BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta quinta-feira (28) que todos os setores envolvidos nas negociações para a redução dos juros do rotativo de cartão de crédito precisam fazer concessões em busca de uma solução estrutural.
O chefe da instituição prevê discutir o tema com os diferentes segmentos do mercado de crédito dentro do prazo de 90 dias, após a aprovação no Congresso do PL do Desenrola Brasil, programa de renegociação de dívidas, que trata também dos juros do rotativo.
"Nesses 90 dias, vamos tentar fazer uma reunião com todos os setores, com todos envolvidos, para ver se a gente consegue buscar uma solução que seja mais estrutural, de longo prazo, e melhor", disse.
Campos Neto apontou um problema de crescimento do "bolo de crédito", com inadimplência e taxa de juros cada vez mais altas. Segundo ele, isso eventualmente pode se tornar um problema maior para as pessoas e, consequentemente, para o consumo.
Questionado sobre a possibilidade de envolver o redesenho do parcelamento de compras sem juros, como defendem os bancos, Campos Neto afirmou que esse é um tema do CMN (Conselho Monetário Nacional), que teve forte resistência de vários setores e vai ser discutido.
"A gente precisa todo mundo sentar, discutir e falar: 'Olha, a solução é uma solução na qual precisa cada um ceder um pouco'. Esse debate tem de ser muito mais amplo, com o Ministério da Fazenda", disse.
"Não fazer nada também é um problema, ou seja, a gente precisa achar uma solução mais estrutural. Eu não posso dizer aqui qual a solução, pois não depende só do Banco Central. É uma coisa que está sendo conversada mais amplamente", afirmou.
Os bancos falam em subsídio cruzado entre as modalidades por causa da inadimplência. Isso significa que um mesmo cliente que efetuou diversas compras parceladas pode eventualmente no futuro enfrentar dificuldades financeiras e, pelo volume acumulado de compras, não conseguir honrar o pagamento integral da fatura mensal do cartão de crédito, caindo, assim, no rotativo.
Parte do setor de cartões de crédito, entretanto, rechaça uma relação de causalidade entre as duas modalidades e nega que a inadimplência seja maior nos prazos mais longos do que nos pagamentos à vista.
Pesquisa Datafolha publicada em 29 de agosto mostrou o apoio de comerciantes à modalidade da compra parcelada sem juros na cidade de São Paulo.
De acordo com o levantamento, oito em cada dez (81%) responsáveis por estabelecimentos de pequeno porte da capital paulista são contrários ao fim da venda parcelada sem juros no cartão de crédito.
Além disso, 81% dos comércios pesquisados fazem vendas sem juros no cartão de crédito. Destes estabelecimentos, a venda parcelada sem juros corresponde, em média, a 50% das operações com cartão de crédito e a 45% do faturamento mensal.
O PL do Desenrola foi aprovado na manhã desta quinta na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado. O projeto deve ser votado pelo plenário da Casa na próxima segunda-feira (2) em sessão remota.
O relator, senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), cedeu à pressão do Ministério da Fazenda e manteve o texto aprovado pela Câmara dos Deputados.
Após sinalizar que faria uma emenda de redação, o parlamentar recuou e disse que, ao ouvir diferentes atores econômicos, entendeu que "já estão presentes no texto as balizas que garantirão a melhor situação possível para os devedores".
O texto aprovado pela Câmara dá 90 dias para as próprias instituições do sistema financeiro definirem um patamar de juros para o rotativo e para o parcelamento da fatura do cartão em atraso.
O parcelamento é acionado automaticamente 30 dias após o cliente cair no rotativo por não ter quitado a fatura integral do cartão. Se não houver o aval do CMN nesse período, será aplicável o teto que limita a dívida ao dobro do montante original.
Em agosto, a taxa média de juros cobrada pelos bancos de pessoas físicas no rotativo do cartão de crédito ficou em 445,7% ao ano, segundo dados divulgados pelo Banco Central.
A cifra representa uma alta de 4,4 pontos percentuais na comparação com o mês anterior. Em julho, no dado revisado pela autoridade monetária, a taxa média foi de 441,3%.
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