BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Entidades da área de energia foram surpreendidas nesta quarta-feira (30) pela alternação em um projeto de lei que, além de ampliar os custos na conta de luz em R$ 79 bilhões, cria riscos ao meio ambiente.
A mudança ocorre no momento em que há um forte movimento lobista na Câmara, que já colocou em marcha outras propostas que podem elevar a tarifa em mais de R$ 100 bilhões.
Na prática, a medida apresentada nesta quarta determina que térmicas a gás sejam substituídas por PCH (Pequenas Centrais Hidrelétricas), estendendo a esses novos projetos hídricos o direito a isenções que são concedidas à chamada GD (geração distribuída), em sua maioria gerada por painéis solares.
A mudança foi inserida no PL (projeto de lei) 2703 pelo relator da matéria, o deputado Beto Pereira (PSDB-MS.
De autoria do deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP), o PL já vinha sendo questionado por tentar ampliar em 12 meses o prazo para a concessão de subsídios para a GD, alterando o marco regulatório do setor à revelia de uma discussão setorial. A proposta original, sem a mudança inserida nesta quarta pelo relator, já teria potencial de elevar a conta de luz em pelo menos R$ 50 bilhões.
A esse valor, agora, podem ser acrescidos mais R$ 79 bilhões, até 2045, afirma Marcos Madureira, presidente da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica).
O PL quase foi colocado em votação nesta quarta, no entanto, alertados por integrantes do grupo de transição de governo na área de energia, parlamentares do PT trabalharam para o texto não fosse a plenário.
Uma emendas aleatória, sem relação com a proposta original do projeto de lei, costuma ser chamadas de jabuti. Nesse caso, a mudança é considerada dão drástica que está sendo qualificada de jabuti mutante, explica Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia. A entidade vem reunindo esforços para deter o avanço da conta luz em iniciativas como essa no Congresso.
Durante a tramitação da privatização da Eletrobras, os congressistas inseriram no projeto a obrigatoriedade de se construir 8.000 MW (megawatts) de térmicas a gás. Essas térmicas ficaram conhecidas como jabutis da Eletrobras.
Desse total, 2.500 MW teriam de ser instaladas no Centro Oeste.
A proposta do deputado Beto Pereira, dizem os especialistas, é um novo jabuti para mudar o velho. Converte 1.500 MW de térmicas do Centro Oeste em centrais hidrelétricas de menos porte, como 30 MW. Esses novos projetos, além de não pagarem pelo uso do fio, ficariam isentos dos demais subsídios previsto para o segmento de GD, que em parte hoje são pagos por esse tipo de empreendimento.
A proposta também é vista como um risco ambiental. Como cada PCH teria no máximo 30 MW, seria necessário espalhar milhares de pequenos projetos pelo Centro Oeste, onde estão reservas ambientais importantes, com o pantanal.
"Nós já éramos contra a mudança original desse PL, que amplia o prazo do subsídio, pois se trata de uma injustiça social cobrar do mais pobre um benefícios que favorece o consumidor mais rico", diz Barata.
"Com mais esse jabuti, o Congresso vai além de suas atribuições e começa a querer fazer planejamento setorial, impondo como será a expansão da oferta de energia, sem nem olhar a demanda."
Segundo o calculo da Abradee, a alteração na lei da privatização da Eletrobras, para obrigar a contratação de 1.500 MW de PCHs por 20 anos, no lugar das térmicas, acrescenta R$ 23 bilhões à tarifa, a valor presente, até 2045.
A equiparação dos benefícios de centrais hidrelétricas à geração distribuída, por sua vez, provocam um impacto na tarifa de R$ 56 bilhões, considerando apenas as que entrarem nos próximos 30 meses.
"A proposta do PL 2703 representa um retrocesso, com imensos custos para os consumidores brasileiros. As emendas apresentadas hoje pelo relator dobram esse custo", diz o presidente da Abradee. "Isso não é justo e nossa expectativa é que este PL seja rejeitado."
Quem acompanhou a discussão no Congresso nesta quarta, avalia que a alteração nas térmicas do Centro Oeste tenta contornar problemas inerentes as térmicas jabuti da Eletrobras.
O primeiro leilão, para as regiões Norte e Nordeste, por exemplo, teve demanda abaixo do esperado. Um dos problemas é a dificuldade para garantir a construção de uma rede de gasodutos. Os custos podem chegar a R$ 100 bilhões. Há anos a iniciativa privada tenta transferir a conta para os cofres públicos, mas sem êxito.
O governo de transição também já sinalizou que pode rever a construção dessas térmicas. Mudar a natureza do empreendimento seria uma forma de garantir subsídios para os investidores privados interessados nos projetos.
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