SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A médica Salma Bakhit, hoje com 53 anos, já pensava em adotar uma criança pelo menos desde 2015. Executiva da farmacêutica americana MSD (Merck Sharp & Dohme), especialista em oncologia pediátrica e hematologia pediátrica, com formação nos Estados Unidos, ela tinha uma carreira sólida e era independente financeiramente.

Nunca foi casada no papel e sabia que a maternidade seria uma iniciativa solo -o namorado a apoiava, mas ele vivia em território americano.

O plano original era adotar uma criança pequena, de 3 a 5 anos. Ela deu início oficialmente ao processo em 2017, mas só foi habilitada para adoção em novembro de 2018. Soube da possibilidade de adotar um adolescente, uma trajetória menos demorada que a de bebês e crianças pequenas.

Em 2019, por meio de um aplicativo, o A.Dot, que conecta crianças do Cadastro Nacional de Adoção com famílias de todo o país, ela viu o perfil de Paloma, então com 15 anos, moradora de Londrina (PR). Por meio do fórum da cidade paranaense, elas se aproximaram, de uma maneira lenta e gradual. Com a pandemia, em 2020, a comunicação continuou a distância. Só no começo de 2021, após uma decisão favorável da Justiça, a jovem se mudou para São Paulo para morar com Salma.

O processo foi acompanhado por uma assistente social e uma psicóloga. A adaptação das duas, claro, não foi fácil. Por diversos momentos, elas precisaram decidir se continuariam ou não com o processo. "Era uma adolescente com 1.000 questões na cabeça e um histórico de vida pesado, de abandono", lembra Salma, hoje vice-presidente associada de assuntos médicos e científicos da MSD na América Latina.

"Dizia a ela que eu não era uma madame querendo brincar de mãe, nem que ela era um prêmio para mim. Falava que eu queria construir um relacionamento", afirma. As duas se entenderam e a sentença definitiva de adoção saiu em setembro de 2021. Agora Paloma, com 19 anos, estudante do 3º ano do ensino médio, tem o mesmo sobrenome de Salma.

"Hoje ela é minha filha mesmo, não tenho nenhuma dúvida. Nem ela. E o relacionamento segue sendo construído. Minha filha é para sempre."

Salma Bakhi integra o grupo de cerca de 30 funcionários da MSD que aderiram ao benefício oferecido pela companhia no Brasil desde 2020: o Projeto Adoção. Trata-se de um auxílio de R$ 15 mil para mães ou pais (hetero ou homossexuais) que adotem crianças ou adolescentes.

O valor, pago uma única vez por criança, cobre honorários advocatícios e custas judiciais; transporte, hospedagem e alimentação por conta do processo de adoção; despesas médicas (até a inclusão de dependente no plano de saúde corporativo), incluindo cuidados paliativos.

Não há um limite para o número de adoções. É preciso apresentar o Termo Judicial de Adoção ou a Certidão de Nascimento a partir da vigência do projeto (2020). O pagamento é solicitado ao final do processo e o funcionário tem direito à licença maternidade (seis meses) ou paternidade (dois meses).

"O Brasil foi o terceiro país do mundo a adotar o benefício, depois dos Estados Unidos e de Porto Rico", diz Elisa Mendoza, diretora de recursos humanos do grupo MSD. "Nosso objetivo é apoiar os pais que querem adotar um filho, do ponto de vista financeiro, emocional e de qualidade de vida."

Segundo Elisa, o interesse pela adoção aumentou na empresa. "As pessoas que pretendem adotar costumam ficar um pouco tímidas em falar a respeito. Mas quando o processo é tratado de maneira normal e transparente, e até incentivado, tudo fica mais fácil."

'Ter filho é um salto quântico'

Salma concorda. "No começo, contei minha intenção para alguns colegas, meio em segredo, não queria expor uma situação que ainda não estava definida. Mas, depois que o programa foi implementado, o pessoal do RH foi muito amigo, me deu todo o suporte que eu precisava".

O suporte veio inclusive da chefia, o que a surpreendeu. "Fui promovida depois que voltei da licença-maternidade", diz. "Ou seja, a adoção não atrapalhou em nada a minha carreira, muito pelo contrário. Eu já era uma diretora, tinha um cargo de grande responsabilidade, que exigia muitas viagens e estava adotando sozinha -o que significava ter que me ausentar por alguns momentos. Mas as pessoas me acolheram demais, foi maravilhoso."

O apoio também vem da política de diversidade e inclusão da MSD, segundo Salma. "Minha filha é afrodescendente, tem uma etnia diferente da minha, o que no Brasil representa um desafio social muito grande. Essas questões também são debatidas na empresa, o que me acolhe."

A executiva considera que ter filho representa uma mudança muito grande de vida. "É um salto quântico, independentemente de ele ser adotado ou biológico", diz Salma. "Você passa a ser responsável por outra pessoa, a quem precisa inspirar, conduzir, mas ao mesmo tempo respeitar a individualidade", afirma.

"É claro que existem momentos extremamente difíceis, de você quase desistir, de chegar ao seu limite. Mas isso te faz amadurecer, amplia o seu horizonte. Ser mãe me tornou alguém mais feliz."


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