa morrer de fome sem lutar, e, em vários momentos, o conflito latente passa a ser manifesto, havendo disputa e confronto nos campos político, econômico e social. Se considerarmos que se trata do interesse de uma fração no poder ligada ao capital, o mais fundamental de todos estes campos é o econômico: para defender a estrutura econômica em vigência, são tomadas todas as medidas necessárias (violentas, se for o caso).

Nos demais campos, contudo, há maior amplitude de ação ou de negociação. Em conseqüência, há maior possibilidade de haver mudanças políticas e sociais, dentro do marco institucional da ordem capitalista [18]. E uma das mudanças políticas seria justamente a progressiva ampliação da cidadania, sem que haja modificação na estrutura econômica que fundamenta a exclusão. De forma sintética, essa seria a explicação do paradoxo da convivência de um sistema político que inclui com uma estrutura econômica que exclui.

A explicação do segundo paradoxo é decorrente da anterior. Já foi mencionado acima que a fração no poder necessita manter-se enquanto tal e que a dominação através da construção de um consenso gerado pela hegemonia é mais efetiva que através da coerção (Gramsci, 1995). Assim, passa a defender e a construir uma série de valores que sejam congruentes com a sua necessidade de defesa da ordem econômica. Uma implicação direta disso é a defesa de uma democracia minimalista, que desconsidere as questões sociais.

E é justamente este descolamento da democracia como forma da democracia como conteúdo que explica a baixa adesão aos valores democráticos verificada empiricamente: como o que surge originalmente entre nós é a defesa hegemônica das regras do jogo, os valores anteriores e basilares do jogo não são devidamente considerados, por poderem significar um questionamento ao modelo econômico. Desta forma, o que parece existir entre nós é uma cultura política autoritária que se funde com a defesa hegemônica de procedimentos democráticos. Uma conseqüência dessa aparente contradição é um comportamento político que tem como limite os valores defendidos pelas elites políticas.

Por outro lado, segundo a concepção de hegemonia, a compreensão da realidade que as classes subalternas, no dizer de Gramsci, possuem é fragmentada, o que cria uma barreira entre a concepção de mundo e a ação real, se constituindo em um dos fatores de alienação, que implica dominação política pelos setores hegemônicos. Dessa forma, quando os resultados dos surveys nos indicam atitudes políticas aparentemente incoerentes, o que na realidade ocorre é a manifestação dessa visão fragmentada da realidade.

Conclusão

Este trabalho foi uma tentativa de encontrar caminhos alternativos para a explicação de fenômenos descritos há muito tempo pela Ciência Política. Para tanto, se buscou auxílio na teoria de Gramsci, que tem sido pouco utilizada em estudos de Cultura Política. Esse método de análise se mostrou adequado para uma melhor compreensão da realidade política. Além de dar explicação alternativa aos dois paradoxos propostos, o trabalho salientou a vantagem do uso do conceito de hegemonia por incorporar a dimensão do poder à Cultura Política.

A utilização do conceito de hegemonia, além de ferramenta teórica, ajudou a verificar limites explicativos da Cultura Política, em sua visão tradicional. Desta forma, cabe serem realizados trabalhos que contribuam para uma nova conceituação de Cultura Política, adequada à realidade latino-americana.

Por outro lado, o trabalho permitiu que novas dúvidas fossem geradas, não apenas sobre a possibilidade do uso do conceito de hegemonia para explicar outros fenômenos, mas, em especial, no que respeita a uma caracterização mais clara da fração no poder no Brasil, bem como de seus interesses.

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Henrique Carlos de Oliveira de Castro é professor da Universidade de Brasília.

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Notas

[1] Esse estudo foi originalmente publicado em 1980.

