BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ex-ministro Guido Mantega (Fazenda) vai integrar a equipe de transição governamental como voluntário, por estar inabilitado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) a exercer cargo em comissão ou função de confiança na Administração Pública Federal por punição envolvendo o caso das pedaladas fiscais.
Mantega foi anunciado pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), como integrante do grupo técnico responsável pelo planejamento, orçamento e gestão na equipe de transição, na última quinta-feira (10).
Em 2016, o ex-ministro perdeu o direito de assumir função pública por cinco anos. Ele também foi multado em R$ 54.820,84. Um acórdão de 2018 ampliou a sanção para oito anos, prazo que começou a contar a partir de 25 de fevereiro de 2022, quando o processo transitou em julgado. Com isso, o ex-ministro estaria inabilitado para exercer cargo em comissão ou função de confiança na Administração Pública até 25 de fevereiro de 2030.
A legislação que trata dos governos de transição estabelece que até 50 cargos poderão ser criados para comporem a equipe, os chamados CETG (Cargos Especiais de Transição Governamental). A remuneração para esses cargos varia de R$ R$ 2,7 mil a R$ 17,3 mil.
Em nota, o governo de transição afirmou que ele atuará como voluntário. "O ex-ministro Guido Mantega atuará como colaborador voluntário no Grupo Técnico de Planejamento, Orçamento e Gestão, conforme prevê a legislação que instituiu o Gabinete de Transição."
O partido Novo anunciou que estuda entrar na justiça contra a nomeação de Mantega, por considerar que o ex-ministro está inabilitado pelo TCU para ocupar cargo público.
"Lula traz um condenado por fraude fiscal para a equipe de transição do orçamento e depois fica espantado com a reação do mercado", disse o presidente do partido, Eduardo Ribeiro. "O PT nem assumiu ainda e parece já querer atuar às margens da lei. Não vamos deixar".
Até o momento, já foram publicadas no Diário Oficial da União as nomeações de oito pessoas que integrarão a equipe de transição nesses cargos, de forma remunerada. Um deles é o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB), que vai coordenar a equipe de transição.
Também foram nomeados o coordenador-executivo do governo de transição, Floriano Pesaro, a ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior, entre outros. Os demais indicados para compor o governo de transição, a princípio, não serão remunerados e atuarão como voluntários, como parlamentares, acadêmicos e pessoas da iniciativa privada.
Assim como Mantega, o ex-presidente do BNDES Luciano Coutinho havia sido inabilitado pelo TCU. No entanto, o executivo conseguiu reverter a decisão na justiça. Coutinho também vai atuar como voluntário, a seu pedido
Ao apontar Mantega como voluntário, a equipe de transição argumenta não estar infringindo a punição aplicada pelo TCU. No entanto, especialistas divergem.
O professor de direito constitucional Lenio Streck afirma que não existe relação entre a inabilitação e a participação de Mantega na transição.
"Participar de um programa de transição como esse não equivale aquilo que é o cargo público de que fala as inabilitações. São coisas diferentes. Não se pode equiparar as situações", afirma Streck.
Outros professores de direito administrativo têm opinião similar à de Streck e veem a possibilidade de participação do ex-ministro na transição desde que não seja remunerado.
Há, no entanto, especialistas que discordam. Vera Chemim, especialista em direito constitucional e mestre em direito público pela FGV, avalia que a participação de Mantega é permitida caso ele trabalhe "informalmente", ou seja, sem qualquer vínculo formal com a Administração Pública.
"O que não é permitido, legalmente, é o exercício de um cargo comissionado ou função de confiança, como se pode depreender da sua inserção na portaria."
Cristiano Vilela, sócio do escritório Vilela, Miranda e Aguiar Fernandes Advogados, também vai na mesma linha.
"Entendo que a inabilitação recai para o exercício da função pública. Muito embora ele não venha a ser titular de um cargo em comissão, entendo que ele está cumprindo o exercício de uma função pública, à medida que foi nomeado pela portaria 10 de 11/11/2022 para compor o Grupo Técnico de Planejamento, Orçamento e Gestão do Gabinete de Transição Governamental."
Na avaliação dele, trata-se de um caso limítrofe, com brecha para dupla interpretação. "Mas eu, no caso concreto, aconselharia o coordenador da equipe, no caso o vice-presidente Geraldo Alckmin, a não nomear o ex ministro."
Para Alexys Lazarou, advogado criminalista do Cascione Pulino Boulos Advogados, o STF (Supremo Tribunal Federal) deverá tratar da questão e dar uma interpretação definitiva.
"Vale lembrar que, até onde se tem notícia, Guido Mantega não foi responsabilizado criminalmente pelos fatos das pedaladas fiscais. Os inquéritos correspondentes foram arquivados, o que significa não haver comprovação de improbidade administrativa praticada por ele. A sua inabilitação pelo TCU, ainda que eventualmente o impeça de compor a equipe, não significa ter ele praticado qualquer crime."
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