Depoimento de J?lio Polidoro
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No final dos anos setenta, mais precisamente em 1979, lancei meu primeiro livro, "Treze poemas essenciais", do pr?prio bolso. At? ent?o havia publicado uns folhetos de poesia (Poesia e L?ricas) e participado de algumas publica?es, como a revista "O Lince", desde 1976. Praticamente n?o conhecia ningu?m do meio liter?rio. Curiosamente, as primeiras pessoas das quais me aproximei foram os artistas pl?sticos de Juiz de Fora (Ruy Merheb em especial, mais Dnar Rocha, Arlindo Daibert, Paulinho Pinto, Vin?cius e Breno Chagas).
Em 1980 conheci Jos? Santos Matos, na minha opini?o, o mais atuante dos "atores" dos tempos do folheto Abre alas e da revista d'lira. Jos? Santos era (e ?, penso) uma verdadeira m?quina de trabalhar. Ousado, criativo, l?der nato, conseguia centralizar e delegar a?es com uma efici?ncia impressionante. Hoje o Z? dirige o "Museu da Pessoa", outra sacada genial do seu esp?rito criador. Parece que ainda continua escrevendo (espero que sim!), tendo publicado um livro em co-autoria com o filho, n?o faz muito tempo. Em termos pr?ticos, eu diria que Abre alas e d'lira n?o teriam acontecido sem o Jos? Santos.
O Z? n?o gostou do meu livro. Viv?amos uma ?poca ainda polu?da pelo ran?o ditatorial, a poesia que se produzia ent?o tinha forte refer?ncia pol?tico-ideol?gica, at? mesmo panflet?ria. N?o era o caso do meu livro. Atrav?s do Z? Santos me aproximei de outros agentes culturais: Gilvan Ribeiro, Marcelo Passos, Petr?nio Dias, Suraia Mockedeci, Patr?cia Borges, Jos? Henrique da Cruz, Walter Sebasti?o Barbosa Pinto, Jorge Arbach, Luiz Guilherme Piva, Luiz Ruffato, Edimilson de Almeida Pereira, Camilo Mota, Iacyr Anderson, Fernando Fiorese, Mauro Fonseca e diversos outros que a mem?ria n?o contempla agora. Um primeiro esfor?o, mais pretensioso, pretendia reunir artistas pl?sticos, escritores e poetas, fot?grafos e todo tipo de agentes culturais em torno de um projeto inicialmente nomeado "Sociedade de Articultura". Participei de diversas reuni?es da "sociedade". Infelizmente a id?ia n?o vingou e o grupo, m?ltiplo no in?cio, pulverizou-se, inevitavelmente. Foi da? que surgiu a id?ia de se realizar um trabalho mais espec?fico. Ent?o, o pessoal da literatura produziu o primeiro Abre alas, em parceria com o Col?gio Magister, que j? n?o existe, sendo que o folheto foi impresso nas prec?rias oficinas do DCE. Logo depois vieram os "varais de poesia" no cal?ad?o da Rua Halfeld, em frente ao cinema Central onde, utilizando um megafone, a gente recitava poesia e pendurava textos no "varal". Pessoas comuns entravam na "brincadeira", recitando ou colocando poemas no varal.
O "Abre alas", com o tempo, tomou ares mais profissionais, tanto no tratamento gr?fico quanto na distribui??o. Tivemos um bom contato com os poetas das grandes metr?poles, e muitos autores consagrados passaram a colaborar com as publica?es, enviando textos in?ditos. Participei, como membro do Conselho Editorial, de incont?veis reuni?es do mesmo, sempre na casa do Z? Santos, primeiro na Av. Rio Branco, depois na Get?lio Vargas e na Av. Perry. Tamb?m passei madrugadas inteiras dobrando e encartando edi?es do folheto. Rapaz, esse exerc?cio de mem?ria me faz recordar momentos impag?veis que vivemos juntos. Lembro-me de quando a banda "L?ngua de Trapo" tocou no Campus da UFJF. Eu estudava filosofia. Cada um de n?s saiu a campo vendendo Abre alas para os estudantes. Vendi todos que tinha comigo. S? que gastei o dinheiro apurado com birita. ? claro que depois tive que repor. Nesse per?odo tamb?m escrevi um livro, chamado P?tios e gal?s e que, gra?as a Deus, n?o publiquei. Influenciado pela poesia "engajada" que se fazia, ou que se pretendia fazer naquela ?poca, entrei "na onda" e fiz minha panfletagem temb?m. O livro, evidentemente, n?o era bom. Estive um per?odo afastado do grupo, exatamente quando come?ou a revista. Quando me reaproximei, passei a fazer parte do Conselho Editorial da revista. Pena que a essa altura as dificuldades materiais se avolumavam e a revista n?o "aconteceu".
Tivemos ainda, durante algum tempo, uma p?gina num extinto jornal, se n?o me engano chamado "Gazeta Mercantil", a qual passou a ser publicada, depois, no tamb?m extinto "Tribuna da Tarde".
V?rios de n?s passamos a usar, tamb?m, a chancela "d'lira" nos livros que publicamos no per?odo. Foi o caso do meu segundo livro, "Pequenos assaltos". Dos anos oitenta guardo muito fortemente a lembran?a da "viv?ncia de grupo", daquela sensa??o de "perten?a" que me ? t?o cara at? hoje. Como tive oportunidade de comentar em recente simp?sio organizado pela UFJF, essa "experi?ncia dos ensaios", por mais emp?rica que tenha sido, foi algo marcante e fundamental na minha forma??o est?tica. Que nem t?o emp?rica foi, a bem da verdade. Nas reuni?es do Conselho editorial, a despeito dos la?os afetivos que nos uniam, ?ramos bastante rigorosos uns com os outros, quando se tratava de avaliar e elencar o material a ser publicado. Independentemente das nossas limita?es intelectuais, estes "exerc?cios" foram determinantes para a nossa forma??o.
Hoje, cada qual segue seu pr?prio caminho; muitos nem escrevem mais, ao que parece, ou n?o publicam; outros, como gosta de dizer Rolando Boldrin, "viajaram fora do combinado", como Jos? Henrique da Cruz e Mauro Fonseca. Remanescentes como eu, Iacyr, Edimilson, Fiorese, que temos convivido mais estreitamente ao longo de tantos anos, continuamos a escrever e publicar. Confesso que me sinto honrado por fazer parte desta caminhada. Este talvez seja o maior poema: aquele que "nos escreve" na entrelinha, e que nos une.
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