Terça-feira, 6 de julho de 2010, atualizada às 20h28

Promotor dá voz de prisão à superintendente Sueli Reis

Clecius Campos
Repórter

O que seria uma sabatina sobre a situação do bota-fora do bairro Barreira do Triunfo virou caso de polícia. Alegando desacato à autoridade, o promotor de Justiça do Meio Ambiente e Urbanismo, Júlio César da Silva, deu voz de prisão à superintendente da Agência de Gestão Ambiental de Juiz de Fora (Agenda-JF), Sueli Reis.

A atitude foi tomada após Sueli invadir o gabinete do promotor para se explicar sobre a ausência na audiência marcada por ele para esta terça-feira, 6 de julho. "Eu estou aqui desde às 15h e o senhor inverteu a ordem das reuniões, sabendo que eu tinha outro compromisso com o Ministério Público. Por isso tive que me ausentar", argumentou a superintendente, referindo-se à mudança de horário da audiência, antes marcada para as 15h e passada para as 15h30, horário em que seria realizada audiência com o secretário de Obras (SO), Jefferson Rodrigues Júnior.

As palavras, porém, não convenceram o promotor. "A senhora mesmo pediu que a reunião fosse remarcada para esta semana. Desde o dia 30 de junho o Ministério Público espera esclarecimento sobre o assunto." Quando o promotor insistiu que Sueli estava se negando a prestar informações, não comparecendo à convocação, a chefe da Agenda-JF disparou. "O senhor está se fazendo de bobo."

Exaltada, Sueli tomou o processo das mãos de Silva para mostrar aos jornalistas uma certidão de que estava em audiência na Promotoria de Justiça do Consumidor, às 16h, momento em que começaria o encontro com Silva. Ao tentar mostrar a última página do documento, a superintendente acabou rasgando o processo. "A senhora invadiu minha sala e me desacatou. Tirou o processo de minha mão. Quer ser presa por desacato?", ameaçou Silva.

Foto de promotor dando depoimento à Polícia Foto de Sueli Reis

"Do senhor eu espero qualquer coisa", respondeu Sueli, que deixou o gabinete. O promotor então solicitou à sua secretária que chamasse a Polícia Militar (PM) para que prendesse Sueli por desacato. "Isto é um atentado ao Ministério Público." Um dos advogados da Procuradoria Geral do Município, que acompanhou a discussão, Luís Fernando Sirimarco Júnior, tentou conter Silva. "O senhor não deu voz de prisão a superintendente." E Silva retrucou. "Quer receber voz de prisão também? O senhor está dando fuga a ela", disse enquanto Sueli deixava o prédio da promotoria.

Quando a PM chegou, Sueli já não estava no local. Os policiais colheram depoimentos do promotor e qualificaram testemunhas. Segundo o sargento que comandou a ocorrência, a superintendente encontrava-se em flagrante e precisava ser localizada. Os advogados, que continuaram no local, não sabiam informar onde Sueli estava.

Coletiva de imprensa

Mais tarde, Sueli Reis convocou a imprensa para uma entrevista coletiva, a fim de esclarecer o acontecimento. A superintendente não se considera uma foragida. "Ele [o promotor] não me deu voz de prisão. Além do mais, estou aqui, de peito aberto. Então, não sou foragida." Sueli explica que agiu daquela forma para se impor ao que ela chamou de "abuso de poder, arbitrariedade e mentira". "Diante disso, não poderia me calar. Considero minha conduta adequadíssima."

Sueli afirma que ela e funcionários da Agenda-JF são perseguidos, constrangidos e mal-tratados pelo promotor. O jurista teria o costume de requerer informações sobre andamentos realizados no órgão para serem entregues em prazos curtos. "Venho tolerando este comportamento há algum tempo." Quanto à possibilidade de ser presa, a superintendente afirma tomar providências para sua defesa.

Ausência justificada

Sueli afirma ter justificado sua ausência no dia 30 de junho ao Ministério Público por meio de um atestado médico, datado de 5 de julho, que foi juntado ao processo. Segundo ela, uma cólica intestinal, com vômito e diarreia foi o motivo para se ausentar. No entanto, no dia 30 de junho, chegou às mãos de Júlio César Silva um ofício assinado por Sueli, justificando o atraso por outro motivo: compromisso previamente agendado. "A situação me parece estranha", analisa Silva.

A superintendente se defende. "Na véspera da reunião [dia 29 de junho] eu já estava me sentindo mal. Sou uma mulher elegante, não queria que constasse em um documento minha situação de saúde. Por isso não entrei em detalhes."

Bota-fora

A situação do bota-fora de Barreira do Triunfo terminou sendo coadjuvante. Em audiência realizada com o secretário de Obras, Jefferson Rodrigues Júnior, o promotor ponderou as obrigações do órgão e solicitou que a administração municipal mostre até a próxima segunda-feira, 12 de junho, a contabilidade da manutenção do bota-fora. Segundo Júnior, o documento será solicitado junto à contabilidade da SO.

Silva citou a Resolução 307/2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que proíbe a criação de bota-foras no país e obriga o envio do resíduos da construção civil para a reciclagem. Segundo Rodrigues, um antigo projeto para a construção da usina de reciclagem está sendo adaptado. Ainda não há local definido para sua instalação, mas uma área de propriedade da Prefeitura no bairro Santa Cruz, pode ser seu destino.

Segundo Rodrigues, um financiamento junto ao Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) para a obra já foi solicitado. A liberação dependeria apenas de análise da Secretaria do Tesouro Nacional (STN). A linha de crédito é no valor de R$ 15 milhões.

Ação civil pública

O promotor prossegue em impetrar ação civil pública por improbidade e gastos com o erário público, contra os responsáveis pela criação do bota-fora. Segundo ele, por ser irregular, o gasto de dinheiro público também pode ser considerado ilegal. Devido à falta de Sueli, Silva resolveu convocar o prefeito Custódio Mattos para dar esclarecimentos sobre o convênio de implantação do bota-fora, nesta sexta-feira, 9 de julho.

O depoimento fará parte da etapa de produção de provas. O próximo passo é ajuizar a ação, que acusará os responsáveis por crime contra o meio ambiente, já que o laudo do Instituto Estadual de Florestas (IEF) aponta depósito de resíduos em área de preservação permanente, além de irregularidades no depósito de lixo comum no local.

A superintendente da Agenda-JF, Sueli Reis, exibiu ata de reunião com a Superintendência Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Supram), em que ficou acertado por anuência que o parecer do Instituto Estadual de Florestas "não possui elementos que permitam caracterizar a área em questão como sendo de preservação permanente".