BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Aliados do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), avaliam que o mercado exagerou na reação negativa após o discurso do petista desta quinta-feira (10), mas uma ala admite que deve haver uma cautela maior por parte dele.

De um modo geral, pessoas do entorno do presidente consideram que ele apenas repetiu o tom usado durante a campanha eleitoral. Por isso, houve espanto com a resposta dos investidores.

Há a avaliação, porém, de que Lula agora é presidente eleito, e não mais candidato. Daí a necessidade de calibrar as declarações sobre economia.

Descontentamento de investidores, temendo a agenda fiscal do futuro governo após as falas do presidente desta manhã, contribuiu para a queda de 4% do Ibovespa, índice referência da Bolsa de Valores brasileira, aos 108.964 pontos. O dólar comercial à vista disparou 4,08% e fechou cotado a R$ 5,3960, na venda.

Depois do tombo da Bolsa, Lula ainda ironizou o efeito do próprio discurso. Ele afirmou nunca ter visto um mercado "tão sensível" como o brasileiro.

Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), o tom do discurso de Lula nesta quinta foi um "solavanco". Mas isso não deverá afetar a relação entre o presidente eleito e o mercado.

Auxiliares de Lula afirmam que, apesar do susto com a reação do mercado, o governo eleito tem preocupação com a responsabilidade fiscal. Usam como exemplo o fato de ele ter montado uma equipe de transição com economistas de diferentes correntes de pensamento, inclusive liberais.

A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, disse que não há o que calibrar no discurso e criticou a reação dos investidores. "É um movimento especulativo", disse.

Para ela, o discurso de Lula tem o apoio de 100% dos eleitores que votaram nele. Mais cedo, ela afirmou em rede social que o mercado interpretou mal a fala do petista e que ele não teria priorizado investimentos na área social "em detrimento do equilíbrio fiscal".

Ela ainda sugeriu que a reação dos investidores não foi a mesma quando o presidente Jair Bolsonaro (PL) aprovou medidas que aumentaram os gastos públicos na pré-campanha eleitoral.

A equipe do petista cita ainda a própria escolha do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), que já é por si só um sinal ao centro. A indicação de Persio Arida e André Lara Resende para integrarem o núcleo econômico durante a transição inclusive ocorreu graças ao companheiro de chapa de Lula.

Durante a campanha, o petista teve uma série de reuniões com investidores e empresários. Nesses encontros, sempre buscou frisar que teve dois governos com bons resultados na área fiscal, e que ele não precisaria de um teto de gastos para ter responsabilidade.

No discurso desta quinta, Lula tentou mesclar declarações que indicavam ampliação de gastos e também controle de despesas.

"Nós temos que garantir uma política fiscal muito séria porque é preciso pagar os juros [aos detentores da dívida pública]", disse o petista.

Em outro momento da fala, no entanto, ele questionou: "Por que pessoas são levadas a sofrer para garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? Por que toda hora as pessoas dizem que é preciso cortar gasto, que é preciso fazer superávit, que é preciso ter teto de gastos? Por que a gente não estabelece um novo paradigma?".

Esse é o tom adotado pela equipe de Lula e pelo próprio presidente eleito para justificar a necessidade de aprovar a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, que abre espaço no Orçamento para que o petista consiga cumprir promessas de campanha na área social, como a manutenção do valor mínimo de R$ 600 para o Auxílio Brasil (que deve voltar a se chamar Bolsa Família).

A previsão é que o texto coloque todo esse programa social fora do teto de gastos ?regra que impede o crescimento das despesas acima da inflação.

Lula também disse que "algumas coisas encaradas como gastos nesse país vão passar a ser vistas como investimentos", embora integrantes do partido neguem que haverá uma mudança na classificação de despesas nesse sentido.

A linha adotada pelo governo eleito é que o país voltará a apresentar taxas sustentáveis de crescimento econômico a partir da redução da desigualdade social. Lula e aliados dele veem essa fórmula como um meio de gerar consumo interno e também aquecer a economia.


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