"Sou filho ?nico..."
M?es falam da decis?o de ter apenas um herdeiro e contam os pr?s e contras desta experi?ncia de vida

Djenane Pimentel
28/12/04

Clique nos ?cones e ou?a as m?es, Dalva e Bianca, falando sobre o motivo de terem somente um filho

Ou?a! Ou?a!


foto ilustra??o Se h? alguns anos era raro um casal ter apenas um filho, hoje em dia esta op??o ? cada vez mais comum. E desculpas ? que n?o faltam: o pre?o das escolas, os baixos sal?rios, o aumento da marginalidade, a instabilidade dos relacionamentos, a longa e estressante jornada de trabalho... Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estat?stica (IBGE), oito em cada dez fam?lias se encaixam neste perfil. Entre as principais causas est?o a op??o das mulheres em priorizar a carreira e deixar para engravidar mais tarde, as dificuldades financeiras e a pouca disponibilidade de tempo dos pais.

Karla Fayer Para a psic?loga Karla Fayer (foto ao lado), a decis?o de ter somente um filho ? uma quest?o geradora de muita pol?mica e d?vidas, j? que a id?ia remete ao estere?tipo de uma crian?a mimada, egoc?ntrica e autorit?ria. Segundo Karla, essa hist?ria de que a crian?a que cresce sem irm?os se torna mimada ? muito relativa. "Uma coisa tem que ficar clara: se ela crescer com excesso de tudo, vai achar que o mundo gira a seu redor. O fato de ser mimado est? ligado ? dificuldade dos pais em impor limites desde o nascimento", avisa.

Se tornar uma crian?a mimada independe da condi??o de ser ?nica, mas sim da dificuldade dos pais perceberem que as crian?as precisam, desde que nascem, de muito di?logo. "? necess?rio tamb?m estimular ocasi?es de relacionamento interpessoal, onde elas possam dividir, disputar, brigar, fazer as pazes com outras crian?as, primos e vizinhos. ? neste tipo de relacionamento que elas v?o descobrir que precisam negociar muitas coisas e abrir m?o de outras, para viver em sociedade", lembra a psic?loga.

Queria ter, mas n?o pude
Dalva e M?rcio Muitas vezes, a chegada do irm?ozinho vai sendo adiada por algum tempo, e depois, simplesmente acaba n?o acontecendo. Com a executiva de vendas Dalva L?cia da Silva (foto ao lado), m?e de M?rcio, 16 anos, foi assim. Quando o menino tinha apenas quatro anos, a vida lhe pregou uma pe?a: o marido sofreu um acidente e veio a falecer. Isso aconteceu em 1991 e, desde ent?o, Dalva se despediu da id?ia de ter um segundo filho. "N?s quer?amos muito ter outro filho, mas juntos. Com a morte dele, a minha vida tomou outro rumo. Tive que trabalhar dobrado para sustentar a casa e, al?m disso, os traumas e dificuldades por que passei me trouxeram tamb?m um certo medo de voltar a ser m?e", admite.

Hoje, Dalva est? mais tranq?ila, principalmente no que se refere ? cria??o de M?rcio. "M?e erra, claro. Acho at? que me excedi em fazer muitas vontades dele, mas tamb?m soube limitar muita coisa", afirma. Ela conta que nunca teve grandes preocupa?es com o filhote, e orgulha-se, citando suas v?rias qualidades: respons?vel, inteligente, educado, amigo, alegre, falante...

Por outro lado, M?rcio declara: "eu queria ter um irm?o", e aponta ainda as vantagens e desvantagens de ser filho ?nico. Entre as vantagens, diz que o melhor de tudo ? ter suas coisas sem precisar divid?-las com ningu?m. "Mas, em contrapartida, perde-se a no??o do que ? compartilhar", lembra. A solid?o tamb?m ? um problema para M?rcio. "Apesar de ter muitos amigos, estes n?o conseguem suprir a falta de um irm?o. Irm?o ? irm?o", finaliza.

Posso ter, mas n?o quero
Bianca e Jo?o V?tor A recepcionista Bianca dos Santos Pinto (foto ao lado), m?e de Jo?o V?tor, de 5 anos, n?o quer ter mais filhos. Junto do pai de seu filho, Jo?o Ender, h? dez anos, Bianca vem de uma fam?lia grande, de seis irm?os. Diz adorar a companhia dos maninhos, mas n?o ter condi?es financeiras nem psicol?gicas para mais um filho. "Quando minha m?e faleceu, h? quatro anos, foram eles o meu pilar de sustenta??o. Sei que meu filho n?o vai ter isso, caso aconte?a alguma coisa conosco, mas n?o quero mais nenhum", afirma convicta.

Para Bianca, um filho demanda muita responsabilidade, uma vida estabilizada e bem-estruturada. "? complicado para educar, cuidar, exige demais de todos e eu sempre acho que estou em falta com ele, por causa do meu trabalho". Al?m disso, Bianca conta que teve muito sofrimento em sua vida, devido a problemas familiares, que contribu?ram ainda mais para esta resist?ncia em ter filhos.

Jo?o V?tor foi para a creche com um aninho. Bianca afirma que, na escolinha, ele aprendeu a dividir, a brincar e conviver com os coleguinhas. Este ? um detalhe importante nos dias atuais. At? alguns anos atr?s, as crian?as come?avam a freq?entar a escola somente quando tinham uns seis anos. Hoje, elas v?o para o col?gio muito cedo, algumas at? antes de fazer um ano de idade. L?, aprendem a conviver com outras crian?as, respeitar os amiguinhos, enfim, aprendem a se socializar. Portanto, mesmo quem n?o tem irm?os em casa, acaba aprendendo, na marra, as regras da boa vizinhan?a.

S? eu... e mais ningu?m?
foto ilustra??o A psic?loga Karla Fayer sugere estimular desde cedo o conv?vio, criando oportunidades de contato do filho ?nico com outras crian?as da pr?pria fam?lia, da escola ou vizinhos. "O ato de brincar com outra crian?a da mesma idade ? insubstitu?vel. Ela tem que aprender a compartilhar os brinquedos dos outros e os seus, principalmente", ressalta.

Ela aconselha tamb?m os pais a evitarem que tudo e todos girem em torno da crian?a, como se ela fosse a "rainha" da casa, tendo os demais familiares como s?ditos ? sua disposi??o. Isso poderia incentiv?-la a desenvolver um sentimento de poder e superioridade. "? preciso, desde cedo, que ela aprenda o significado da palavra 'N?o'. Pode ser dif?cil no come?o, mas os pais v?o perceber, com o tempo, que s? assim as crian?as v?o aprender a respeitar regras e obedecer limites. O que acabar? ajudando os pequenos a enfrentar as frustra?es da vida, quando adultos", lembra.

Segundo Karla, o filho ?nico n?o ? necessariamente uma pessoa egoc?ntrica ou problem?tica. Mas tudo vai depender do ambiente onde vai crescer, pois este ? fundamental para desenvolver sua personalidade. "O comportamento dos pais ao educar a crian?a ? important?ssimo. Com a escola e o ambiente familar trabalhando em sintonia, fica muito mais f?cil afastar a possibilidade do filho se tornar ego?sta e mimado", finaliza.