Crise econômica era esperada no Brasil, dizem especialistas

Profissionais garantem que país sofrerá mudanças até se readequar à nova política econômica do governo

Lucas Soares
Repórter
28/02/2015

O Brasil vive uma crise na economia no início de 2015. O dólar está em alta, a inflação está sendo controlada à rédeas curtas pelo governo, a crise da Petrobrás expôs o escândalo de corrupção na maior empresa do país e o crédito tupiniquim no exterior despencou. Além disso, o Governo Federal faz um forte ajuste fiscal, aumentando impostos cobrados nas contas de energia e água, além de aumentar o preço da gasolina. Até produtos produzidos no Brasil, mas cotados em dólar, como o milho e a soja, já apresentam variações em relação ao passado. 2015 promete ser um ano difícil para os brasileiros.

O professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Wilson Rotatori (foto ao lado), PhD em economia, explica que o ajuste feito pelo governo dá uma resposta aos investimentos feitos no passado. "Nós estamos em uma situação bem delicada. A economia não está crescendo e as perspectivas são ruins, com inflação alta e a economia pode encolher neste ano. Isso foi causado por diversos problemas ao mesmo tempo: uma crise de energia que se colocou pela redução das chuvas, o consumo aumentou muito em referência a redução tarifária que foi implementada em 2012. Além disso, o aumento do crédito gerou um aumento da demanda e trouxe um impacto negativo sobre a economia, visto que a energia é fundamental para a economia, tanto na produção, quanto no consumo", explica.

Além da crise energética, Rotatori aponta o descontrole dos gastos públicos como outra causa da crise vivida em 2015. "Foi uma situação que se materializou no ano passado, depois da eleição. Os números não estão fechando, e verificou-se um déficit nas contas do governo que não existia. A inflação cresceu por isso. A perspectiva é ruim por isso, por não ter espaço para crescimento ou da queda da capacidade produtiva. Quando as pessoas estão com expectativa ruim, elas diminuem o consumo, os empresários vão diminuir os investimentos e isso gera um clima de tensão", comenta.

A visão de Rotatori é semelhante ao do Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Geração de Emprego e Renda de Juiz de Fora, André Zuchi (foto acima). Para o economista, a influencia de tudo que acontece no governo federal é refletido na economia local. "A medida que o governo federal faz o ajuste fiscal e reduz a transferência de recurso para investimento em obras públicas, o consumo vai retraindo, a inflação aumenta e há restrições ao crédito. Isso afeta a economia como um todo e Juiz de Fora não foge à regra. Não há como fugir desta crise. Você pode ser afetado mais ou menos profundamente, vai depender muito da situação de cada município. Eu vejo com muita clareza que a cidade está sendo afetada, e isso deve pendurar pelos próximos dois anos", afirma.

Erros

Segundo Zuchi, o principal culpado pela crise que o país vive é o próprio governo federal. "Foram erros de política econômica adotados nos últimos quatro anos. Agora nós temos que ajustar para não perder esse passado de organização da nossa economia. O ajuste é importante para termos condição de recuperar a capacidade de crescimento de todo o país. Para Juiz de Fora, a questão é saber se nós vamos crescer mais, menos ou igual ao país. A intensidade que é importante dimensionar. Nós vamos ser muito ou pouco afetados pela crise nacional? Eu entendo que o município tem recebido muitos investimentos privados e públicos, com várias empresas no ramo comercial e industrial, várias obras públicas de esgotamento sanitário, obras viárias, o hospital. Isso sem contar no entorno, o Aeroporto Regional, a estrada para Belo Horizonte sendo privatizada. Têm investimentos na região e isso gera um colchão de amortecimento para nossas dificuldades. A gente vai sofrer com a questão nacional, mas teremos um amortecimento desses efeitos em função dos investimentos que foram feitos. Quando a economia sair da crise, quem tiver com cronogramas atrasados, podem nos ajudar a alavancar mais do que o país", revela o secretario.

Comércio é afetado

Em Juiz de Fora, o superintendente do Sindicato do Comércio (Sindicomércio) da cidade, Sergio Costa de Paula (foto ao lado), relembra que a situação vem sido sentida pelos empresários locais desde o ano passado. "Em 2014 não foi um bom ano para o comércio. As datas comemorativas ficaram todas abaixo da expectativa. Eram feitos investimentos que não foram atendidos pelos consumidores. Ano passado foi muito difícil. Nós tivemos Copa do Mundo, que gerou uma série de conflitos a nível nacional, e logo depois veio uma eleição disputadíssima que dividiu o país. Isso tudo durante uma crise que já vinha acontecendo. 2015 foi anunciado que seria um ano de aperto econômico, a gente já sabe que vai ser um ano ruim para o comércio", lamenta.

