Paula Medeiros Paula Medeiros 4/2/2011


Cisne Negro representa com maestria a dualidade da alma humana 

Darren Aronofksy sempre lidou muito bem com os limites da alma humana e sempre pareceu estar seguro diante disso. O fato é que ele realmente pode se sentir nesse patamar e “Cisne Negro” comprova isso de forma extremamente contundente. Explorar as fragilidades da alma numa história visceral sobre drogas, como em Requiem para um sonho ou o fracasso mortal, como em O Lutador foram uma preparação para Aronofsky mergulhar profundamente nos dilemas de uma história permeada por um balé de Tchaikovsky. Não que Cisne Negro tenha superado seus antecessores, mas entrar num ambiente tão sublime para retratar o fiasco do subconsciente exigiu muita habilidade do diretor. Principalmente pelo resultado final.

Nina (Natalie Portman) vive para o balé. É tudo que ela tem, numa vida vazia de significados. Sua maior ambição é se tornar a estrela da companhia de Thomas Leroy (Vincent Cassel). Quando consegue chegar ao topo da seleção para o novo balé a ser encenado, ela se depara com o desafio de interpretar a dualidade presente em O Lago dos Cisnes. Nina é a verdadeira encarnação da simbologia do Cisne Branco: nela estão presentes a pureza e a inocência. O problema surge ao encarar de frente o Cisne Negro, uma vez que ele é a representação de uma sexualidade latente e de outros caminhos pelos quais Nina nunca esteve presente.

Construído sobre uma metalinguagem fortíssima e sem exageros, Cisne Negro conduz toda a trama nessa dubiedade de sentimentos, principalmente pela contradição dos desejos inerentes a Nina. Através desse confronto, consegue ilustrar a psique humana e sobrepor pensamentos genuinamente guiados pela confusão latente do ser (ou não ser). E sem que seja notado, o espectador é levado a mergulhar em águas profundas de um suspense e a compartilhar do sentimento da protagonista de agonia, de se sentir sem o controle da situação.

Aliás, muitos pontos para o suspense criado. Não só pela tensão moldada mentalmente, mas pelas cenas incômodas de mutilações e anomalias. Mais um dos elementos que vêm se contrapor à beleza e sutilidade de O Lago dos Cisnes. Mais pontos ainda pelas soluções pouco óbvias adotadas pelos roteiristas ao solucionar o mistério vigente sem subestimar a inteligência do espectador.

A fotografia do filme também tem seu destaque. É tão bem explorada e as cenas de dança tão bem filmadas que mesmo quem não tem um verdadeiro apreço por balé se envolve, sem se sentir consumido pelas diversas cenas do gênero. O triunfo das cenas se deve muito ao trabalho de Natalie Portman, que se doou ao papel física e emocionalmente e construiu com cuidado as neuroses e inocências de sua personagem.

Pontuado pela trilha sonora de Clint Mansell, o filme é, antes de tudo, sobre as reações de uma mente conflituosa que decide criar sua realidade no irreal, muitas vezes, através de atos inconsequentes, parte ingênuos e parte propositais.

Cisne Negro, portanto, marca a carreira de Aronofsky mais uma vez, como um suspense sobre e para o obscuro. E, obviamente, fora dele não poderia deixar de estar.

Ficha Técnica
Cisne Negro/Black Swan
EUA , 2010 - 108 min.
Suspense
Direção: Darren Aronofsky
Roteiro: Mark Heyman, Andres Heinz, John J. McLaughlin
Elenco: Natalie Portman, Mila Kunis, Vincent Cassel, Barbara Hershey, Winona Ryder, Benjamin Millepied, Ksenia Solo, Kristina Anapau


Paula Medeiros
é estudante de Comunicação Social com participação em Projetos Cinematográficos.