SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Antes de ser uma cantora de sucesso, Kim Petras é uma expert em música pop. "Quando eu era adolescente, passava horas fazendo cronogramas falsos de quando lançaria meu single, 'agendando' entrevista em rádio e programa de TV", ela diz. "Tem sido muito parecido com o que sonhei. É a minha vida ideal, recomendo a todos. Só tenho menos tempo para dormir do que imaginava."
A estrela pop alemã acaba de lançar o álbum "Feed the Beast", seu primeiro com alto investimento, por uma grande gravadora. É o momento de maior exposição da cantora, que tem show marcado no megafestival paulista The Town, em setembro, após mais de 15 anos trabalhando com música pop.
Ele vem na esteira do sucesso de "Unholy", single com Sam Smith que se tornou hit inescapável no ano passado e já ultrapassa a marca do bilhão de reproduções apenas no Spotify. Também fez de Petras a primeira cantora trans a alcançar o topo da parada americana da Billboard.
"Gosto de ir ao McDonald's e a música estar lá tocando, sabe, é uma experiência que nunca tive antes", ela diz. "Todo lugar que vou minha música toca. Tem cenas épicas da minha vida em que entro no carro e de repente essa canção começa a tocar. É a primeira vez que sinto o gostinho desse nível de sucesso."
A faixa foi apresentada por Petras e Smith na última edição do Grammy, quando eles ganharam a estatueta de melhor performance pop solo ou grupo pela canção. Na cerimônia, a alemã fez questão de apontar que se tratava da primeira vez na história que uma pessoa trans levava a estatueta na categoria.
Para ela, foi a materialização de seu sonho pop, cinco anos depois de lançar sua primeira música solo. "Amo isso, música pop tem a ver com estar em todo lugar", diz. "Mas foi engraçado quando alguns fãs começaram a dizer que 'Unholy' estava grande demais, que estavam ouvindo demais. Tipo, poxa, não era isso que você deveria querer para o artista que ama?"
Misteriosa, épica e arrastada, "Unholy" não tem exatamente o estilo de Petras --é mais uma canção de Smith do que dela. Mas isso não significa que a cantora esteja presa a uma única estética. Nos últimos anos, ela foi do EDM, ou electronic dance music, mais pesado de "Turn Off the Light", de 2020, ao pop pervertido e engraçadinho de "Slut Pop", de 2022.
"Em relação a 'Unholy', acho que minhas músicas num geral são mais fugazes e mais pop", ela diz. "Mas posso ser sombria também. Acho que minha maior característica é que meus projetos soam bem diferentes entre si. O 'Turn Off the Light' é um pouco mais sombrio, no 'Slut Pop' sou meio ridícula e hiperssexualizada, e tem o pop oitentista mais fofo que também amo, enfim."
Tem um pouco disso tudo em "Feed the Beast", cujo título se refere à própria indústria fonográfica. De certa forma, é uma brincadeira, bem ao estilo de Petras, com o mercado do pop, idealizado por ela --e também seus fãs e os aficionados por música pop num geral-- e do qual agora ela é parte integrante.
Para alimentar a besta, Petras apostou em suas memórias de frequentar baladas na Alemanha, onde dançava ao som do eurodance, em "Alone", principal single do trabalho. É um movimento parecido com o de outra estrela pop do continente, a britânica Charli XCX --de quem a alemã é fã. Em "Crash", seu álbum mais recente, ela sampleia "Cry for You", hit de 2005 de September, e "Show Me Love", que Robin S lançou em 1993.
A faixa de Petras reaproveita o hit "Better Off Alone", hit de 1999 da banda holandesa Alice DeeJay, com participação da rapper americana Nicki Minaj. É até agora a música de maior sucesso do álbum, junto a "Coconuts", que usa a imagem do fruto tropical como metáfora para seios, no estilo "Slut Pop".
Essa persona sexualizada, aliás, é uma criação de Petras na qual ela se imagina extrovertida --mesmo sendo bastante tímida. "Não consigo chegar em caras pelos quais tenho atração, fico aterrorizada", diz. "Então fico no estúdio o tempo inteiro fazendo música, imaginando o que eu estaria fazendo se eu fosse mais saidinha."
Criar a partir de seus medos é, na verdade, o que move Petras depois de "Unholy", o que alimenta sua persona pop e o que guia "Feed the Beast". Se tornar uma artista mainstream é exatamente o que ela mais queria, diz, e ao mesmo tempo algo que a deixa aterrorizada.
"Não sei dizer o porquê, já que meu sonho sempre foi ter minha música mais conhecida possível", ela diz. "Mas acho que tem a ver com perder meu espaço seguro, que é minhas turnês e meus fãs, onde me sinto aceita. 'Unholy' foi algo que fez pessoas que nunca me ouviriam tivessem contato comigo. Apareceram pessoas transfóbicas comentando sobre minha aparência. E foi assustador, pois sou tímida e tenho muita autocrítica."
O receio da exposição para além de sua base ferrenha de fãs --na maioria pessoas da comunidade LGBT+-- tem sentido. Aos 16 anos, em 2009, Petras ficou conhecida como a trans mais jovem do mundo, e sua identidade de gênero costuma gerar mais manchetes que sua música, ainda que seu sucesso gere conquistas inegáveis para a classe que representa.
A alemã, hoje com 30 anos, conta que pensou em se apresentar como uma animação e não dar entrevistas, mas enfrentar esse medo de ser grande é justamente a força por trás de sua arte. "Acho que na vida o único jeito de crescer é fazendo aquilo que mais te dá medo", ela diz. "Então, acabou sendo inspirador para mim."
Ela conta que repetiu o título do álbum como mantra durante o período de composição e gravação. Nesse caso, a besta era a indústria fonográfica, o sucesso pop mainstream --justamente seu maior medo. "Era tipo, alimente a besta, alimente a máquina, aquilo que você mais teme", diz. "Nesse disco, cada música representa uma faceta diferente disso."
FEED THE BEAST
Onde: Nas plataformas digitais
Autoria: Kim Petras
Gravadora: Republic Records/Universal
Link: https://open.spotify.com/intl-pt/album/2izzggtAmxtZaKs35JCurA?si=La2rvOTSTgq-ExMpDIqq9w
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