O limite da puni??o O caso da menina Isabella atingiu propor??o nacional e vem mexendo com a cabe?a das crian?as e tamb?m dos pais

Marinella Souza
*Colabora??o
08/05/2008

Era domingo ? noite quando a pequena Isabella Nardoni foi jogada pela janela do apartamento de seu pai, Alexandre Nardoni, e da madrasta, Anna Carolina Jatob?. A princ?pio, o crime teria sido cometido por uma pessoa que invadira o apartamento, mas semanas de s?rias investiga?es se seguiram e os principais suspeitos s?o mesmo o pai e a madrasta da menina. Na noite desta quarta-feira, 07 de maio, quase um m?s ap?s o crime, a pol?cia emitiu mandado de pris?o para o casal que vai responder o processo na cadeia.

Em Juiz de Fora, Jo?o Gabriel Alves Dayrell Drummond (foto abaixo), cinco anos, mesma idade da v?tima, a todo momento est? exposto ? massifica??o do epis?dio feita pelos meios de comunica??o, em especial a televis?o. Na sua inoc?ncia, o menino n?o entende direito os fatos e sente a sua curiosidade agu?ada cada vez que v? um novo fato sobre o crime. A m?e do garoto, a artes? aut?noma, Liliana Alves Maria Teixeira (foto abaixo), faz o que pode para tentar fazer o filho entender o que aconteceu.

Foto de Jo?o Gabriel "No princ?pio ele nem estava ligando muito, mas a exaust?o com que o assunto ? debatido na TV tornou inevit?vel que ele come?asse a fazer perguntas e associa?es. Um dia, em uma conversa com meus sobrinhos, ele comentou que a menina devia ser muito m? para merecer aquilo. Na mesma hora parei o que estava fazendo para mostrar que nada do que ela fizesse justificaria tamanha viol?ncia", conta.

Para a psic?loga infantil, Ana Paula Saar Santos, o ideal seria que Jo?o Gabriel nem tomasse conhecimento desse crime porque ainda ? muito novinho para distinguir entre realidade e fantasia. "Essa freq?ente exposi??o ? viol?ncia nos meios de comunica??o ? muito perturbadora para a crian?a. Ela pode criar um medo que na verdade n?o existe", diz. A psic?loga explica que s? depois dessa idade ? que os adultos devem deixar que a crian?a tenha contato com a realidade e, mesmo assim, ? preciso cautela.

"Ao comentar o assassinato ou qualquer outra situa??o de viol?ncia, os pais devem se limitar a responder ?s perguntas dos filhos com clareza e objetividade, sem fazer qualquer ju?zo de valor. Quando se entra muito em detalhes, suscita quest?es novas que v?o al?m do que eles querem e devem saber ? respeito". Para Liliana, a m?dia peca por esse excesso de detalhes s?rdidos e ela se pergunta: "at? que ponto essa sordidez de detalhes ? boa para o p?blico?".

Para o pequeno Jo?o Gabriel, a massifica??o s? serviu para impressionar, sem alterar seu comportamento. "Como aqui em casa n?s s? usamos a palmada como ?ltimo recurso, acho que ele n?o teve medo de que acontecesse o mesmo com ele, mas ele se impressionou, chegou a reconhecer uma capa de revista que falava do caso, mas de uma forma mais discreta, sem grandes manchetes, mas foi s?".

"Eu sonhei duas vezes com isso tamb?m, m?e!" - interrompe o menino. A revela??o ? uma surpresa para a m?e, mas ele n?o soube mais dizer como fora o sonho. Para Ana Paula, isso ? um ind?cio de que o assunto o incomoda. "? muito dif?cil analisar os sentimentos dele em rela??o a isso, mas de alguma forma, o caso est? mexendo com ele e, se isso n?o for bem trabalhado, pode causar problemas futuros"

Viol?ncia

A psic?loga explica que, crian?as v?timas de agress?o f?sica ou emocional, s?o propensas ? baixa auto-estima e ? inseguran?a porque a casa ? o primeiro lugar onde a pessoa tem como refer?ncia de seguran?a. "Se n?o tem seguran?a em casa, essa crian?a n?o vai conseguir encontrar seguran?a no mundo".

