L?der do MST critica democracia brasileira, faz apanhado hist?rico e diz n?o saber mais qual a sa?da para crise que se abate sobre o pa?s
Ricardo Corr?a
Rep?rter
05/05/2006
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Depois de criticar duramente o modelo aplicado pelos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor de Mello, e de ter chamado o Governo Lula de "um governo sem projeto", Jo?o Pedro St?dile perguntou: "Ent?o qual ? a sa?da?". Ele mesmo respondeu: "N?o me perguntem".
Se n?o quis dar essa resposta a quem acompanhou sua palestra nesta quinta-feira, dia 4 de maio, no ICH, o l?der nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), tentou dar muitas outras. Convidado para palestrar na UFJF pelo Diret?rio Central dos Estudantes, o pol?mico l?der manteve suas cr?ticas ? imprensa, ao sistema pol?tico brasileiro e, mais do que isso, desfilou seu repert?rio de frases contundentes. Durante cerca de uma hora, tra?ou todo o hist?rico da democracia brasileira de uma ?tica diferente, recebendo aplausos dos estudantes muitas vezes, e n?o deixando de usar palavr?es ou express?es mais fortes para se referir a figuras pol?ticas que abomina.
Assim como em outra vinda ? cidade, antes da elei??o do presidente Lula, St?dile abriu seu voto. Apesar de todas as cr?ticas e de em alguns momentos at? ridicularizar o presidente, deixou claro que ap?ia o petista nesta elei??o. Mas reconheceu que a esquerda dessa vez tem outras op?es.
"Essa elei??o ? um pouco diferente porque a esquerda est? dividida. Desde 1984 que a esquerda estava com o Lula. Nessa elei??o a esquerda vai dividida. Tem aqueles que como eu v?o votar no Lula. Tem quem v? votar na Helo?sa Helena. Tem tamb?m aqueles que torcem para que Itamar Franco saia candidato e votariam nele. Tem quem vai anular e tem gente que vai pescar. Vai visitar a m?e, vai fazer outra coisa ao inv?s de votar. Isso ? revelador", lembrou o l?der, que avaliou a atual situa??o dos movimentos sociais no pa?s, e reconheceu que o momento ? de descenso.
Jo?o Pedro St?dile fez uma introdu??o antes de come?ar efetivamente sua palestra e, nela, atacou as universidades particulares. Disse que elas enganam os estudantes ao oferecerem "diplomas que n?o valem nada" e defendeu a cria??o de mais vagas nas universidades federais.
Para isso, comparou o Brasil ? Cor?ia do Sul. Com economias semelhantes, segundo St?dile, os coreanos possuem 97% dos jovens chegando at? a Universidade, enquanto no Brasil esse ?ndice n?o chega a 8%.
"Se s? 8% dos nossos jovens podem entrar na universidade, nossa sociedade n?o ? democr?tica para o ensino superior. Democracia n?o se mede pelo direito de votar, mas pelo grau de oportunidade que as pessoas t?m para prosperar", lembrou, antes de come?ar a falar de reforma agr?ria, o tema que lhe solicitaram para discursar em Juiz de Fora.
Reforma Agr?ria
O l?der do MST defendeu que bens da natureza, como a terra, a ?gua e o clima
n?o podem ter propriedade. "Ningu?m pode dizer: 'Essa terra ? minha. Fui eu
que fiz, ela ? fruto do meu trabalho'. N?o ? como essa cadeira, por
exemplo", disse o l?der que acusou o governo de estar querendo tamb?m
privatizar a ?gua, depois de privatizar a terra. Nesse momento, lembrou os
rumores de privatiza??o da Cesama, companhia de abastecimento que opera em
Juiz de Fora e atacou. "? uma picaretagem"
Jo?o Pedro St?dile comparou a luta entre trabalhadores e propriet?rios no campo ? luta por uma produ??o interna contra o privil?gio para o agroneg?cio de exporta??o. Ele lamentou o fato de que apenas 1% dos brasileiros detenham 48% das terras no pa?s. Defendeu as invas?es de propriedades por dizer que as terras eram p?blicas at? meados do S?culo XIX.
"Eles n?o suportam o MST, mas os que mais invadiram terras nesses pa?s foram esses 1%, que ocuparam 48% das terras. At? 1850 todas as terras do pa?s eram propriedade da coroa. Eram p?blicas. Podia usar mas n?o podia vender nem comprar", reclamou.
O economista sem terra avaliou que, durante 400 anos, o Brasil desenvolveu um modelo que privilegiava a agroexporta??o e disse que o MST defende ? a produ??o de alimentos para o mercado interno, para suprir um d?ficit existente.
