Gueminho Bernardes fala das dificuldades aos 40 anos de carreira

Ator, produtor, escritor e empresário afirma que é preciso repensar o atual momento do teatro nacional

Lucas Soares
Repórter
4/02/2017

"A melhor maneira de viver com saúde e ter humor para lidar com seus dramas e suas tragédias". A frase é de Guilherme Tristão Bernardes, conhecido como Gueminho Bernardes, 60, que completa 40 anos de carreira artística em 2017. Ele é ator, produtor cultural, empresário e, ultimamente, escritor. Já são dois livros editados - o segundo será publicado ainda esse mês - e com muitas histórias para contar.

Porém, em toda essa trajetória, ele conta que nem sempre conseguiu sucesso. "É muito tempo e, mais do que muito tempo, é muita coisa. Foram anos muito intensos, variados, sem uma carreira linear, ascendente ou descendente. Foi uma carreira que teve muito vai e vem, muitos revezes, e a minha maior conquista foi ter conseguido mantê-la ativa esses anos todos", diz.

Todas as mudanças profissionais de Gueminho começaram em 1977, quando o artista multifacetado buscava ser padre. "Sempre gostei de atuar com grupos, comecei com o Teatro Academia, que eu ajudei a fundar. Era um coadjuvante de terceira fila, já que trabalhava no Colégio Academia como seminarista. O teatro é uma coisa fascinante, ele te dá possibilidade de um tipo de contato com as pessoas que nenhuma outra dá, um contato quente, pessoal, intenso e transformador. Depois da Academia, fundamos o Teatro de Quintal, que hoje conhecemos como TQ, que foi uma dissidência de atores do Teatro Academia. Nós tivemos várias formações ao longo dos anos e aquela mais estável é essa atual, que tem no elenco Roberta Abramo, Marco Mangal, Rodrigo Mangal e Igor Beats, nosso técnico sonoplasta e videomaker. Estamos juntos há 18 anos. Mas já tivemos várias formações. Acredito que até hoje tenham passado pelo grupo umas cem pessoas. A minha maior conquista foi ter mantido essa instituição viva", garante.

Dificuldades

Ao falar em conquista, Gueminho atribuí à cidade de Juiz de Fora boa parte das dificuldades enfrentadas por ele e outros artistas. "É curioso que a palavra difícil está sempre associada à Juiz de Fora. É uma característica daqui, e nós temos bons motivos para achar isso, já que se comprova em várias áreas. O que eu sinto é que com o talento que a gente teve, com o que conseguimos produzir, se tivéssemos dado sorte, ou tivéssemos tido a competência de mudar para os grandes centros, teríamos ido muito mais longe, muito mais fundo. Foram diversos motivos que não conseguimos. E um deles é o desejo meio covarde de querer fazer alguma coisa importante aqui, já que é a minha cidade. A gente não conseguiu encontrar esse retorno. É algo até meio cultural de Juiz de Fora, já que o nome da cidade é dedicado a uma pessoa que não é daqui", afirma.

Ainda ao apoio à produção cultural na cidade, Gueminho se mantém crítico. "Temos um exemplo com a Funalfa. Quando ela vai contratar alguém de fora, o cachê é X. Se o artista for daqui, é x sobre 10. Não existe a mesma valorização. Nós estamos cansados de saber que temos artistas que tem a mesma qualidade de outros centros, mas parece que existe uma grife de que o mercado lá fora remunera melhor e isso define bastante a maneira como as coisas funcionam. Eu acho que Juiz de Fora se ama pouco, se gosta pouco, e isso reflete na maneira como as instituições tratam as suas pessoas, seus personagens e seus habitantes", lamenta.

Mercado

Idealizador e um dos responsáveis pela Campanha de Popularização do Teatro e da Dança, que chega à 16ª edição, o ator acredita que o evento precisa ser reestruturado. "A campanha é um sucesso, mas acho que ela está se esgotando, principalmente por ter sido tratada com desprezo e colocada à margem pela administração pública. Ela já gastou o público que conseguia atingir. Os espetáculos de maior apelo popular, como os do TQ, do Gustavo Mendes, Claudio Ramos, se esgotaram... O público viu quantas vezes quis ver e hoje não quer ver mais. Antes a gente começava pensando nas sessões extras, mas hoje lutamos para levar meia casa. Ela também está perdendo a sua essência, de ser popularizadora, já que não atingimos o grande público. Pra que fazer isso?", questiona.

Mas Gueminho vai além. Sabe que o cenário é difícil em todo o país, já que os hábitos de consumo cultural do brasileiro vêm mudando ano após ano. "O teatro hoje atravessa um momento crítico, uma encruzilhada. Os hábitos de consumo cultural estão mudando, basicamente por causa da internet e dos smartphones. As pessoas estão mais interessadas em consumir cultura através dessas mídias, já que tem uma série de coisas que chamam atenção, até mesmo pela novidade. Então, ir ao teatro perdeu força, além de ter custo, de ter questões de segurança, tempo de deslocamento e a crise financeira. Eu tenho contato com produtores do Brasil inteiro e de fato estamos sofrendo, mas alguns ainda conseguem o melhor resultado e, curiosamente, são aqueles que vem da internet. Eu vou citar o exemplo do Whindersson Nunes, que é um caso bem particular. Ele é um sucesso estrondoso na internet e na bilheteria. Ele fez cinco sessões lotadas em um dia em Brasília. Quem está conseguindo conquistar esse sucesso são essas pessoas que vieram do Youtube. É preciso entender isso, para não perder o trem da história. Isso tem que ir para a nossa avaliação, para termos uma perspectiva racional, porque as coisas estão acontecendo muito rápido, de formas estranhas e originais. Nós temos que ter mais inteligência para lidar com isso", comenta.

Trabalhos

Atualmente, Gueminho está mais focado em seu trabalho como escritor. Faz roteiros de shows e vídeos para dois youtubers iniciantes, para o comediante Gustavo Mendes, e se prepara para o lançamento dos livros "O Fim do Mundo é Hoje", ainda este mês, e "Regras De Etiqueta Para Um Assalto Feliz", até o fim do ano. Um dos momentos mais marcantes como escritor e roteirista foi um vídeo em que Gustavo Mendes, interpretando o papel da ex-presidente Dilma Rousseff, ligava para o então técnico da Seleção Brasileira, Felipão. "Em 2014, eu e Gustavo conseguimos o vídeo que teve o maior número de visualizações no Brasil, que foi a Dilma ligando para o Felipão após a Copa", conclui.

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