BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Os ruídos envolvendo o anúncio de que o Ministério da Fazenda vai acabar com a isenção para a importação de encomendas no valor de até US$ 50 (R$ 250) feita entre pessoas físicas elevou a tensão dentro do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com cobranças internas e até um princípio de lavação de roupa suja em redes sociais.
O ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência, Paulo Pimenta, se queixou em grupo interno de mensagens com outros ministérios de que a falta de coordenação está causando "incêndios" e "dor de cabeça" para o governo.
Por outro lado, é o próprio Pimenta que vem sendo pressionado, por causa das falhas de comunicação no momento em que o governo chega ao marco simbólico dos 100 dias.
"Em diversas oportunidades, o presidente Lula e eu repetimos que todo anúncio de medidas do governo que gera repercussão pública devem ser anteriormente debatidas na Secom e na Casa Civil. Isso é elementar. Somos um time. Se cada um fala o que quer, isso causa ruído e só traz dor de cabeça. A Secom acaba sendo acionada para apagar incêndios que poderiam ser evitados. Vamos ajustar isso definitivamente", escreveu Pimenta em um grupo de assessores de comunicação.
"Além de ser errado, é desrespeitoso com as bancadas, que acabam sendo surpreendidas com medidas que não foram debatidas nem explicadas anteriormente", continua o texto da mensagem do ministro, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso.
A comunicação do governo foi um dos motivos de crítica dentro do governo ao atingir o marco dos 100 dias no início desta semana. O próprio presidente Lula chegou a cobrar publicamente ministros que divulgavam suas "genialidades" sem o aval do Planalto.
O recado era, entre outros, para os ministros Márcio França (Portos e Aeroportos) e Carlos Lupi (Previdência Social). O primeiro divulgou plano para vender bilhetes aéreos ociosos a R$ 200 para aposentados e estudantes. Lupi, por sua vez, havia divulgado a redução do teto de juros para crédito consignado para aposentados.
A crise mais recente -e possivelmente a de maior repercussão, em especial com a classe média- envolveu o anúncio do fim da isenção de imposto de importação para encomendas de até US$ 50 (R$ 250) remetidas por pessoas físicas e destinadas também a pessoas físicas.
Membros do governo apontam que houve uma falha generalizada na comunicação, o que desvirtuou a mensagem oficial e abriu brecha para a versão de que a equipe de Lula estava taxando compras online.
A equipe de Pimenta defende internamente que foi pega de surpresa com a notícia e buscou conter os danos. A avaliação é que em nenhum momento se pensou em uma estratégia para tratar um tema de alto apelo popular e que envolve questões econômicas, de difícil compreensão por grande parte da população.
De acordo com a Receita Federal, as regras já não permitem isenção para compras de produtos de empresas e, portanto, o que está se buscando é o efetivo pagamento do tributo devido.
Não haverá mais distinção de tratamento nas remessas por pessoas jurídicas e físicas -o que serviria hoje apenas para fraudes generalizadas, segundo o governo. A medida afeta consumidores de lojas virtuais como Shein, Shopee e AliExpress, muito populares entre brasileiros.
O Planalto atribui parte da responsabilidade ao próprio ministro Fernando Haddad (Fazenda) e sua equipe que vinham usando a expressão "contrabando digital" para se referir a essas compras internacionais. Isso era visto como ofensivo à parte da população brasileira, que compra produtos nessas plataformas internacionais.
Outros membros do governo, no entanto, apontam o dedo para o próprio Pimenta, que estaria sendo pressionado por falhas na comunicação do governo e, por isso, busca terceirizar a responsabilidade para os ministérios.
Nesta manhã, Pimenta chegou a expor publicamente o problema com os outras pastas em suas redes sociais. Publicou um texto semelhante, mas menos crítico ao da mensagem enviada aos assessores de comunicação, mas apagou em seguida.
"Todos os ministérios têm suas assessorias de comunicação. O presidente Lula e eu em diversas oportunidades orientamos que anúncios de temas relevantes que tenham repercussão pública devem antes de serem anunciados debatidos na Secom e na Casa Civil. É elementar!!", afirma o ministro no post, que foi apagado minutos depois.
Na tentativa de conter os danos, o governo buscou reagir na tarde desta quarta-feira (12) com uma massiva atuação nas redes sociais para buscar esclarecer o tema, além de mobilizar influenciadores para transmitir melhor a mensagem.
Além disso, membros da equipe econômica passaram a dar entrevistas a emissoras de televisão para tentar explicar melhor o fim da isenção e minimizar os ruídos. O ministro Fernando Haddad abordou o assunto em entrevista concedida na China, onde acompanha Lula em viagem presidencial.
"Eu tenho visto muita confusão e muita desinformação. Tem empresas brasileiras que atuam no Brasil, tanto com lojas abertas quanto com comércio virtual. Tem empresas estrangeiras que têm sede no Brasil e tem portais estrangeiros que vendem no Brasil. Tudo isso é absolutamente legal", afirmou o ministro, em entrevista à Globonews.
"Ninguém está pensando em aumentar imposto. O que está se reclamando por parte de algumas empresas é que está havendo uma espécie de concorrência desleal por parte de alguns sites, não de todos. Isso está sendo investigado e pode ser coibido", completou.
Haddad disse também que a falta de igualdade na condição de concorrência prejudica a economia brasileira.
SECRETÁRIO DIZ QUE NÃO HAVERÁ NOVO IMPOSTO
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, reforçou também nesta quinta-feira (13) que o governo não vai criar um novo imposto com a MP (Medida Provisória) em estudo para fechar o cerco contra sonegação de impostos por parte de grandes empresas internacionais de comércio eletrônico.
Segundo Galípolo, não haverá mudanças para quem já respeita a legislação brasileira. No país, a cobrança de tributação de 60% sobre o valor de encomendas vindas do exterior que excedem US$ 50 sempre existiu na relação entre pessoa jurídica e pessoa física.
"Pode parecer que o que foi criado é um novo imposto ou que foi retirada uma isenção que existia e não se trata disso", afirmou o número dois da pasta econômica em entrevista à GloboNews.
"Para quem faz compras de empresas, pessoas físicas que fazem compras de empresas, não existia tal tipo de isenção, nem está sendo criado um novo imposto. Portanto, quem compra de forma regular, dentro da legalidade, conforme prevê o regimento legal do Brasil, não muda nada", acrescentou.
Galípolo já havia concedido outra entrevista para tratar do tema no Jornal Nacional.
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