Em sua avalia??o hist?rica, ele lembrou o conceito de Industrializa??o Dependente, que Florestan Fernandes utilizou para nomear o processo de industrializa??o brasileira ocorrido entre as d?cadas de 30 e 80. St?dile explicou que o capitalismo brasileiro encontrou nessa ?poca uma f?rmula milagrosa de acumular e desenvolver o pa?s ao mesmo tempo, utilizando como comprova??o as altas taxas de crescimento da economia brasileira no per?odo.
"A cada doze anos a fam?lia dobrava o seu patrim?nio. Hoje isso n?o acontece mais. Ent?o houve um crescimento, mas manteve a concentra??o", lamentou St?dile, que lembrou ainda que existem burgueses, nome que ele utiliza para os ricos, e burgueses apenas de cabe?a, que n?o possuem capital e propriedades relevantes mas ostentam o status como se fossem. "Em Juiz de Fora n?o tem ningu?m burgu?s. S? de cabe?a. De patrim?nio n?o tem. S? os donos da Mercedes, mas esses n?o est?o aqui".
O grande embate de 1989
Ap?s o fim desse per?odo de industrializa??o dependente, surgiram os
movimentos de massa que, no in?cio, lutavam era contra a ditadura.
"T?nhamos a ilus?o de que acabar com a ditadura resolvia o problema. Derrubamos os militares, reconquistamos nosso direito de escolher o presidente mas n?o foi suficiente", disse St?dile que apontou as elei?es de 1989 como o grande momento de embate entre a constru??o de um capitalismo democr?tico, representado por Lula ou a entrega ao capitalismo internacional, nas m?os de Collor. "Aquela derrota de 1989 n?o foi uma derrota eleitoral. Foi uma derrota de como sair da crise. Gerou um processo de des?nimo. Criou um descenso do movimento de massa. De l? para c? os trabalhadores s? perderam e n?o conseguiram mais se mobilizar", lamentou.
Cr?tica aos Fernandos
Ap?s esse momento, de acordo com St?dile, vieram governos que praticaram o
que alguns chamam de "neoliberalismo", que o l?der do MST conceitua como
"conjunto de pol?ticas econ?micas para garantir liberdade total apra o
capital. Nessa parte da palestra, s? poupou Itamar Franco, por dizer que o
seu per?odo interrompeu, por dois anos, esse tipo de pol?tica. A Collor e,
principalmente a Fernando Henrique, sobraram ofensas.
St?dile atacou as privatiza?es e citou o exemplo da Vale do Rio Doce. Em diversos momentos fez quest?o de escrever no quadro para onde iria o lucro da empresa ap?s as privatiza?es. Chegou a falar da Petrobras e disse que Fernando Henrique s? n?o privatizou a empresa por medo dos militares. Mas que, com a venda de a?es na Bolsa, 48% do lucro da empresa iria para os Estados Unidos.
Por isso, chegou at? a se mostrar contente com a decis?o do governo boliviano de nacionalizar a produ??o de petr?leo e g?s no pa?s, por prejudicar os interesses da empresa. Jo?o Pedro St?dile comparou o crescimento m?dio da economia, na casa de 2,5% ao ano, ao crescimento m?dio da popula??o no per?odo, de 2,3%, para dizer que a economia brasileira ficou praticamente estagnada.
"O neoliberalismo foi um desastre. E os capitalistas n?o exploram mais o trabalhador pelo trabalho, e sim pelos servi?os e pelos juros cobrados", disse ao lembrar de como o brasileiro paga caro para usar um celular, por exemplo.
A elei??o de Lula
Defensor da candidatura de Lula nas elei?es de 2002, St?dile ressaltou que
a elei??o foi in?dita por ter se dado em um momento de decenso do movimento
de massa e n?o ter sido fruto de fato do movimento de luta.
"Foi fruto do voto do desespero, de quem queria o fim do neoliberalismo", lembrou St?dile que contabilizou na vit?ria de Lula a raiva do povo, ao fato da campanha ter sido despolitizada e de parte da burguesia, que se assustou com a crise argentina, ter apoiado o candidato do PT com medo de que a situa??o se repetisse no pa?s.
"Mas eles fizeram um acordo com o Lula, que foi a Carta ao Povo Brasileiro, onde ele se comprometeu a n?o modificar a pol?tica econ?mica". Neste momento St?dile criticou bastante o governo, ao qual chamou de "amb?guo".
"As for?as de direita seq?estraram Lula. A economia ficou controlada pela direita. E a esquerda ficou com a ?rea social, que n?o tem dinheiro e n?o manda nada. O governo Lula n?o tem projeto", disse ele, antes de assumir que votar? novamente no candidato petista. Assim mesmo, ressaltou que a sa?da para o problema n?o est? nas elei?es e sim em um reacenso dos movimentos sociais. Ele acredita que, tendo algu?m da esquerda no poder, mesmo nessas condi?es, ? mais f?cil isso acontecer do que se a direita voltar ao Planalto.
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