Entrevista com o violonista e compositor Juarez Moreira

Nome do Colunista Daniela Aragão 8/10/2018

Daniela Aragão: Como se deu a descoberta da música em sua vida?

Juarez Moreira: Aconteceu com meu pai e meu avô, que veio da Espanha. Meu pai e meu avô eram dentistas, papai se dizia u violonista diletante. Na minha casa ouvíamos de Tamba Trio a Dilermando Reis. Luiz Bonfá, Baden Powell, Beny Goodman, João Gilberto, Laurindo Almeida, Debussy, Chopin. Não poderia ter ouvido nada melhor na vida que o meu pai. Meu pai tocava violão e se tivesse se dedicado ele seria ótimo.

Meu irmão também é um grande músico, o Celso Moreira. Ele é um grande guitarrista e só se tornou músico profissional vinte anos depois de mim. Então minha vida de músico se deve a influência musical que tive da família.

Daniela Aragão: E a descoberta de sua própria musicalidade?

Juarez Moreira: Todo mundo ficava ouvindo Bossa Nova e aquele arranjo do “Chove Chuva”, lá menor e ré. Minha família tinha uma casa enorme no interior e até os dez anos de idade eu ainda não tinha pegado no violão. Meu pai achava que eu não tinha talento nenhum. Eu costumava ouvir Roberto Carlos e de repente um dia saí tocando um acorde.

O tempo foi passando, já com quatorze anos, mudando de voz comecei a tocar músicas do Bonfá, Laurindo e Baden. Tudo o que os mais velhos sonhavam tirar eu começava a descobrir sozinho explorando o violão.

Daniela Aragão: Você destacaria um fato interessante desse período inicial?

Juarez Moreira: Me recordo de quando fui tocar para o Turíbio Santos nos idos de 1970. Fui levado até a casa do Turíbio pela Consuelo Albergaria, na ocasião eu estava com dezessete anos e toquei uma Fuga de Bach para o Turíbio. Ele disse: “-Você vai”.

Daniela Aragão: A partir daí você não parou mais...

Juarez Moreira: Nunca mais larguei o violão. Meu pai queria que eu fizesse engenharia. Fiz engenharia civil e passei entre os primeiros lugares. Neste tempo eu tocava em casa apenas. Quando entrei para o curso de engenharia me tornei um cara relapso, pois passei a andar com o Toninho Horta, Lô Borges. O Toninho era um cara que já tinha experiência, na época havia tocado com a Elis e tantos outros. Toninho me adotou e depois fui me aproximando de outros músicos como Nivaldo Ornellas, Milton Nascimento, Wagner Tiso, Paulinho Carvalho.

Daniela Aragão:  Você concluiu o curso de engenharia?

Juarez Moreira: Não. Larguei engenharia e entrei na banda do Wagner Tiso  tocando guitarra. Minha avó, uma mulher muito inteligente que viveu cento e cinco anos, sentiu a pressão da família sobre minha decisão de me tornar músico profissional. “Esse menino nunca deu trabalho, é responsável, sempre passou nas provas. Deixem ele ser músico”. Era difícil encarar isso, pois era muita cobrança. Os próprios músicos falavam que eu era louco de largar a engenharia pra virar músico.

Daniela Aragão: Você vê afinidade entre a matemática e a música?

Juarez Moreira: Muita, total. Na época eu não acreditava nisso. Depois de quarenta anos no ofício de músico, posso dizer que sim. Tem um lance da lógica, organização e forma. Tudo matemática. Essa relação é tão forte que durante certo tempo tomei certa aversão a tecnologia e fui resistente ao computador. Recentemente retomei bastante essa minha faceta lógica e o computador acabou virando um instrumento próximo.

Daniela Aragão: O processo do violonista veio junto com a composição?

Juarez Moreira: Eu aprendi a tocar de ouvido. Eu tirava músicas de Chopin, e outros. Fiquei famoso por causa disso. Mais tarde aprendi a ler música. Por causa desse meu ouvido fui desenvolvendo cadência harmônica. Eu gostava de tirar John Lennon, Luiz Eça.

Daniela Aragão: Primeiro veio o aprimoramento da audição.

Juarez Moreira: Só depois é que fui estudar. Eu tenho bronca com esse lance de estudar. O conservatório é muito anacrônico. Eu pegava o livro de música e ia lendo sozinho em casa. Fui decifrando a simbologia, os ícones, toda essa coisa lógica da escrita musical. Ensinei muita harmonia para os músicos e eu mesmo não tinha consciência da própria harmonia que eu tinha. Eu não quis na época mexer com o lance do violão solo, pois meu desejo era tocar com outros músicos. Ao longo de todo o meu percurso fui estudando muito violão clássico.

Daniela Aragão: Você tem toda a técnica e amplitude do clássico e ao mesmo tempo swing.

Juarez Moreira: Exatamente, eu quebro tudo. Costumo fugir dos padrões.

Daniela Aragão: Em relação ao aprimoramento técnico. Você estudou com alguém?

Juarez Moreira: Sou autodidata. Me recordo da importância de um professor que dava aula na loja Musical, um professor antigo que chegou a conhecer o Agostinho Barros.

Daniela Aragão: Você roda o mundo, mas permanece morando em Belo Horizonte. Isso contribui para a manutenção de sua identidade, sua marca?

Juarez Moreira: Contribui para identidade, mas me amarra para o trânsito. O Rio é a vitrine, hoje está ruim, mas antes tínhamos que estar lá. Muitos foram para o Rio de Janeiro e se deram mal e eu não queria ser mais um. Todos me chamavam para ir para o Rio, mas eu sempre fui resistente. Pensei em tocar violão a partir de Belo Horizonte, porém fiz uma coisa radical que foi ir para Nova York e viver lá por um ano.

Daniela Aragão: Foi cedo o seu primeiro trabalho internacional?

Juarez Moreira: Eu fui para fora pra ralar nos idos de 85, 86. Vivi coisas muito importantes, aprendi tudo o que eu precisava de vida. Os jazzistas lá ralam pra caramba pra sobreviver, ganham cem dólares a hora. De Nova York voltei para Belo Horizonte e comecei a fazer o meu show. Hoje estou aqui me apresentando com meu violão e me sinto muito feliz por isso.


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