Nesse dezembro de um ano nada dourado a crise polÃtica assumiu o lugar de protagonista da cena nacional. Seu desfecho tornou-se condição para que a economia tenha jeito e a sociedade, horizonte.
Mas a polÃtica ainda rodopia, transitando por uma rotatória em que três das quatro pistas a que ela se liga estão (felizmente) interditadas por instituições que têm evitado, até aqui, que se opte por saÃdas contra a democracia e o bom senso. Essas proteções previnem contra um muro que se acha ao fim da saÃda pela direita, um precipÃcio que espreitaria ao fim da saÃda pela esquerda e um pântano que nos atolaria em caso de retorno ao status quo de 2014. Para não rodopiar sem fim até o combustÃvel acabar, a polÃtica brasileira tem, à sua frente, a quarta pista, que leva a um pacto interpartidário amplo para ocupar o centro polÃtico real onde se situa, objetivamente, o PMDB. Por aà é que pode, com ou sem impeachment, haver trânsito polÃtico numa democracia em que um senso governamental realista lidere o senso comum, para não o deixar à mercê da demagogia e da mistificação plebiscitária.
Mas quem analisa e não apenas sofre a crise sabe que polÃticos não são analistas. Por definição, são atores interessados em alcançar, dentro do possÃvel a cada qual, espaços de poder. Numa democracia poder se alcança via competição, logo, pacto interpartidário amplo não significa pacto entre todos os partidos. Pode produzir governação no lugar de desgoverno quando, como agora, não houver, imediatamente, uma eleição. Mas não pode nem deve anular o conflito polÃtico. Está implÃcito que haverá (e é bom que haja) oposição.
Pelo fato do governo patinar em suas próprias contradições, no centro da discussão tem estado a possibilidade de impedimento da Presidente, ou outro desfecho que a afaste dentro das regras do jogo. Se isso ocorrer e o Vice assumir, como reza a Constituição, é de supor que o PT passe à oposição. As outras crises não acabarão com o impedimento, só a crise polÃtica terá chegado a um termo provisório. A solução da crise polÃtica não estará isenta de percalços e contestações, daà ser necessário amplo pacto interpartidário a respaldá-la, na busca de obter apoio social para enfrentar especialmente a crise econômica, sob horizonte polÃtico nublado por recessão e um mal-estar social.
O PT, como organização, mostrou que sabe bem disso, ao encerrar as prolongadas tratativas do seu braço governamental com Eduardo Cunha. Até então o PT estava fraturado por uma disputa entre o partido-organização e o partido no governo. O primeiro, saindo vencedor, tem imposto à Presidente da República a representação de um script estritamente partidário. O "nós x eles" da campanha de 2014 revive. Isso é o oposto do que ela precisaria para preservar seu mandato e tentar, afinal, governar, se ainda desse. Descrente dessa possibilidade, o PT arriou na mesa o mandato de Dilma, queimou suas últimas pontes, para apostar num discurso para 2018, imaginando que Lula poderá e quererá vocalizá-lo. Aposta lógica, mas arriscada também, cujos custos tentará minimizar cobrando alto preço polÃtico ao governo sucessor. Por isso a aposta mencionada não pode ser abertamente assumida. O PT e o lulismo buscam assumir uma posição de vÃtimas e recuperar a de defensores dos pobres num quadro de recessão e desemprego que a sua polÃtica ajudou a criar. Nessa toada cabe, por meio de palavras de ordem e/ou malabarismos verbais, veicular versões sobre um "golpe de estado" e uma não demonstrada primazia do Minha Casa Minha Vida e Bolsa FamÃlia nas pedaladas fiscais.
A oposição petista já opera com Dilma ainda no palácio e antes mesmo que uma nova coalizão governante se consume. Sim, pois na oposição ainda são visÃveis (embora cada vez mais tênues) as resistências de parte do PSDB a um pacto em torno de Temer. Aécio Neves, assim como Marina Silva, a lÃder da novata Rede, tem recall eleitoral. Ambos agradeceriam se o TSE pusesse Dilma e Temer fora do jogo para haver, em 2016, uma nova eleição. Têm interesse e desejo, assim como Serra, Alckmin, Lula, Dilma e Temer têm os seus. Resta saber quais entre esses diversos e conflitantes interesses e desejos podem melhor se coadunar com o objetivo de celebrar um pacto que resolva a crise polÃtica e, assim, começar logo a dura missão de tirar o PaÃs da crise econômica, dentro da democracia. Dúvidas sobre isso diminuem no compasso do aumento do desgaste e da paralisia do Governo. Mas claro: decisões e fatos vindouros poderão contemplar outros argumentos e prioridades.
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Paulo Fábio Dantas Neto é cientista polÃtico e professor da UFBA.
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