[2] É importante salientar que aquele trabalho foi um dos primeiros a utilizar dados de pesquisas tipo survey coletados em vários países, o que implicou um estudo e conclusões pouco cautelosas, no dizer de Sidney Verba em trabalho de 1980. Essa pouca cautela, no entanto, suscitou um debate que permitiu a própria afirmação do conceito e do método de análise (Verba, 1989).

[3] Catterberg (1990, p. 109) conclui que as institutions can influence the creation of habits favoring democratic routines, e Moisés (1995, p. 270) conclui que as mudanças recentes na Cultura Política dos brasileiros "criaram [...] as bases sócio-políticas da legitimidade democrática".

[4] The behavioural view of political culture used by Almond and Verba is inadequate both as an account of how works and how it may explain political action (Street, 1993, p. 113).

[5] Em trabalho posterior, Gabriel Almond afirma que political culture is not a theory; it refers to a set of variables which may be used in the construction of theories (Almond, 1989, p. 26), publicado originalmente em 1980.

[6] Esta parte é baseada em Castro, 1996, e em Baquero, Castro, 1996, onde se pode encontrar um maior aprofundamento do tema.

[7] A expressão é emprestada de Claude Lefort.

[8] A autora é prudente com as suas afirmações, em especial no que tange à possibilidade de inferência estatística: Because the samples on wich this study is based do not represent the entire Argentine and Chilean populations, [...] caution must be employed in interpreting these findings (Tiano, 1986, p. 87).

[9] A aparente contradição nas posições de Dahl se deve ao fato de que ele, em certos casos, afirma que uma poliarquia somente pode existir se houver um decidido apoio por parte das elites políticas e econômicas da sociedade, e em outros afirma que, como as mudanças de estrutura política são geralmente mais rápidas que as culturais, um país que desenvolva uma sociedade pluralista moderna mais provavelmente desenvolverá e sustentará crenças e atitudes mais favoráveis à poliarquia.

[10] [...] change in status, strength, or stability of democracy rarely occurs without some visible involvement of a changing - or unchanging - political culture.

[11] A bipolarização democracia-autoritarismo - base do conceito de Cultura Cívica - tem uma explícita conotação ideológica, de defesa da democracia liberal. Embora mereça uma melhor discussão, esse não é o tema central deste trabalho. A esse respeito, ver Wiatr, Jerzy J. "The Civic Culture from a Marxist-Sociological Perspective." In: Almond, Gabriel A. e Verba, Sidney. The Civic Culture Revisited. Newburry Park: Sage, 1989b.

[12] Um debate sobre as origens históricas do autoritarismo no Brasil pode ser encontrado em Baquero, Castro, 1996; Castro, 1996; Schwartzman, 1988.

[13] A simbiose da democracia com o capitalismo - ambos baseados em princípios manifestos de liberdade individual - tornou este sistema político hegemônico em nível mundial. A este respeito, ver Baquero, Castro, 1996.

[14] Embora inerente ao conceito gramsciano de hegemonia, não trataremos a questão da contra-hegemonia, por não ser diretamente ligada ao assunto do artigo.

[15] The "spontaneous" consent given by the great masses of the population to the general direction imposed on social life by the dominant group.

[16] O presente trabalho poderia ser apresentado como uma comprovação empírica à hipótese da hegemonia. No entanto, esse enfoque seria contraditório com a concepção de Gramsci de ciência.

[17] Embora haja tentativas de interpretar Gramsci apesar de e até contra Marx e, principalmente, Lenin, os pseudônimos por ele utilizados em seus escritos na prisão, como forma de burlar a censura, denotam claramente o seu posicionamento. Para citar Marx, por exemplo, utilizava "o fundador (ou o corifeu) da filosofia da práxis", à qual se afiliava; para Lenin, "o maior teórico moderno da filosofia da práxis" (Gramsci, 1980).

[18] Naturalmente, mudanças políticas e sociais implicam mudanças econômicas ou, ao menos, concessões econômicas. No entanto, essas mudanças econômicas não alteram a estrutura excludente.

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Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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