SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O empréstimo consignado do Auxílio Brasil ajudaria Gisele Aparecida de Oliveira, 34 anos, a "fazer a feira" para seus três filhos com idades entre 1 e 11 anos. "Está tudo tão caro que não dá nem para comprar carne", diz. Mas a dona de casa que recebe o benefício federal há um ano decidiu dispensar o crédito, que começou a ser oferecido nesta terça-feira (11) pela Caixa Econômica Federal.

Ela teme não ter como pagar a dívida após as eleições presidenciais, pois considera que o valor atual de R$ 600 poderá ser reduzido no próximo ano.

"Se eu pegar esse empréstimo, não sei se vou ter o dinheiro para pagar. Eu também não sei se esse auxílio vai continuar e fico com o pé atrás", conta Gisele, a primeira da fila do atendimento preferencial (ela estava com seu bebê no colo) na Caixa em Sapopemba.

Como é comum na agência do banco federal no extremo leste da capital paulista em dias de pagamento do benefício, cerca de 80 pessoas aguardavam na rua o início do atendimento uma hora antes de as portas se abrirem.

Os interessados poderão contratar o crédito com 24 parcelas de até R$ 160 mensais. A taxa de juros será de 3,45% ao mês ?um pouco abaixo do teto de 3,5% ao mês fixado pelo Ministério da Cidadania. A medida vem na esteira do pacote de ampliação de benefícios do governo de Jair Bolsonaro (PL) no período em que o presidente está em campanha pela reeleição.

Boa parte do público que estava na fila nesta terça tinha visto a notícia de que a Caixa começaria a oferecer o pagamento com desconto direto nas parcelas do auxílio.

Assim como Gisele, muitos contaram à reportagem, em três agências visitadas na mesma região da cidade, que o dinheiro extra viria em boa hora, mas também se mostraram temerosos com o risco de encolhimento ou, pior, de corte do benefício a partir do próximo ano.

"Tenho medo que corte mesmo", diz Ana Vieira dos Santos da Cruz, 44, após afirmar que recusará o empréstimo. Os R$ 600 do auxílio representam perto da metade da renda mensal da diarista, que paga aluguel de R$ 400 da casa onde mora com o filho de dez anos. "Como vou fazer para pagar [o empréstimo]?", questiona.

Desempregada desde 2014, quando foi dispensada da função de arrumadeira em um motel perto de casa, Ana cobra R$ 100 por dia de faxina, mas não tem conseguido oferta de trabalho mais do que uma vez por semana. "Deixo currículos, mas nunca me chamam", conta. Ela ainda recebe R$ 300 de pensão do ex-marido.

BENEFICIÁRIOS ESPERAM PAGAR PARCELAS, COM FÉ EM DEUS

Não eram todos os beneficiários na fila da Caixa que temiam não conseguir pagar o empréstimo do Auxílio Brasil. Alguns, na verdade, enxergavam no crédito a esperança para recomeçar a vida de um jeito melhor.

"Eu queria pegar esse empréstimo para investir em uma minipadaria", conta Valquíria Viana do Santos, 37 anos, que mora com o marido e seis filhos com idades entre oito e 23 anos. Todos os que possuem idade para trabalhar estão desempregados, incluindo ela e o marido. O Auxílio Brasil que ela recebe é a única renda da família.

"Quero fazer um investimento na minha vida e na dos meus filhos, quero melhorar de vida", conta Valquíria, que afirma não temer ficar em débito com o banco. "Está tudo na mão de Deus."

Marco Antonio Hernandes, 32, quer o empréstimo do auxílio para o depósito inicial do aluguel de uma casa, onde pretende morar com a sua mulher Jenifer Lizaraso, 22, grávida de sete meses, e a filha do casal, de três anos de idade. Ambos recebem o benefício de R$ 600.

Venezuelano, Hernandes é eletricista e está no Brasil há quatro anos. Desde o início da pandemia vive de bicos e mora provisoriamente em um abrigo. "Trabalhava com carteira assinada, mas fui dispensado em 2020."

"Vou pegar esses R$ 2.500 para alugar uma casa, comprar comida", conta. "Como a gente é estrangeiro, não tem botijão de gás, nem geladeira. Então, vamos comprar as coisas usadas e vamos pagando, para sobreviver."

Hernandes quer continuar no Brasil, onde ele diz que a solidariedade e os benefícios sociais tornam a vida menos difícil do que em seu país.

"Eu me inscrevi no Cadastro Único e fui abençoado. Aqui está muito melhor, ao menos tem marmita, muitas doações, nunca falta", conta.

Questionado sobre a preocupação que outros beneficiários demonstraram sobre a continuidade do pagamento do Auxílio Brasil, ele respondeu que "acredita em Deus" e que o "Brasil é grande e sempre tem como ir para frente."


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