Foto de Liliana Teixeira Liliana (foto ao lado) levanta ainda outra quest?o em rela??o ? viol?ncia dom?stica: a incoer?ncia que pode gerar instabilidade nas crian?as. "Se voc? ensina o tempo todo que bater no irm?o, xingar o coleguinha ? errado, dar uma palmada ou ofend?-lo gera uma incoer?ncia absurda. Na cabecinha dele fica uma confus?o danada! A gente tem que ter muito cuidado na hora de repreender".

Segundo Ana Paula, Juiz de Fora pode ser considerada uma cidade com muitos casos de viol?ncia dom?stica, ainda que n?o sejam t?o explorados pela m?dia. "Os casos aqui na cidade s?o muito velados, n?o consigo precisar um n?mero, mas atendo muitas crian?as que sofrem algum tipo de viol?ncia f?sica ou emocional. Certa vez atendi um menino que via a m?e ser estuprada pelo pai constantemente e apresentava comportamento violento. O pai n?o entendia o porqu?".

Para a psic?loga, esses casos est?o mais freq?entes devido ao ritmo de vida que levamos. "Esses epis?dios se devem a v?rios fatores, como o estresse, a ansiedade, a culpa por n?o poder dar a devida aten??o aos filhos, n?o saber lidar com as crian?as. Hoje as pessoas n?o t?m tempo de olhar para elas mesmas, para a fam?lia que construiu, agem no impulso sem parar para analisar o pr?prio comportamento, pensar nos sentimentos", avalia.

Como corrigir?

Diante de tantas cenas atrozes, ? comum que os pais contempor?neos sintam medo das pr?prias rea?es e se perguntem qual a melhor maneira de ensinar seus filhos pequenos a agirem da forma correta. Cada um tem o seu jeito de corrigir, mas ser? que ? o correto?

Sem fazer uso da viol?ncia, Liliana e o marido desenvolveram o "m?todo 1,2,3" que at? agora tem resolvido com os filhos pequenos, Jo?o Gabriel (foto abaixo, ? esquerda) e Pedro In?cio (foto abaixo, ? direita), este de tr?s anos. Mas ela admite que n?o sabe at? quando isso vai resolver. "Por enquanto eles ainda n?o me fizeram chegar no '3' e eu tenho medo de quando isso acontecer. Nunca pensei no que fazer no '3'", revela.

Foto de Liliana, Jo?o
 Gabriel e Pedro In?cio Enquanto os meninos se comportam, o castigo continua sendo a melhor pedida para as traquinagens infantis, mas a artes? confessa que tem que ter muita paci?ncia. "Eu os coloco sentados no quarto, com a porta aberta para evitar problemas mais s?rios e eles saem toda hora, tenho que ficar mandando voltar, luto para n?o ser vencida pelo cansa?o. O Jo?o Gabriel j? entendeu que ? mais r?pido se ficar direito no castigo, mas com o Pedro In?cio a luta ? muito grande".

Ana Paula tamb?m aposta no castigo como um bom m?todo de corre??o, mas faz uma ressalva: "o ideal ? que antes de colocar de castigo, os pais expliquem o porqu? disso. A auto-conseq??ncia ? muito importante para que a crian?a n?o repita o erro". O ideal, segundo a psic?loga, ? que o adulto se abaixe, fique da altura da crian?a, olhe nos olhos e diga, com calma, o que quer que ela fa?a. E tem que ser na hora. "Se voc? deixar para repreender depois, ela n?o vai entender porque est? sendo punida, fica fora de contexto", explica.

Outra dica: se prometer alguma recompensa ou puni??o, cumpra. Caso contr?rio, o pequeno vai acabar manipulando o adulto da maneira que melhor lhe convier. "A crian?a tem que ser estimulada quando faz algo bom, correto. Um elogio, um abra?o ou mesmo a conquista de algum direito em casa, s?o as ferramentas nesse processo. Da mesma forma se a puni??o ao erro for n?o tomar sorvete, deve ser cumprida para que a crian?a seja educada desde cedo e jamais lhe tire do s?rio".

*Marinella Souza ? estudante de Comunica??o Social da UFJF