BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A equipe econômica ainda avalia o estrago da declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a meta fiscal de 2024. O principal temor é que a fala desencoraje os parlamentares a votar as medidas necessárias para elevar a arrecadação do governo no ano que vem.

Em café com jornalistas no Palácio do Planalto nesta sexta-feira (27), o mandatário disse que a meta fiscal não precisa ser de déficit zero, como quer o ministro Fernando Haddad (Fazenda), e que esse resultado dificilmente será atingido, pois não quer realizar cortes em investimentos e obras no ano que vem.

Segundo interlocutores do governo ouvidos pela reportagem, a declaração do presidente pegou membros do Executivo de surpresa, inclusive da equipe econômica, com quem não houve qualquer tipo de combinado prévio.

De acordo com relatos da equipe econômica e do Palácio do Planalto, não há discussão concreta para propor modificação na meta fiscal de 2024, embora haja entusiastas da mudança na ala política do governo.

Mesmo assim, a fala de Lula acendeu um alerta porque ocorreu no momento em que a Fazenda tenta negociar maior celeridade na aprovação de medidas cruciais para equilibrar o Orçamento do ano que vem.

Haddad quer aval do Congresso à tributação de benefícios fiscais do ICMS, que poderia render sozinha até R$ 35,3 bilhões no ano que vem. O texto não foi votado em nenhuma das Casas. Já a taxação de fundos exclusivos dos super-ricos e de recursos em paraísos fiscais (offshores) foi aprovada na Câmara dos Deputados, mas ainda precisa passar pelo Senado.

Após a declaração de Lula, membros do Ministério da Fazenda foram procurados por parlamentares para saber da postura da equipe econômica daqui para frente.

Segundo um interlocutor, a mensagem transmitida aos congressistas é de que a pasta "não mexe um milímetro" na direção do plano traçado, que inclui ir atrás de receitas suficientes para zerar o déficit em 2024.

De acordo com esse técnico, o presidente é a autoridade máxima e tem a palavra final sobre qualquer tema, mas a Fazenda pretende defender a importância de manter a meta como está.

Há uma avaliação na equipe econômica de que mexer agora no alvo da política fiscal de 2024 poderia desancorar as expectativas e ainda desestimular os parlamentares a aprovar o pacote de receitas.

Segundo os relatos, o governo tem debatido internamente os cenários para 2024. Técnicos admitem que, nesses cenários, "eventualmente" pode ser necessário fazer alguma limitação do investimento no primeiro ano do novo arcabouço fiscal. Na Fazenda, porém, a avaliação é de que a medida seria por uma boa causa, para assegurar a solidez e a credibilidade fiscal do país.

No entanto, a possibilidade de trava aos investimentos foi justamente um dos elementos centrais da fala de Lula. O presidente demonstrou preocupação com o risco de o esforço fiscal exigir do governo um contingenciamento significativo de recursos no ano que vem, com impacto sobre os investimentos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), uma das principais vitrines do terceiro mandato do petista.

O PAC é coordenado pela Casa Civil, pasta chefiada por Rui Costa --com quem Haddad já teve atritos por divergências na visão sobre a condução da política econômica e fiscal.

Nesse contexto, a preocupação externada por Lula é vista como reflexo do temor do próprio Rui Costa de que o PAC fique sem os recursos financeiros necessários para atravessar 2024, ano de eleições municipais, no qual é preciso garantir sensação de economia crescendo e gerando empregos.

Com uma meta fiscal mais frouxa, que autorize um déficit nas contas no ano que vem, a necessidade de bloquear recursos no Orçamento se dissiparia --daí a pressão em torno do tema.

Interlocutores do governo afirmam ainda que eventual mudança na meta fiscal de 2024 teria outro efeito colateral: reduzir o poder de barganha do Congresso nas negociações com o Executivo.

No controle de uma série de medidas estratégicas para Haddad, Câmara e Senado têm usado as propostas para negociar apoio no varejo, exigindo uma operação habilidosa de articulação política, com liberação de emendas e cargos aos congressistas.

Na concessão mais recente, Lula demitiu a presidente da Caixa, Rita Serrano, para ceder a cadeira a Carlos Antônio Vieira Fernandes, indicado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Com a troca, integrantes da articulação política demonstraram otimismo com as medidas no Congresso Nacional. Eles minimizaram eventuais atritos com parlamentares e disseram que hoje há entendimento consolidado da importância dessas medidas fiscais.


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