SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, classificou como positivo o relatório da proposta apresentado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator da reforma, nessa quarta-feira (25).

Em entrevista à emissora GloboNews nesta quinta-feira (26), o secretário disse esperar que não sejam feitas mais mudanças no texto até a votação da medida na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa, prevista para 7 de novembro. A previsão é que o plenário avalie a proposta em 9 de novembro.

Appy avaliou que o texto apresentado por Braga resolve cerca de 75% das distorções existentes atualmente no sistema tributário brasileiro e que a proposta melhora significativamente o cenário tributário atual. O secretário deu "nota 7" para o texto apresentado pelo relator no Senado.

"Nossa avaliação com relação ao relatório é, no geral, positiva", disse Appy. "O que se obteve em termos de criação de um ambiente político para a aprovação de certa forma compensa o custo das mudanças que foram feitas no Senado", complementou.

Appy ponderou que o relator fez esforços para "mitigar um pouco" as exceções aprovadas pela Câmara, em julho, e gerar "menos pressão" sobre a alíquota padrão, compensando as exceções adicionais que colocou no texto.

Ele também destacou que muitas das demandas apresentadas por diferentes partes da discussão, como setores e Estados, já foram atendidas no relatório e que não espera que a aprovação da matéria seja travada pelas diversas preocupações de cada lado.

"Eu acho que o texto apresentado ontem (quarta-feira) já contempla muita das demandas necessárias para poder criar um ambiente político favorável para a aprovação", afirmou.

O secretário defendeu que o novo modelo tributário "acaba com a guerra fiscal" e que o fundo regional previsto no texto permitirá o desenvolvimento dos Estados nas áreas em que possuam mais vocação para produzir e gerar renda.

De acordo com ele, no sistema atual, Estados fornecem benefícios fiscais a empresas que nunca seriam atraídas caso não houvesse a vantagem, o que gera um cenário de pouca produtividade e eficiência econômica.

"A tendência do Estado vai ser alocar esses recursos naquilo que tem mais potencial de geração de emprego e renda. Você vai ver aquilo que tem vocação para produzir", disse.

DIVISÃO NA CESTA BÁSICA E CASHBACK

No parecer, Eduardo Braga incluiu regimes específicos para setores como turismo, agência de viagens, saneamento e concessionárias de rodovias.

No texto, ele propôs ainda uma nova categoria de alíquota para profissionais liberais como advogados e médicos que estão fora do Simples Nacional ?em geral, sociedades com faturamento anual superior a R$ 4,8 milhões.

O senador, por outro lado, decidiu dividir a classificação dos produtos da cesta básica. O objetivo é restringir a isenção total dos tributos a uma lista menor de itens, chamada de Cesta Básica Nacional, enquanto a cesta estendida teria apenas um desconto de 60% na alíquota.

Contribuintes de baixa renda poderão pedir a devolução do imposto por meio do chamado "cashback". O parecer também prevê o mesmo mecanismo na conta de luz dos mais vulneráveis.

Interlocutores do governo são cautelosos em analisar o efeito das mudanças sobre a alíquota do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que já era estimada entre 25,45% e 27%, uma das mais altas do mundo.

Novas exceções podem ampliar ainda mais a cobrança. Porém, os cálculos exatos ainda serão feitos por técnicos.

A avaliação é que o parecer tem pontos positivos, como a trava contra uma desoneração muito ampla da cesta básica. No entanto, o aumento das exceções vai na direção contrária da expectativa do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de que o Senado restringisse benesses concedidas pela Câmara.

O relator rebateu as críticas e ressaltou que "o ótimo é inimigo do bom". "Esse relatório está mais enxuto do que veio da Câmara. Quem estiver fazendo essa conta [de que exceções foram ampliadas], queria que me mostrasse na conta", disse.

FUSÃO DE IMPOSTOS

O texto prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), e ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um novo sistema será dual: parte da alíquota será administrada pela União por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e a outra, por estados e municípios pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).

Também será criado um Imposto Seletivo sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde (como cigarros e bebidas alcoólicas) ou ao ambiente, à exceção dos produzidos na Zona Franca de Manaus.

As alíquotas definitivas de cada tributo serão detalhadas depois, em lei complementar. Porém, o relator introduziu uma trava: a carga sobre o consumo não poderá ser maior do que a média observada entre 2012 e 2021 ?um patamar próximo a 12,5% do PIB (Produto Interno Bruto).

A reforma prevê uma cobrança padrão sobre a maior parte do consumo, uma alíquota reduzida (equivalente a 40% do valor cheio) para alguns bens e serviços e, agora, uma alíquota intermediária (equivalente a 70% da cobrança integral) para profissões liberais.

Na alíquota reduzida, foram contemplados serviços de saúde e educação. Braga decidiu ainda criar um regime específico para os serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual, ferroviário, hidroviário e aéreo, que antes estavam com alíquota reduzida.

A mudança acaba beneficiando as grandes companhias aéreas, que haviam ficado de fora de qualquer tratamento diferenciado. A versão aprovada na Câmara contemplava apenas serviços de aviação regional.

O senador retomou ainda o artigo que prorroga incentivos fiscais a montadoras dos polos automotivos do Nordeste e do Centro-Oeste até 2032.

ESPECIALISTAS VEEM REDUÇÃO DE GANHOS

Coordenadora do Núcleo de Pesquisas em Tributação do Insper, Vanessa Canado disse que o aumento no número de exceções reduz os ganhos econômicos esperados com a reforma e impõe alíquota maior para os demais contribuintes.

"Aumentou a complexidade. Piorou o nível de eficiência econômica do tributo", disse ela, ressalvando que ainda assim o novo sistema será melhor que o atual.

Braga também criou uma alíquota de até 1% no Imposto Seletivo sobre a extração de petróleo e minérios, inclusive para exportação, o que deve afetar companhias como a Petrobras e a Vale. O argumento é que a exploração dos recursos causa "danos ao território nacional".

O presidente do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), Roberto Ardenghy, afirmou que a medida preocupa. Segundo ele, a tributação extra deverá ter impacto nos preços.

Nas discussões federativas, o relator elevou a R$ 60 bilhões o aporte anual do governo federal no FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional). Governadores queriam R$ 75 bilhões.

Pela proposta, o aumento extra de R$ 20 bilhões será distribuído ao longo de dez anos. Em 2034, haverá um incremento de R$ 2 bilhões ao ano, até alcançar R$ 60 bilhões a partir de 2043.

O novo modelo inviabiliza a continuidade do uso de isenções e créditos presumidos, e o FNDR será usado por estados para conceder incentivos locais.

Pelo texto, 70% dos recursos serão distribuídos com base nos coeficientes do FPE (Fundo de Participação dos Estados), critério que beneficia o Norte e Nordeste, que têm menor renda per capita. Os outros 30% serão repartidos com base na população, o que deve contemplar Sul e Sudeste, com mais habitantes.

O texto aprovado pela Câmara previa valores progressivos, começando em R$ 8 bilhões em 2029 e subindo mais R$ 8 bilhões ao ano, até alcançar R$ 40 bilhões anuais a partir de 2033.

Em seu parecer, o relator também tenta colocar um ponto final na polêmica em torno do Conselho Federativo, instância que ficaria responsável pela arrecadação e distribuição do IBS. O parecer de Braga esvazia o Conselho e o converte em um comitê gestor.


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