BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer fazer ajustes no ponto de partida do novo arcabouço fiscal para evitar um corte de até R$ 40 bilhões nas despesas de custeio e investimentos na proposta de Orçamento para 2024, que precisa ser enviada até 31 de agosto deste ano.
A permanência desse cenário obrigaria a gestão petista a passar a tesoura nos recursos de diversas políticas públicas. Ainda que o próprio arcabouço autorize a recomposição desses valores no ano que vem, a avaliação é que propor gastos menores já na largada das discussões seria delicado do ponto de vista político, além de afetar a organização e gestão do Orçamento.
Uma das possibilidades é alterar, no próprio projeto de lei da regra fiscal, a inflação que corrige o limite de despesas anualmente. A desvantagem desse caminho é que o texto, hoje em tramitação no Senado, precisaria passar por nova votação na Câmara dos Deputados, atrasando ainda mais o cronograma.
Outra opção é inserir no PLDO (projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2024, ainda em análise pelo Congresso, uma autorização para o governo incluir os R$ 40 bilhões de forma condicionada à abertura de novos créditos no ano que vem. O desenho atual do arcabouço já contém uma brecha para permitir essa abertura de créditos no próximo exercício.
A escolha da melhor estratégia será uma decisão política. Nos últimos dias, a necessidade de aperto tem sido alvo de alerta da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet. Segundo ela, as cifras podem ficar entre R$ 32 bilhões e R$ 40 bilhões.
Os valores também já haviam sido apontados por economistas, que viram na possibilidade de abertura dos créditos uma manobra para permitir gastos extras em 2024.
O risco de corte nas discricionárias na proposta de Orçamento decorre de uma mudança feita pela Câmara dos Deputados no texto proposto pela equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
No desenho original, o limite de despesas seria corrigido pela inflação acumulada até junho do ano anterior e pela variação de preços estimada entre julho e dezembro do mesmo ano, mais a parcela de alta real entre 0,6% e 2,5% permitida pela regra.
Os deputados avaliaram que a parcela de projeção daria margem para o governo superestimar a inflação e, assim, obter um limite mais amplo para gastos. Por isso, o parecer do deputado Cláudio Cajado (PP-BA) alterou a correção para inflação em 12 meses até junho do ano anterior --sem nenhum componente de projeção incluído.
A mudança afetou os planos da Fazenda, uma vez que o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) em 12 meses até maio ficou em 3,94%, menor que a alta de 5,58% esperada pela SPE (Secretaria de Política Econômica) até o fim do ano.
"O projeto foi muito bem debatido, muito bem elaborado, de maneira plural. Mas nós temos agora um desafio para a elaboração do PLOA [Projeto de Lei Orçamentária Anual]", disse o secretário de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Paulo Bijos.
Ele citou que o corte pode ser de R$ 40 bilhões, em "grandes números", caso o cenário atual se mantenha. "A discussão envolverá o ajuste da base", afirmou. "A despesa condicionada é uma possibilidade, mas não vou antecipar qual vai ser o caminho para equacionar a situação."
Caso a escolha seja mudar o texto no Senado, o secretário ressaltou que o processo será conduzido em diálogo com a Câmara, que teria palavra final sobre o texto.
Na próxima quinta-feira (15), Haddad deve ter uma reunião com lideranças do Senado para discutir o arcabouço e, segundo Bijos, um dos temas tratados deve ser a intenção de fazer esse ajuste no ponto de partida da nova regra.
O secretário disse que a regra aprovada pela Câmara ficou mais apertada, o que pode gerar entraves na elaboração do Orçamento.
Além de um espaço fiscal menor, o governo precisará acomodar uma série de despesas sob o novo limite, apelidadas pelo secretário de "come cotas de despesas discricionárias". A lista inclui a retomada dos pisos de saúde e educação vinculados à arrecadação, que resultarão em valores maiores do que os que vinham sendo praticados sob o teto de gastos aprovado no governo Michel Temer (MDB).
Como mostrou a Folha em maio, estimativas do mercado apontam um incremento de até R$ 35 bilhões por causa dos novos pisos em saúde e educação, dos quais R$ 29 bilhões seriam apenas na saúde. Os valores se aproximam de estimativas internas do governo.
Outros itens desafiadores são o piso para investimentos (ao redor de R$ 70 bilhões), a reserva para emendas parlamentares e os gastos com custeio da máquina, onde o governo vê pouca gordura para redução ante os atuais R$ 45 bilhões.
"Vamos tentar ajustar. Queremos achar um ponto de equilíbrio, nem afrouxar nem aportar, ter um nível adequado [de despesas]", afirmou Bijos.
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