Cecília Junqueira Cecília Junqueira 21/08/2015

A descriminalização da droga: liberdade ou escravidão?

Deve ser julgado ainda este mês pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a descriminalização do porte e do cultivo para uso próprio de drogas, em especial a maconha.

Os favoráveis à descriminalização partem da premissa de que o usuário de droga não é traficante, portanto não prejudica a terceiros, e que a auto lesão (usar drogas), exige tratamento e não cadeia.

Mas o que separa um usuário de um traficante? Embora hoje os dois retroalimentem a violência, prostituição, tráfico de armas e jogatinas, existe um enquadramento legal que os difere.

No Brasil, é o juiz quem decide esse enquadramento do flagrado, com base em contextos sociais e pessoais.

Essa subjetividade interpretativa gera uma realidade prisional anômala: pobre no Brasil é traficante e rico é usuário.

E mais, um a cada três presos estão relacionados ao narcotráfico. Já para as mulheres, o tráfico ocupa a primeira colocação. O prejuízo na estrutura familiar, financeira e cultural para o país é incomensurável. São pessoas que poderiam ser artistas, floristas, matemáticos, professores, pedreiros, mas foram parar na vala da obscuridade do sistema prisional brasileiro, se não entra marginal, sai marginal...

Se faz imperativo que nossas leis sejam mais específicas sobre usuário eventual, dependente e traficante. E que a legislação seja clara e dê respostas em caso de crime sob efeito de drogas, que tenhamos penas alternativas (educativa/pedagógicas) mais efetivas, como tratamento para o dependente químico, prestação de serviço comunitário, oportunidade de ressocialização. Isso que devolve ao sujeito o seu senso de amor próprio, de coletividade e de dignidade. O encarceramento deveria ser a última opção, embora seja a primeira para os pobres, que são a parcela da população que mais apanha com a ausência do Estado...

Concordo que existam muitas injustiças prisionais, mas não é porque o sistema prisional está falido que se justifica a descriminalização. A gente tem sim que melhorar a qualidade das prisões e da filtragem de quem realmente precisa passar um tempo nela.

Descriminalizar por ter perdido o controle é assumir a incapacidade de superar as demandas de saúde pública e segurança. É como falar "se não pode vencê-los, junte-se à eles..."

Como o país não consegue reprimir o tráfico (porque muitas das vezes faz até parte dessa rede de corrupção), prefere trazer o uso da droga para o controle do Estado, regulamentando o uso e cultivo, cobrando impostos.

No país do "Pixuleco", não acredito que tenhamos estrutura para regulamentar o uso e institucionalizar a cracolândia, nem sistema de saúde para suportar o aumento de dependentes químicos com a legalização.

Reflexões acerca de uma possível descriminalização no Brasil:

  • Os favoráveis à descriminalização de uso de drogas no Brasil alegam que as pessoas têm que ter sua liberdade de escolha assegurada pelo Estado, pois o uso da droga só faz mal à elas.

Falso: Dizer que a droga afeta só a si mesmo é um argumento facilmente derrubado ao conversamos com familiares de usuários que têm sua vida destruída e sobrecarregada emocional e financeiramente. Além dos prejuízos para os cofres públicos na área de saúde, manutenção do sistema prisional e de segurança...

  • A descriminalização do uso de droga tiraria força do traficante.

Falso: Quem disse que o traficante só vende maconha? O traficante só vai migrar para outras drogas e outros crimes, como roubo, furto, (sim, existe diferença!) sequestro relâmpago... Este mês a polícia desmantelou uma quadrilha de traficantes no Rio de Janeiro poderosa, mas o secretário de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro (Beltrame), já avisou que em questão de dias haveria uma nova reorganização criminal, a fim de ocupar o nicho vazio, e seria eleito um novo chefe do tráfico. Entende como é complexo o negócio?

  • O usuário não oferece risco para sociedade

Depende: A droga desencadeia uma relação não social do sujeito com o mundo, é responsável pela mudança de personalidade, gera isolamento, euforia, depressão, agressividade, mudança de caráter...

  • Descriminalizar vai diminuir o consumo

Falso: Quando o consumo é autorizado, o adolescente experimenta mais. A pesquisa mostra que somente uma pequena parcela dos jovens que prefere o proibido. Diminuir o consumo, não é o que tem acontecido nos EUA, em que a indústria da maconha quase dobrou nos últimos 2 anos, nem na Holanda, Dinamarca e Suíça, em que a criminalidade e o turismo de drogas aumentaram, além da venda clandestina de receita medicinal. Estes países estão repensando esse comportamento moderninho.

  • E por fim, a maconha é inofensiva

Falso: A maconha interfere caoticamente nas sinapses nervosas do cérebro podendo causar processos psicóticos irreversíveis, mais do que qualquer outra droga. Está relacionada à esquizofrenia, bipolaridade, depressão, processos fóbicos, gera dependência física e psicológica. Ela é 5x mais cancerígena que o cigarro, pelos altos índices de alcatrão e monóxido de carbono. É a droga ilícita mais consumida no mundo e os danos para os adolescentes são maiores, pois estão em processo de formação. As pessoas que fumam maconha e que dizem que conseguem ter uma vida produtiva certamente seriam mais produtivas sem a droga, as perdas são inevitáveis, inclusive do desempenho intelectual.

A descriminalização do usuário iria, de imediato, esvaziar cadeias, o que é de fato, um grande alívio. Mas não iria resolver o problema de epidemia pública que é a dependência química, nem diminuiria o sofrimento dos familiares dos dependentes de drogas, nem o problema do tráfico que vai além da maconha.

Descriminalizar é tão somente mascarar a escravidão em liberdade...


Cecília Sertã Junqueira Rodrigues é Terapeuta Conselheira em Dependência Química, presta consultoria para empresas e escolas e aconselhamentos individuais em clínica.

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