Insegurança

Na visão de Rotatori, a vida do brasileiro tende a se tornar mais insegura e difícil nos próximos anos, com a inflação em alta. "A pessoa recebe uma vez por mês, os bens estão subindo e o salário não acompanha. Terão que viver com um problema. A falta de perspectiva na economia afeta o emprego, a gente certamente vai notar um impacto na economia local, seja na indústria, que já não vinha bem nos últimos anos, seja na área dos serviços. Quando as pessoas se depararem com o preço das mercadorias subindo, elas tendem a cortar serviços que não são tão necessários e deslocar o foco para aqueles que são essenciais: alimentação, energia, transporte, moradia, despesas escolares. É deixar apenas as despesas fixas. Ao cortar os serviços, você tem o corte na economia local, que é uma característica de Juiz de Fora. Acredito que seja uma tendência da população", opina.

Zuchi reconhece que é provável que o setor de serviços sofra ajustes, mas ressalta que é outro setor que vem perdendo espaço na economia. "Os serviços e o comércio representam a maior parte do PIB nacional, e não é diferente no local. Nós somos uma cidade pólo, e temos essa tendência de ser mais forte nessa área. Comércio, serviço e indústria é administração pública. O setor de serviços é bem afetado num momento de crise e é provável que sofra um ajuste. Mas, até o momento, o que mais vem perdendo espaço no PIB é o setor industrial, com um crescimento negativo de 3 pontos no ano passado. A nossa estrutura é muito parecida com a nacional", fala o secretario.

Portas fechadas

A dificuldade econômica vem afetando o comércio e gerando uma reação em cadeia. Com o número de estabelecimentos que fecham as portas crescendo, o desemprego aumenta e o consumidor sai prejudicado. "O próprio empresário, locador, tenta. O proprietário pede 100% de aumento, mas não consegue. Alguns desses imóveis são contratos antigos e o preço estava bem defasado. Eu acho justo que o dono do imóvel peça o reajuste, mas de forma viável. Teve contratos que pularam de R$ 2 mil para R$ 15 mil. Alguns, com coragem, conseguiram pagar, mas tiveram que cortar no quadro de colaboradores. O CAGED vai apontar que o desemprego subiu, podem reparar. A cidade toda vive esse contexto, uma coisa puxa a outra", revela Sérgio.

Rotatori explica que esse os altos preços do aluguel não devem persistir por muito tempo, até por uma mudança que a cidade pode estar passando. "O proprietário até mantém a loja fechada por um tempo, mas depois ele vai começar a pensar que está abrindo mão de um aluguel de R$ 6 mil, mesmo querendo R$ 15 mil. Até pelo número de lojas fechadas, vai ser uma tendência. Mas você precisa entender a mudança no padrão de consumo de Juiz de Fora. É uma região confusa, cara em termos de deslocamento, de estacionamento. Você tem a formação de centros comerciais em outras áreas da cidade, então o que Juiz de Fora pode estar vivendo é um processo de esvaziamento do Centro por conta dessa mudança na decisão das famílias de se locomover ao centro. Não é um processo automático de reocupação, teria que ser olhado com atenção. Lojas fecham, é um processo natural, mas eu não acho que vão continuar fechadas por muito tempo", opina.

Há saída?

Segundo o professor, é possível sair deste cenário em um período médio. "A crise está aí e não vai embora tão cedo. Mas é possível sair, com um reajuste dos gastos públicos. Você tem um espaço bom de consumo. Muitas famílias ainda podem ter espaço para crescer. O mercado imobiliário tem muito espaço, muitas famílias ainda sonham com casa própria se tiverem opções de financiamento. Eu acho fundamental a decisão do governo de poupança pública, isso que é importante. Os cortes são necessários, mas se eles são os melhores, é uma decisão do gestor que está lá naquele momento. É uma medida necessária neste momento, pra sairmos desse momento de baixa expectativa. O governo ainda pode investir em infraestrutura e outras áreas carentes no Brasil, que dão bons retornos, e cuidar dessas áreas. Elas necessitam de capital, seja público, parceria, ou só privado. Nós temos boas perspectivas de retorno, então por que não é feito? No momento que isso se colocar, talvez a economia volte e gere crescimento. Se atacarmos os nossos problemas de infraestrutura, isso gera produção e a economia volta a crescer", conclui Wilson.

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