A Câmara Municipal de Juiz de Fora realizou nesta quinta-feira (23) uma Audiência Pública para discutir a possibilidade de atendimento 24 horas às vítimas de violência doméstica. O Requerimento, assinado pela vereadora Tallia Sobral (PSOL), reforça a necessidade do atendimento noturno a partir dos dados divulgados pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.
De acordo com as informações, o Brasil tem 31 mil denúncias de violência doméstica ou familiar contra as mulheres em 2022. A vereadora proponente destaca ainda que a medida é fundamental porque “o horário de maior ocorrência dos casos acontece fora do horário comercial e convencional de funcionamento das políticas públicas de atendimento”.
A advogada e colunista da Acessa.com, Paula Assumpção, citou casos recentes e assustadores de feminicídio e tentativas de feminicídio ocorridos em Juiz de Fora nas últimas semanas, como o caso da vítima que sofreu facadas no Dia Internacional da Mulher e o caso de violência patrimonial, que fez uma mulher atear fogo no próprio corpo, no Bairro Vila Esperança. Paula pediu à Câmara que impulsione medidas que garantam e fortaleçam as redes de apoio. “Quando precisamos chamar uma viatura para atender a uma mulher, o sistema já falhou. Que as mulheres sejam salvas antes de ter que realizar um registro.”
Paula salientou que em bairros populosos, com a maior concentração de ocorrências de violência contra a mulher, como São Pedro e Benfica, é preciso buscar soluções para que o acolhimento consiga chegar antes da necessidade de ter que registrar uma ocorrência.
Para a subcoordenadora do Centro Integrado de Atendimento à Mulher (CIAM), Rosângela Gonzaga, é fundamental contar com o apoio em rede e trabalhar em conjunto com os demais espaços que acolhem as mulheres em situação de violência na cidade. “Nós não concorremos, pelo contrário, trabalhamos em conjunto, aumentando os pontos em que as mulheres podem buscar ajuda. No Ciam, como é um ponto central, as mulheres podem entrar discretamente. Nosso principal objetivo é acolher e empoderar as mulheres, para que elas possam decidir o próximo passo que darão. Contamos com departamento jurídico, psicóloga e assistente social.”
A coordenadora de Políticas para Mulheres da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), Samara Miranda, ressaltou que falar de política pública para as mulheres é um tema caro e delicado, porque envolve questões de gênero e precisa de uma ação transversal e inclusiva, que também deve considerar recortes fundamentais, como o racial. “ A violência vai ser mais cruel com as mulheres pretas da periferia. O atendimento demora a chegar, quando a pessoa que vai acolher não tem o cuidado com essa mulher, com o lugar onde ela mora, qual a história, mínimo de afeto. Polícia pública se faz com dado e afeto, porque falamos da história das pessoas.”
Nesse sentido, Samara pontuou que faltam políticas públicas que partam do Governo Federal. “Nossa esperança, é ter como contar novamente com Ministério das Mulheres. Teremos novas diretrizes, porque precisamos de investimento. Temos avançado, mesmo sem direcionamento federal. Dentro da Secretaria de Direitos Humanos, temos uma visão 360 graus que inclui as crianças, mulheres, idosos, jovens, LGBTQIA+, pessoas com deficiência. Trabalho em parceria com a Fernanda Moura (coordenadora da Casa da Mulher) e olhado para a Casa como lugar de acolhimento e efetivação de política pública de acolhimento especializado. Não acolhemos só violência doméstica e familiar, mas violências de gênero. Colegas sofrem violências veladas ou não. Isso é um início.”
A integrante do Coletivo Maria Maria, Débora Renault, salientou a importância de fortalecer os núcleos que se dedicam ao cuidado com a mulher, como o Ciam, Casa da Mulher, OAB Mulher, Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), entre outros. Porém, para ela, o local em que a delegacia está hoje, não é adequado- atualmente, a Deam funciona dentro do Santa Cruz Shopping, no Centro- “Temos a ideia de que ela .Entra ali para fazer uma compra e ela não é vista. Para nós, isso não é a realidade, está em vulnerabilidade, está exposta nos bancos na frente da delegacia, machucadas, não é espaço adequado para ser a delegacia. Esse atendimento precisa estar integrado com outros espaços multidisciplinares.” Ela reforçou a necessidade de contar com um equipamento que possa prestar atendimento fora do horário comercial, durante a noite e aos fins de semana, quando há um número maior de ocorrências. “Outras delegacias fazem esse atendimento em horários diversos, mas não com o olhar diferenciado da Delegacia da Mulher. Queremos que as mulheres sejam atendidas pela Deam. Isso não pode ser utopia. Governo do Estado tem que tratar como prioridade.”
Beth Martinho, do Movimento Mulheres em Luta, relatou como uma vítima de violência, o quanto o atendimento hoje possui lacunas. “Sofri na pele. Venho de um bairro periférico, mulheres pretas de periferia, não temos políticas públicas voltadas para nós. Movimento de mulheres em luta, sabemos que não é suficiente. A gente precisa lutar por uma delegacia 24 horas. É importante estar com esses espaços de acolhimento nas regiões, onde acontece a violência sem amparo.”
A integrante do Fórum 8M, Leiliane Germano, reiterou que muitas mulheres precisam atravessar a cidade para conseguir realizar uma denúncia, destacou o quanto são alarmantes os números que mostram que as mulheres nas periferias são a maior parcela entre as vítimas. Para Leiliane é fundamental pensar na prevenção a partir da Educação. Desde cedo ensinando nas escolas o que é o machismo e quais são os efeitos da violência causada por ele.
“Cobramos que essa Casa discuta isso, que tenhamos liberdade de falar de gênero e de uma Casa Abrigo sigilosa para proteger as potenciais vítimas de feminicídio. Precisamos de políticas públicas para usar UBSs, que são as principais portas de entrada, já que 76% das mulheres chegam no acolhimento pelo equipamento de saúde. Porque não debatemos como problema de saúde pública? Enquanto uma mulher não estiver segura, nenhuma de nós vai estar”.
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