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As homilias de Paulo Meneses

Fátima Yasbeck Asfora - Agosto 2009
 

Paulo Meneses, S.J. Homilias na Unicap. Recife: Fundação Antônio dos Santos Abranches, 2009. 70p.

Paulo Meneses, S.J., cearense, radicado em Recife há vários anos, é atualmente uma das maiores expressões da Filosofia deste país.

Diplomado em Ciências Políticas e Direito Público pela Universidade de Paris, Doutor em Filosofia, este autor recentemente recebeu o título de presidente de honra da Sociedade Hegel do Brasil.

Tradutor desse filósofo para a língua portuguesa, ele publicou no ano de 1985 o título Para ler a "Fenomenologia do Espírito" – Roteiro, com apresentação do Pe. Henrique Cláudio de Lima Vaz.

Nesse texto Pe. Vaz afirma: "Está bem longe da intenção de Paulo Meneses o pretender substituir-se à leitura direta do texto. Ao contrário, sua ambição - modesta, mas exigente - é exatamente oferecer ao eventual leitor de Hegel um roteiro no sentido mais literal: o traçado dos caminhos, que o viajante leva nas mãos, para poder avançar com segurança pelo continente fenomenológico".

A primeira tradução da Fenomenologia do Espírito para o português foi publicada em 1999 (2 v.) pela Editora Vozes, com a colaboração na primeira parte do Prof. Karl-Heinz Efken e, na segunda parte (do "Espírito" até o fim), do Pe. José Nogueira Machado, também jesuíta, já falecido. Em 2002 essa obra foi publicada em volume único pela Editora Vozes e Universidade São Francisco (SP).

Nos anos de 2003 e 2006 Paulo Meneses publicou Hegel e a "Fenomenologia do Espírito" e Abordagens hegelianas, através das editoras Jorge Zahar e Vieira Lent, respectivamente.

Além de pesquisador da fenomenologia hegeliana, o autor se destaca pelo conteúdo das homilias proferidas nas missas por ele celebradas.

Em 2003, por iniciativa dos participantes desses ofícios religiosos na Capela do Centro de Evangelização das Damas e também pelos seus 50 anos do sacerdócio, foi publicado o primeiro livro desse gênero, sob o título Homilias de Aldeia. Tal denominação faz referência ao bairro do município de Camaragibe onde aquele Centro de Evangelização está situado, caracterizado por apresentar ainda um pouco de Mata Atlântica.

Em 2006 Novas Homilias de Aldeia foram publicadas também por iniciativa das pessoas que assistiam missa na Capela daquela área.

No mês de julho deste ano surge o terceiro volume - Homilias da Unicap - selecionadas entre aquelas que foram pronunciadas nas missas mensais do grupo Hegel, realizadas na Capela da Universidade Católica de Pernambuco, Unicap.

Na trajetória dos três títulos das homilias, o nome de Hegel aparece algumas vezes, bem como de outros filósofos, mas, como o próprio Pe. Paulo adverte, "nossas homilias não têm por objeto Hegel nem Lutero, mas Cristo".

No caso específico de Hegel o autor explica na "Apresentação" desse seu mais recente livro que "[...] não deve causar estranheza o nome de Hegel num texto religioso, pois Hegel foi o filósofo que mais se ocupou de religião e, segundo Karl Barth, o que pensou com mais profundidade o dogma cristão, com exceção talvez de S. Tomás de Aquino".

Através das suas homilias o autor repensa o conteúdo bíblico focalizado, fornecendo uma visão adaptada aos dias atuais através de uma linguagem viva, ao alcance de todos, marcada ora por um matiz poético, ora por um acentuado senso crítico.

Na Homilia do Natal de 2008 o autor relembra o processo de criação do mundo e dos seres humanos, partindo do povoamento do universo com estrelas, que semearam poeira no espaço, formando planetas, como a Terra. Lembra que "[...] esse ser extraordinário que descende das estrelas e de toda a árvore genealógica dos seres vivos foi criado dotado de razão e de liberdade, de amor e de criatividade".

Refletindo sobre a forma com que a teologia católica entende a presença real de Cristo na eucaristia (sem conotação fisiológica ou material), o tom crítico do autor é direcionado para Hegel, afirmando que "dá uma certa pena", porque, no seu luteranismo, dedicou tantas linhas contra essa presença.

No que se refere à tradição religiosa da ascese, novamente Hegel é criticado, desde que, na figura da "consciência infeliz", aquele filósofo "[...] executa, em poucas palavras, toda a vida monástica medieval como se fosse desvario. Desvario, de fato, é essa execução sumária, pois Hegel é o primeiro a dizer que as tradições veneráveis têm a sua racionalidade, enquanto as deduções a partir da pura razão, como fazia a Revolução Francesa, descambam na pior irracionalidade, que é a violência".

O puritanismo que vem caracterizando o espírito cristão também é lastimado em uma das homilias, quando focaliza a decisão da Igreja de abolir as representações nos altares das igrejas da gravidez de Maria, bem como da amamentação do Menino Jesus. "É curiosa essa marcha na contramão da história. Em nossa época, em que se exalta o feminismo, em que o sexo se tornou objeto de ciência (e não de indecência), esse puritanismo invade o espírito cristão".

Abordando outros equívocos, o autor assinala que existe atualmente no país uma "versão dançante do cristianismo", que deixa de lado justamente o essencial: a salvação do mundo e a glorificação de Cristo como realizações através de seu sofrimento.

Assim, seguindo os evangelhos dos domingos, as Homilias mostram as preocupações do autor em adaptar as mensagens cristãs ao novo tempo e à vida de cada dia.

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Fátima Yasbeck Asfora é professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco.



Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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