SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Para que o país volte a ter a nota de crédito elevada pela Fitch, é preciso demonstrar um maior consenso entre os políticos em relação a quais direções econômicas devem ser seguidas para alcançar um crescimento econômico sustentável.
A avaliação é de Todd Martinez, diretor sênior da Fitch e um dos responsáveis pela classificação do Brasil feita pela agência.
"Um aspecto necessário para a obtenção do grau de investimento é uma maior confiança em relação a um consenso político em torno de uma boa formulação de políticas", disse o executivo nesta quarta (26) em entrevista à Folha de S.Paulo, por telefone.
A Fitch elevou nesta quarta a nota de crédito soberano do Brasil de BB- para BB, mantendo o rating do país dois degraus abaixo da obtenção do grau de investimento.
Segundo a agência, a decisão reflete um desempenho macroeconômico e fiscal melhor que o esperado, além da agenda de reformas colocada em prática durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT ), com o avanço da Reforma Tributária e do arcabouço fiscal no Congresso. Também pesaram na reavaliação da agência a reforma da Previdência e a independência do BC (Banco Central).
Martinez afirmou que, após uma série de sinais mistos no início do ano sobre a condução da política econômica, parece haver agora uma sintonia mais fina entre os membros do governo.
O analista disse também que, para que a Reforma Tributária tenha sucesso, o governo precisará reduzir as isenções fiscais, uma vez que o Congresso tem se colocado contra aumentos de impostos.
PERGUNTA - O que o Brasil precisa fazer para recuperar o grau de investimento?
TODD MARTINEZ - Um aspecto necessário para a obtenção do grau de investimento é uma maior confiança em relação a um consenso político em torno de uma boa formulação de políticas, independentemente de quem é o presidente. Uma das razões pelas quais nós rebaixamos o rating do Brasil em 2015 foi a sensação de que esse consenso em torno da política monetária e fiscal havia se perdido no Brasil. Precisamos ter maior confiança de que esse consenso foi recuperado.
Isso não significa apenas um histórico de boas políticas e reformas, mas também significa que o Brasil precisa evitar o risco de complacência. O que quero dizer é que, se a economia estiver indo bem, gostaríamos de ver o país não apenas gastando aquele dinheiro que pode vir de maior atividade econômica e receitas adicionais, mas usando esse benefício para construir sua política e munição para os eventuais períodos em que o crescimento desacelera.
Também gostaríamos de ver a consolidação fiscal avançando, com a conquista de um superávit primário que não apenas estabilizaria a relação entre dívida e PIB, mas a colocaria em uma trajetória de queda.
P. - Qual o maior risco que pode impedir uma evolução do rating do Brasil?
TM - O novo arcabouço fiscal, que esperamos que seja aprovado no Congresso, é positivo porque sinaliza um compromisso com a consolidação fiscal, mas é um projeto bastante complexo. É mais complicado do que a regra de gastos anterior [teto de gastos] e pode ser difícil de implementar. Embora esse novo arcabouço fiscal tenha um limite de gastos muito mais frouxo do que o teto de gastos anterior, ainda é um teto que pode ser difícil de cumprir.
P. - Qual a avaliação sobre a Reforma Tributária?
TM - A Reforma Tributária em discussão é positiva para a arrecadação, mas o Congresso se opõe a aumentos de impostos para alcançar uma melhoria na receita. Por isso, o governo vai precisar avançar na redução de isenções fiscais de que tanto se fala. Muitas delas podem ser tecnicamente difíceis e podem enfrentar alguma resistência. E se o Brasil não conseguir cumprir suas metas fiscais, se torna mais difícil imaginar uma estabilização da dívida e, eventualmente, uma queda e torna mais difícil imaginar novas atualizações para o rating do Brasil.
Se o país não progredir em uma consolidação fiscal, seria um cenário em que poderíamos pensar em reavaliar o rating para baixo, mas, pelo menos por enquanto, estamos confiantes que o governo vai se mover na direção correta.
P. - Qual sua avaliação sobre o governo Lula na economia nestes sete meses de mandato?
TM - Ficamos bastante surpresos com a quantidade de mensagens confusas que havia sobre questões econômicas nos primeiros meses. Havia uma promessa de disciplina fiscal, mas também foram feitos comentários que colocaram pontos de interrogação em torno do compromisso com a disciplina fiscal.
Falou-se em reverter a reforma da Previdência e algumas das outras reformas que foram aprovadas em governos anteriores e que achamos que foram positivas para o crescimento das finanças públicas. Houve críticas muito explícitas ao Banco Central e alguns temeram que isso pudesse se traduzir em uma tentativa séria de mudar a estrutura de metas de inflação ou a estrutura de política monetária de forma mais ampla.
Então, acho que inicialmente sim, vimos muitos sinais importantes e isso se refletiu em alguns nervosismo do mercado em termos da curva de juros da moeda, mas desde então vimos uma consistência muito maior nas mensagens do governo, vimos que as críticas à política monetária são apenas críticas. As críticas às reformas do governo passado provavelmente não vão resultar em esforços sérios para derrubá-las e mudar radicalmente o modelo econômico do país.
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