BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Uma eventual derrubada do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto de lei que prorroga a desoneração da folha para 17 setores pode ter um impacto de quase R$ 19 bilhões nas contas do governo federal.

Técnicos ouvidos pela Folha afirmam que os parlamentares não poderiam restabelecer o texto da lei apenas parcialmente. Por isso, a rejeição do veto, como vem sendo defendida por membros do Congresso Nacional, teria como resultado não só a prorrogação do benefício às empresas até 2027, mas também o corte na contribuição previdenciária dos municípios.

Nas contas do Ministério da Fazenda, a extensão da desoneração da folha custaria R$ 9,4 bilhões anuais aos cofres públicos. Já a redução das alíquotas que as prefeituras pagam ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) drenaria outros R$ 9 bilhões.

O veto à prorrogação da desoneração foi antecipado pela coluna Painel S.A e publicado nesta sexta-feira (24) no Diário Oficial da União.

Em pronunciamento na manhã desta sexta, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que apresentará até o fim do ano uma proposta para substituir a desoneração da folha de pagamento, mas não deu detalhes das medidas.

A decisão do governo é defendida por economistas como Samuel Pessôa e Marcos Mendes, ambos colunistas da Folha. Para eles, a política não alcançou os resultados almejados de impulsionar a geração de empregos e a economia.

Por outro lado, o veto foi criticado por entidades que representam os setores contemplados e membros do Congresso. Parlamentares defendem abertamente a derrubada do veto de Lula.

Para isso, seria necessário o apoio da maioria absoluta em ambas as Casas, isto é, 257 deputados e 41 senadores.

O advogado Fernando Saboia, que já foi secretário-geral adjunto da Mesa Diretora da Câmara, explica que o veto integral a uma lei não pode ser dividido no momento da apreciação. Isso significa que os parlamentares não podem restabelecer a desoneração da folha dos setores sem contemplar também os municípios.

"Em caso de veto integral, o Congresso Nacional mantém ou rejeita o veto numa única votação. Não há como parcelar", diz.

Segundo ele, a Constituição Federal prevê que o Legislativo delibere sobre o veto, não sobre o texto do projeto, que já foi aprovado anteriormente.

Um veto presidencial pode ser total, como no caso do projeto de lei da desoneração, ou parcial, alcançando apenas um ou mais dispositivos da lei, desde que se trate de texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea. Não é possível vetar palavras ou frases específicas.

Cada veto é explicitado em despacho do presidente da República, com justificativas individuais para cada dispositivo barrado.

O regimento conjunto do Congresso prevê a votação nominal dos vetos "agrupados por projeto" (ou seja, todos os vetos de um mesmo texto são votados em conjunto). A exceção é quando uma liderança destaca dispositivos individuais ou conexos para votação em separado.

Segundo Saboia, como houve um único veto do presidente ao projeto de lei da desoneração da folha, não há como se falar em destaque de dispositivos. "Na votação, o parlamentar vota 'sim' ou 'não' ao veto, não ao dispositivo vetado, pois este não está mais em deliberação", afirma.

Técnicos que atuam hoje no Congresso têm visões diversas sobre o tema.

A Folha ouviu relatos de quem concorda com essa leitura, uma vez que o regimento cita o agrupamento dos vetos por projeto. Segundo um consultor, que analisou o tema sob condição de reserva, a desoneração só conta com um veto, enquanto os vetos parciais são vários num mesmo projeto. Por isso, não há como fazer segregação.

Outro técnico em atividade, porém, afirma que não há vedação expressa ao destaque de um trecho da lei alvo do veto integral. Por esse raciocínio, seria possível restabelecer apenas parte do projeto.

Se houver derrubada do veto, o Executivo ainda pode acionar o STF (Supremo Tribunal Federal) para questionar a lei. Em outros episódios envolvendo renúncias, governos anteriores também buscaram respaldo no TCU (Tribunal de Contas da União) para evitar a implementação de desonerações sem medidas de compensação correspondentes.

Nos bastidores, membros do governo avaliam que teria sido mais prudente se Haddad anunciasse rapidamente as medidas de equacionamento para os setores afetados, para evitar que se forme uma pressão muito grande pela derrubada do veto, ou ainda que isso acabe respingando no andamento da agenda econômica no Congresso Nacional.

A proposta aprovada pelo Congresso permitia que, até 2027, os setores desonerados pagassem alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% de contribuição previdenciária sobre a folha de salários para a Previdência.

Os 17 segmentos contemplados são calçados, call center, comunicação, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, couro, fabricação de veículos e carrocerias, máquinas e equipamentos, proteína animal, têxtil, tecnologia da informação, tecnologia de comunicação, projeto de circuitos integrados, transporte metroferroviário de passageiros, transporte rodoviário coletivo e transporte rodoviário de cargas.

Para compensar a renúncia de receitas, o projeto também estende o aumento de 1% na alíquota da Cofins-Importação. Pela lei atual, as regras valeriam até dezembro.

No caso dos municípios, o texto reduz de 20% para 8% a contribuição ao INSS das prefeituras que não têm regimes próprios de Previdência. A regra vale para cidades com até 142,6 mil habitantes.

A FPE (Frente Parlamentar do Empreendedorismo), que reúne 209 deputados e 46 senadores, diz em nota que o veto impõe "riscos expressivos" aos setores e mira apenas a recomposição da arrecadação, ignorando quaisquer efeitos negativos sobre a manutenção dos empregos.

A frente também afirma que, pelo lado político, o governo "parece ignorar a vontade soberana" da Câmara e do Senado, num momento em que o próprio ministro da Fazenda busca apoio para aprovar medidas econômicas. "Neste momento, de discussão de uma agenda econômica que carece de consenso, é preciso construir, não tensionar", diz o presidente da FPE, deputado Joaquim Passarinho (PL-PA).

"A FPE trabalhará de maneira firme, em conjunto com outras frentes parlamentares que defendem o ambiente de negócios, a segurança jurídica e a geração de empregos, para derrubar os vetos à desoneração da folha de pagamentos", diz.


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