SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O esforço do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para mudar a Lei das Estatais e, assim, facilitar nomeações de políticos para o comando de empresas públicas, foi duramente criticado por entidades do mercado financeiro e que atuam na defesa das melhores práticas de governança.

"Os danos decorrentes de indevidas interferências político-partidárias prejudicam os cofres públicos e a qualidade dos serviços e produtos entregues à população e afetam de forma negativa o ambiente de negócios brasileiro", afirma nota de repúdio contra as mudanças.

O texto é assinado em conjunto pela Amec (Associação dos Investidores no Mercado de Capitais), Apimec Brasil (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil), IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), IBDEE (Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial), INAC (Instituto Não Aceito Corrupção) e Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade.

A legislação, aprovada em 2016, foi alterada para reduzir para 30 dias a quarentena de indicados a ocupar cargos de presidente e diretor das empresas públicas. A alteração pode abrir caminho para concretizar o ex-ministro Aloizio Mercadante como presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), já indicado para o cargo por Lula.

Ainda de acordo com a nota de repúdio, as alterações na lei também comprometem o desenvolvimento do país e a mitigação da desigualdade social.

"No caso das sociedades de economia mista listadas em Bolsa de Valores, os impactos atingem investidores, prejudicando a atratividade do mercado brasileiro de capitais como importante fonte de financiamento das atividades econômicas", diz o documento.

Reflexo da manobra, as ações da Petrobras desabaram quase 10% na Bolsa de Valores brasileira no pregão desta quarta-feira (14). Depois da forte queda na véspera, as ações da estatal têm uma sessão de ajuste nesta quinta (15) e operam com alta acima de 1% por volta das 13h20 ?com ganhos de 1,65%, no caso das ordinárias, e de 1,16% das preferenciais.

Por causa do aumento da percepção do risco político em relação à empresa, a Genial Investimentos rebaixou de compra para manutenção a recomendação para as ações da Petrobras. "O fluxo de notícias do governo eleito traça uma orientação de negócios que julgamos negativo para a tese da empresa", diz o analista Vitor Sousa em relatório.

Segundo o analista da Genial, a alteração na Lei das Estatais significa a queda da "linha de defesa" dos interesses dos acionistas minoritários em relação à orientação dos negócios da companhia. "Não adianta dar murro em ponta de faca e insistir em um ?case? que corre o risco de passar a não se apropriar do atual ciclo dos preços do petróleo."

Na nota de repúdio, as entidades pontuam também que a Lei das Estatais foi fruto de longo processo legislativo, com a interação da sociedade civil, e representou avanço substancial na governança corporativa das empresas estatais federais, estaduais e municipais e na adoção de blindagem contra o risco de sua captura por interesses político-partidários.

Elas dizem que a lei estabelece meios para que a seleção de candidatos à administração das estatais seja guiada por profissionalismo, qualificação técnica, ética e atendimento aos objetivos dessas empresas, fortalecendo sua integridade, governança, gestão e eficiência.

Além disso, é destacado o fato de que as normas introduzidas pelo texto de 2016 atendem a recomendações de referências nacionais e internacionais, incluindo as diretrizes de governança para empresas estatais da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

"O alinhamento a esses padrões é um dos passos previstos no processo de acessão do Brasil à OCDE, que já reconheceu publicamente que os conselhos de administração das estatais federais aumentaram a independência de interferências político-partidárias em função dos impedimentos estabelecidos pela Lei das Estatais", diz a nota.

As organizações que assinam o documento dizem confiar que os órgãos externos de controle e o próprio Poder Judiciário irão cumprir suas atribuições, fiscalizando e punindo os responsáveis por desvios das normas jurídicas e dos sistemas de governança das estatais e das agências reguladoras.

"É preciso que os integrantes dos Poderes Executivo e Legislativo atuem para preservar a Lei 13.303/16 [Lei das Estatais], combatendo qualquer tentativa de mudança indevida, que resulte em retrocessos."


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