FOLHAPRESS - Primeiro título da recém-lançada coleção Clube do Crime --que resgata livros de mistério inéditos ou pouco conhecidos no Brasil--, "A Morte do Adivinho" é considerado o primeiro romance policial escrito por um afro-americano, o médico Rudolph Fisher. Os detetives, os suspeitos e as vítimas vivem no Harlem, o bairro negro de Nova York.

Eis um divertimento de primeira. E não só pelo ambiente, retratado pelo autor com cores e falas vivas, mas também pela trama cheia de reviravoltas e cuja solução só se revela nas últimas páginas. Os amantes do gênero --que era o mais consumido no mundo até o advento do fenômeno da autoajuda-- não vão se desapontar.

Publicado em 1932, "The Conjure-Man Dies", no original em inglês, é uma típica obra de transição entre dois modelos consagrados ao longo do tempo, mesclando elementos do romance de mistério ao modo inglês, que predominou entre os anos 1880 e 1930, e do estilo hard-boiled americano que, em fins da década de 1920, revolucionou a literatura criminal injetando ação ao suspense.

Há uma dupla encarregada de desvendar o crime, lembrando o esquema de Arthur Conan Doyle e Rex Stout, mil vezes copiado. O médico John Archer, que tem a mesma profissão do autor do romance, não é tão cerebral e perspicaz como Sherlock Holmes ou Nero Wolfe, embora tenha alguns vislumbres de dedução.

O par se completa com o detetive de polícia Perry Dart, responsável pelos interrogatórios. Dart trabalha no Harlem porque "não poderia, sob nenhuma circunstância, ser confundido com nada além de um negro; ou talvez, como os colegas insistiam, o escolheram porque sua pele, generosamente pigmentada, o tornava invisível no escuro".

Os dois vão investigar o assassinato (ou o que parece ter sido um assassinato) de uma figura sinistra, N'Gana Frimbo, rei africano que, depois de estudar em Harvard, se instala em Nova York e se torna um conjure-man, termo usado no sul dos Estados Unidos para designar adivinhos, feiticeiros e curandeiros.

Frimbo foi encontrado em sua câmara de trabalho com uma pancada na cabeça e um lenço branco com bordas azuis enfiado na garganta.

O relato assume tom de paródia quando um dos suspeitos resolve, ele próprio, descobrir o culpado. Desempregado e vivendo de pequenos golpes, Bubber Brow se faz passar por detetive particular, uma espécie de Philip Marlowe precarizado; no cartão de visitas, ele promete "evidências encontradas em assuntos do coração" e "atenção especial para traidores e caluniadores".

Ao fazer o romance sair dos cômodos fechados e ganhar a liberdade das ruas, o personagem apresenta ao leitor a vida no gueto negro, com sua linguagem de gíria e sua gente invisível: cafetões e prostitutas, jogadores de sinuca, cantoras de inferninhos, viciados e traficantes de droga, batedores de carteira e pregadores religiosos.

Sem abrir mão do entretenimento e do jogo de descobrir quem é o assassino, Fisher antecipa a literatura noir e ao mesmo tempo social de Chester Himes, criador nos anos 1950 da dupla de policiais Coffin Ed Johnson e Grave Digger Jones, conhecidos no Brasil como Ed Caixão e Jones Coveiro, cujas histórias também têm o Harlem como cenário.

"O Jogo do Assassino", de Ngaio Marsh, é o segundo volume da coleção editada pela HarperCollins. O terceiro está no prelo: "O Mistério da Cruz Egípcia", de Ellery Queen, que sairá em maio. Curiosidade: o compositor Aldir Blanc, fanático por literatura policial, apontava este romance de Queen como o de final mais perfeito na história do gênero.

A MORTE DO ADIVINHO

Avaliação Bom

Preço R$ 59,90 (304 págs.)

Autoria Rudolph Fisher

Editora HarperCollins

Tradução João Souza


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