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Quando um governo de esquerda perde a capacidade de liderar

Cláudio de Oliveira - Junho 2015
 

O governo do maior partido da esquerda do país perde a confiança da maioria dos cidadãos. Estes não se sentem mais representados pelo partido que ocupa a Presidência da República nem pelos partidos aliados. A população, sem maiores canais políticos institucionais, agora se expressa em grandes manifestações de rua.

O que levou à perda de liderança do governo? Talvez a maneira autoritária e excludente com que o maior partido da esquerda conduziu o poder, com a subordinação dos partidos aliados ao seu projeto, como também o atrelamento dos sindicatos, das organizações sociais e de outras instância da sociedade civil ao Estado.

Desde o início, o maior partido de esquerda, quando ganhou as eleições, excluiu o partido da social-democracia, bem como setores liberal-democráticos. Os dirigentes do partido acreditavam que os social-democratas haviam passado para a direita e buscavam desestabilizar o regime.

Mas, provavelmente, o aspecto que causou grande perda de prestígio terá sido a estagnação econômica do país. A falta de crescimento econômico levou a que as conquistas iniciais - que efetivamente beneficiaram os mais pobres - fossem ameaçadas por uma progressiva perda de renda.

Também a população passou a rejeitar a conduta de vários dirigentes do país, suspeitos de corrupção ou de privilégios inacessíveis à grande maioria.

Preso a dogmas ideológicos e sem melhor compreensão da nova conjuntura mundial - impulsionada pela revolução tecnológica, pela globalização da economia e por mudanças nas relações de trabalho -, muitos militantes do maior partido da esquerda viam as manifestações de rua como mera armação golpista dos setores de direita, com apoio em potências estrangeiras.

De fato, ao perder a confiança da sociedade, o governo de esquerda abriu o flanco para o crescimento dos partidos à direita do espectro político, que passaram a liderar as grandes manifestações de rua. Porém, entre os líderes dos protestos, havia também setores de esquerda e centro-esquerda, inclusive de partidos antes aliados, que, desalojados do centro de decisões do poder, descolaram da órbita do governo e passaram para a oposição.

O partido de esquerda a que me refiro é o Partido Comunista da Tchecoslováquia. Entre os líderes das grandes manifestações de rua estavam o dramaturgo Vaclav Havel, de tendência liberal. Ao seu lado, Alexander Dubtchek, um egresso do PC que se filiaria ao Partido Social-Democrata, proscrito em 1948.

Os protestos tiveram início com uma passeata de estudantes em 17 de novembro de 1989, que detonou manifestações em todo o país e reuniu amplos setores da sociedade da então Tchecoslováquia, hoje República Tcheca. Nessa época, eu era estudante em Praga e foi assim que vi aqueles acontecimentos.

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Cláudio de Oliveira, jornalista e cartunista.

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Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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