SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - No ar na novela "Cara e Coragem" (Globo), a atriz Maria Eduarda de Carvalho, 39, assegura que alcançar a fama nunca foi a razão para a escolha de sua profissão. Apesar de na trama interpretar a famosa atriz Andrea Pratini, uma verdadeira diva, a artista reforça que "a rotina deste ofício não tem nenhum glamour".
Para ela, as longas horas de trabalho, instabilidade financeira e "a desagradável sensação de eterno recomeço" são companheiros ao longo da carreira. "Eu só insisto em ser artista, porque não tenho escolha", completa ao dizer que decidiu ingressar no mundo das artes aos 13 anos, quando fazia curso no Teatro Tablado, de Maria Clara Machado, no Rio de Janeiro.
A atriz ressalta que, apesar de seus trabalhos na televisão, o teatro sempre será sua casa. Ela, que já esteve em novelas como "A Vida da Gente" (2011-2012), "Éramos Seis" (2019-2020) e "Sete Vidas" (2015), classifica as telinhas como mais desafiadoras do que os palcos. "Fazer TV é o mais difícil. Aprendi a ter muito prazer, mas o teatro é de onde venho e para onde sempre preciso voltar."
Mesmo com todos os desafios, a artista assegura que se diverte com os trabalhos na TV, seja em cena ou nos bastidores, com os colegas de elenco. Na atual trama das 19h, seus elogios são, principalmente para Paolla Oliveira: "Paolla é 'gente-humana' da melhor qualidade. Sua sensibilidade e delicadeza me encantam... E como se não bastasse isso, ela ainda gosta de samba e bebe cachaça! Me apaixonei", brinca Maria Eduarda em entrevista ao F5.
Mesmo a fama não sendo foco principal na carreira da atriz, como acontece com Andrea, ela afirma ter pontos em comum com a personagem. "Enxergamos na arte uma poderosa ferramenta de transformação social. 'Transver' a realidade através de um ponto de vista lúdico e poético pode salvar uma vida. Como diria Nietzsche: 'A arte existe para que a realidade não nos destrua'. Eu e Andrea somos artistas por conta disso."
Talvez por isso, Maria Eduarda não pretende ficar apenas na frente das câmeras. Para o futuro, ela já tem planos de dirigir um documentário chamado "Nós Por Todas". E também deve entrar em cartaz com dois espetáculos de teatro que escreveu, um infantil e outro adulto. Abaixo, Maria Eduarda de Carvalho fala sobre sua relação com as redes sociais, a volta à atuação após o período mais crítico da pandemia, a reprise de "A Vida da Gente" e eleições. Confira trechos editados da conversa:
PERGUNTA - Você já chegou a dizer que a fama e não enche seus olhos. Como surgiu essa visão?
MARIA EDUARDA CARVALHO - Existe uma confusão entre ser famoso e ser um ator, ou uma atriz. Muita gente associa uma coisa à outra e almeja esta profissão vislumbrando a fama. Este é um tremendo equívoco. A proporção de atores que se tornam famosos em consequência do seu trabalho é ínfima. A rotina deste ofício não tem nenhum glamour. Trabalhamos longas horas por dia em um ritmo para lá de intenso. A instabilidade financeira é uma companhia recorrente e uma desagradável sensação de eterno recomeço também nos assombra permanentemente.
Eu só insisto em ser artista, porque não tenho escolha. Sempre fui muito medrosa. Era uma criança cheia de paúras e estranhices. Tinha profundo pavor do escuro, mas do escuro do teatro nunca tive medo. Ali comecei a perceber o potencial transformador da arte e suas possibilidades de ressignificação. Quando, aos 13 anos, comecei a fazer um curso de teatro no Tablado, já tinha claro dentro de mim que só teria chance de ser uma pessoa realizada, sendo uma artista.
P. - Apesar de ser discreta com sua vida pessoal nas redes sociais, você publica sobre assuntos relevantes, socialmente falando. Por quê?
MC - Cresci vendo minha mãe se implicar diretamente em causas socialmente relevantes -a atriz é filha de Luciana Carvalho, psicanalista. Com ela aprendi a não me calar diante das injustiças que testemunhamos diariamente e a lutar por um governo que enxergue na educação a base de uma reforma estrutural para o Brasil. No entanto, no presente momento, esse ideal está posto em suspenso. Agora a luta é para que nossos direitos mais básicos como cidadãos vivendo em sociedade sejam mantidos. Não se trata de escolher entre direita ou esquerda. Não é uma questão partidária. É uma questão de humanidade. Por isso votarei no Lula já no primeiro turno.
P. - Como é poder voltar a atuar na televisão após dois anos extremamente difíceis para a classe artística, e para o Brasil?
MC - É profundamente emocionante ter o privilégio de voltar a atuar. Vivemos um momento realmente aterrorizante. Tenho muitos amigos atores que precisaram abrir mão de suas carreiras para ser possível continuar sustentando suas famílias. Os teatros, assim como as salas de cinema, estão vazios. Quase 63 milhões de brasileiros vivem abaixo da linha da pobreza. Eu realmente não consigo compreender como ainda existem pessoas que, mesmo diante deste horror que estamos presenciando, possam cogitar reeleger o atual presidente.
P. - No ano passado a novela 'A Vida da Gente' foi reprisada. Como foi poder se rever na TV? Você gosta de assistir aos seus trabalhos?
MC - Não curto me ver em cena, mas costumo assistir os trabalhos que faço para analisar tecnicamente a qualidade do que estou fazendo. 'A Vida Da Gente' foi uma novela bastante emblemática em minha vida. Mesmo sendo difícil, escolhi revê-la durante a pandemia e isso significou um verdadeiro atravessamento de emoções... Este foi o primeiro trabalho que fiz depois de ser mãe.
Ainda estava me entendendo nesta nova configuração e tentando equacionar a gincana que é trabalhar e criar uma bebê. Foi também a primeira novela que encarei depois da perda da minha irmã e, coincidentemente, a trama era baseada na relação entre duas irmãs. Me reencontrar com todos estes sentimentos durante um período tão difícil foi como um mergulho profundo nos abismos de mim mesma. Como diz a poeta Fernanda Moreira: 'mar é sempre beira para quem tem medo de fundo'. Mesmo com medo, escolhi mergulhar.
P. - Você pode contar sobre seus novos planos para sua carreira?
MC - Vou assinar a direção de um documentário sobre o feminino, um projeto criado a partir de um ciclo de lives que fiz em meu Instagram, no fim do ano passado. O filme chama 'Nós Por Todas' e nele contarei com depoimentos de mulheres fantásticas, como a atriz Olivia Araujo, a autora Martha Medeiros e a psicanalista Vera Iaconelli. A ideia é filmar assim que acabar a novela.
Tem também uma nova peça que escrevi. Há alguns anos montei 'Atrás Do Mundo', espetáculo que conta a história de Didia, uma menina que cai 'atrás do mundo' (um lugar metafórico) e lá consegue elaborar a perda da irmã. Durante a pandemia me encontrei bastante perdida e decidi que no aniversário de 40 anos Didia cairá 'atrás do mundo' outra vez, para elaborar novas perdas. Meu desejo é estar em cartaz com os dois espetáculos, ao mesmo tempo, já que um é infantil e o outro será adulto. Só falta o patrocínio... Alguém se habilita?
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