SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - 'Mãe do Emicida' foi por muito tempo o vocativo usado para se referirem a dona Jacira, 58. Ela sentia orgulho de ser associada ao rapper dessa forma, mas decidiu reivindicar o próprio nome a partir de uma provocação feita por ele. "Mãe, a senhora tem profissão", conta ter ouvido.

Enfermeira aposentada, ela se define como uma genealogista territorial da zona norte de São Paulo, onde vive e estuda a ancestralidade dos povos da região. Com os quatro filhos adultos, ela voltou a atenção às suas próprias histórias, que agora pretende dividir com o público no podcast "Café com Dona Jacira".

A produção estreia nas plataformas nesta quarta-feira (25) e discutirá sobre costumes ancestrais, maternidade, amadurecimento, envelhecimento e feminilidade. Os seis episódios da nova temporada serão lançados semanalmente, sempre às quartas.

Ao andar pelas ruas, o aroma que nasce no fogão da vizinhança da comunidade sai pela janela e aguça os sentidos e as memórias. Daí a escolha por convidar o público para um café, diz dona Jacira durante um evento na sua casa.

"Durante minha infância, de manhã, quando minha mãe levantava para fazer o café, a fumaça ia lá no quarto. Depois ela ligava o rádio, abria as portas, jogava milho para as galinhas. E a vida seguia", diz à Folha de S.Paulo.

A temporada parte da palavra "ndotolo", expressão africana que significa comunicação sensorial. Determinada a resgatá-la, dona Jacira pretende fazer de cada episódio um convite a uma jornada interior, partindo de suas vivências.

Seu desejo é que o podcast chegue às cozinhas e sirva de companhia a mulheres como ela, que põe o celular na janela para escutar conversas enquanto lava a louça. "Eu não sei fazer uma coisa só", diz. "A gente foi muito acostumado a ver a Bruna Lombardi parar para pensar. Mas, se eu sentar, quem é que cuida das coisas que preciso cuidar?"

A produção foi feita em família. Kátia, uma de suas filhas, fez o roteiro e ajudou a mãe a organizar suas lembranças. Advogada, ela estudou como produzir podcasts para auxiliar a mãe. Já a edição foi feita por uma produtora de mídia independente.

Segundo a filha, um dos diferenciais da produção é o resgate do contexto social da época em que se passaram as histórias. "Ter a chance de fazer essa construção com a minha mãe e com a minha avó é muito mágico. Eu só me atentei em buscar a minha origem quando também me tornei mãe, para passar às minhas filhas minha continuidade."

Elas resgataram as histórias do nascimento de quatro gerações de mulheres da família, começando pelas matriarcas ?a avó materna de Kátia, nascida em 1942, e sua mãe, dona Jacira, de 1964. Depois vem o seu nascimento, em 1981, e o de sua primeira filha, em 2005. Com 18 anos, foi a jovem quem fotografou a avó para as fotos de divulgação do podcast.

Embora pessoal, a produção traz situações de encontro com o público por meio da identificação. Esse era um desejo de dona Jacira há muito tempo. Ela tem em seu lar um espaço de resistência e acolhimento, onde recebe diferentes grupos, e com o podcast pretende ampliar seu alcance.

De acordo com Roque, as gravações aconteceram em pouco mais de um mês, mas os relatos e histórias já estavam escritos há muito tempo. Antes desta temporada, dona Jacira chegou a lançar uma primeira, em parceria com a Meteora Podcast, mas os episódios se perderam na plataforma.

Como não havia escrito um roteiro para eles, o material não será resgatado. Dona Jacira também pensa em lançar um livro com as memórias que dividirá no podcast. Esta será sua segunda publicação ?em 2018 lançou "Café", publicado pela editora LiteraRUA em parceria com a Laboratório Fantasma, empresa de seus filhos Emicida e Evandro Fióti.

CAFÉ COM DONA JACIRA

Quando Disponível na qua. (25) nas plataformas digitais


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