SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Quando o novo servidor público chega a seu posto de trabalho no primeiro dia, após ser aprovado por meio de um concurso, pode ter inúmeros tipos de acolhimento, do mais frio e seco a um caloroso evento de integração. Não há no Brasil uma padronização para recepcionar esses profissionais que ingressam em órgãos governamentais.

A boa guarida ao novo funcionário, com veteranos orientando na rotina a ser assumida, é tão importante, segundo especialistas, que pode impactar de forma positiva no tipo de atendimento que vai chegar ao público em geral. Embora o assunto seja discutido no país, cada ente, seja União, estado ou município, cria suas próprias iniciativas.

"É melhor do que não ter nada, mas ainda não é suficiente. O acolhimento não deve ser apenas um evento inicial. Precisa estar alinhado à cultura organizacional para melhorar o clima interno e diminuir o turnover [rotatividade de funcionário]. Também é uma oportunidade para indicar capacitações importantes para a função do servidor", afirma Renata Vilhena, professora associada da Fundação Dom Cabral.

Esta é a segunda reportagem da série Carreira Pública, em parceria com o Instituto República.org, que em cinco partes discute a trajetória do servidor desde sua entrada no funcionalismo até a aposentadoria.

Para Renata, a padronização de políticas de acolhimento é fundamental para garantir uma entrada na administração pública mais eficiente _o que na outra ponta beneficia a própria população_, e deveria ser oferecida a vários grupos, desde funcionários temporários, comissionados a concursados.

Uma instrução normativa do governo federal com diretrizes e etapas essenciais para acolher, segundo ela, poderia ser o primeiro passo para garantir um processo mais eficiente e humanizado.

"Nesse documento deveria constar uma orientação e as etapas fundamentais para uma boa recepção. Aí, vai da criatividade e do que cada órgão pode fazer. Mas não basta só isso ou um manual na internet. Uma dinâmica de apresentação também ajuda, porque o calor humano é essencial."

Pensando na ausência de um padrão de acolhimento, a Enap (Escola Nacional de Administração Pública) lançou em 2023 o programa Onboarding para dar boas-vindas a novos servidores federais que assumem cargos de liderança e estratégicos do governo.

A iniciativa visa acelerar a compreensão da máquina pública e das regras governamentais, permitindo que novos líderes se concentrem mais rapidamente na formulação de políticas públicas. O resultado tem sido tão positivo que, em 2024, o Onboarding vai se estender aos novos servidores aprovados no concurso nacional unificado.

A prova desse que também é chamado de "Enem dos concursos" está prevista para 5 de maio. O edital com as regras do processo seletivo será divulgado em 10 de janeiro e o período de inscrições será de 19 de janeiro até 9 de fevereiro, de acordo com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos.

De acordo com Betânia Lemos, presidente da Enap, o onboarding não é obrigatório, mas é altamente recomendável.

"O curso também promove a formação de networking entre os participantes, facilitando a colaboração e a formulação de políticas públicas mais eficazes. É resposta à necessidade de lideranças bem preparadas para enfrentar os desafios do governo."

Betânia ressaltou que o público que ingressou no governo recentemente está altamente engajado em contribuir para a melhoria das políticas públicas.

Mas o acolhimento nem sempre é uma realidade e a falta dele pode levar a consequências perigosas, como o novo servidor desenvolver problemas de saúde mental por causa da pressão para fazer um trabalho para o qual ele não recebeu a devida orientação.

É essa a realidade constatada por Lira Alli, diretora do Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo). O local já recebeu inúmeras denúncias, oriundas de diversas secretarias, de que funcionários com mais tempo de casa, muitas vezes comissionados, geralmente indicação política, pressionam os novatos.

"Os mais velhos cobram esses trabalhadores para fazer as tarefas, mas sem ensiná-los como. É um nível de cobrança bastante ruim, sem nenhum tipo de acolhimento. Os novos servidores são demandados, às vezes, por coisas que nem são sua função no cargo."

UNIVERSIDADES SAEM NA FRENTE

Em geral, as universidades públicas têm propostas para que o acolhimento do novo servidor seja feito de forma a integrá-lo à nova rotina, mas também com o objetivo de aumentar sua produtividade.

A Universidade Federal de São Carlos tem enfrentado o desafio de lidar com a reposição de vagas com a aposentadoria compulsória de professores e com a alta rotatividade de técnicos administrativos devido aos baixos salários no setor público, de acordo com a professora Jeanne Michel, pró-reitora de gestão de pessoas da UFSCar.

Diante dessa realidade, segundo ela, a universidade identificou a necessidade de implementar um programa de recepção visando integrar os novos funcionários à comunidade acadêmica e proporcionar um senso de pertencimento.

"Acolher os novos servidores é uma prioridade da instituição. Realizamos essa ação semestralmente, onde reunimos todos os contratados nos últimos meses em um evento de integração. Apresentamos a estrutura organizacional, plano de carreira e benefícios."

Outras universidades federais têm propostas semelhantes, como a Rural da Amazônia, do Amapá, de Ouro Preto e o Instituto Federal Fluminense.

Em São Paulo, o Centro Paula Souza inaugurou, em julho de 2023, o processo de Integração de novos servidores para todas as unidades de ensino de Etec (Escola Técnica Estadual) e Fatec (Faculdade de Tecnologia do Estado de São Paulo), além da administração central, um processo até então inédito, de acordo com Karen dos Reis Fernandes Teixeira, professora e coordenadora do Projeto de Desenvolvimento de Pessoas da Unidade de Recursos Humanos da instituição.

Há também, segundo ela, uma preparação de ambiente de trabalho adequado _com computador, mesa e estação de trabalho, material de escritório e didático_, publicação com dicas de serviços e alimentação no entorno da unidade, apresentação do espaço físico e outros funcionários, adaptação às necessidades de servidores com deficiência, treinamentos e capacitações.

O Tribunal Regional do Trabalho da 13ª região da Paraíba recebeu 80 novos servidores este ano e, para recepcioná-los, realizou uma semana de palestras explicando o funcionamento da organização e funções. Na posse, a solenidade foi transmitida para parentes e amigos que não puderam comparecer.


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