SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Enquanto 2023 foi o ano do agronegócio, especialistas esperam uma forte desaceleração do setor neste ano, quando o crescimento da economia brasileira vai se espalhar e acontecer de forma mais homogênea entre os setores. Ainda assim, alguns segmentos vão se destacar mais do que outros em 2024.

É o caso do setor de óleo e gás, que deve seguir tendo produtividade forte e sendo a base da matriz energética, não apenas neste ano, como na próxima década, segundo especialistas.

"O Brasil ainda tem um grande fetiche em petróleo, porque a Petrobras é uma empresa forte e segue sendo estratégica para o governo, e também por conta das últimas descobertas da possibilidade de exploração de petróleo no Norte do país", diz Sergio Vale, economista-chefe e sócio da consultoria MB Associados.

O economista chama atenção para o fato de que, mesmo com os discursos do governo sobre a importância de se investir em transição energética, em seu terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) segue tendo interesse especial em acelerar a produção de petróleo.

"Os investimentos em energia verde acontecem, o segmento atrai interesse do setor privado, mas, no governo, a boa vontade é com o petróleo", diz Vale.

"Esta é uma década do petróleo e não deveria ser assim. Há um interesse claro do governo no mercado de óleo e gás e isso causa incômodo devido à necessidade de acelerar a transição energética", completa.

O especialista ressalta que esse é um movimento observado não apenas no Brasil, mas no mundo. Ele cita como exemplo o fato de a COP28, conferência do clima da ONU que aconteceu em 2023, ter sido sediada em Dubai, com forte presença de representantes das indústrias de carvão, petróleo e gás.

Além disso, ele diz que é bastante representativo o Brasil ter sido convidado para fazer parte da Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Aliados) durante a COP28.

O economista Nelson Marconi, coordenador executivo do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da FGV (Fundação Getulio Vargas), concorda com essa visão. Para ele, o petróleo e o setor primário como um todo devem seguir com um bom desempenho em 2024.

Mesmo com a esperada desaceleração no crescimento econômico da China, Marconi salienta que isso não significa que o PIB (Produto Interno Bruto) do país vai contrair. Portanto, mesmo com um arrefecimento na atividade econômica, o gigante asiático vai continuar consumindo matérias-primas do Brasil, dando suporte para as exportadoras de commodities.

Nessa esteira, Marconi diz que o agronegócio deve seguir relevante para o PIB brasileiro, embora com uma participação bem menor devido à expectativa de impactos climáticos, inclusive por causa do fenômeno El Niño, sobre a próxima safra.

Para os especialistas, será difícil o Brasil repetir o desempenho do agro de 2023, com uma supersafra esquentando a economia. Até mesmo por isso, o mercado espera um PIB bem menor em 2024. Enquanto para 2023 a expectativa é de um PIB com corescimento de 3%, para 2024 os analistas projetam em média 1,5% de crescimento.

Se, por um lado, os produtos básicos ainda devem ser destaque na economia, a indústria de transformação seguirá sofrendo os impactos dos juros altos neste ano. Marconi diz que, mesmo que a taxa básica de juros Selic caia para o patamar de 9%, os juros reais ainda serão altos e inviabilizarão resultados fortes do setor.

O economista lembra que a reforma tributária, promulgada na última quarta-feira (20), vai beneficiar a indústria, mas apenas no longo prazo. Os impactos da medida não vão ser sentidos imediatamente. Além disso, a indústria não desfruta de financiamentos e tantos subsídios como outros setores da economia.

Somado a isso, ainda há incertezas sobre a economia da Argentina com o novo governo do ultraliberal Javier Milei. O país vizinho é o principal destino dos produtos manufaturados do Brasil e as exportações para lá podem diminuir este ano.

Ainda assim, o economista Maílson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria e ex-ministro da Fazenda, acredita que a indústria vai reverter a queda de 2024 e "deixar de ser, pela primeira vez em dois anos, o patinho feio do PIB brasileiro". O economista projeta um crescimento de 2,2% neste ano da indústria em geral, com impulso da indústria extrativa, que engloba petróleo e minério de ferro.

Além da indústria, Maílson enxerga uma recuperação dos setores que dependem do crédito devido ao ciclo de corte da taxa Selic ao longo de 2024.

Embora o especialista espera um leve aumento do desemprego em 2024, projetando uma taxa de 8,2% ao fim do ano, o especialista acredita que haverá aumento da renda média dos trabalhadores. Esse fator somado a uma queda na inadimplência em curso deve beneficiar alguns segmentos ligados ao consumo.

Ele cita como exemplos a construção civil ?cujas vendas estão ligadas a financiamentos e taxas mais baixas atraem os consumidores?, a comercialização de veículos e de bens eletrônicos e móveis.

Maílson também aposta em um aquecimento do segmento de construção pesada, com a injeção de capital estimulado pelo novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

No lado dos serviços, os especialistas projetam um ano fraco. Tirando o segmento de informática, que deve continuar pujante em 2024, segundo Marconi, o setor vai desacelerar por conta do arrefecimento do agronegócio no Brasil e pela normalização da demanda, após o "boom" causado pela reabertura da economia no pós-pandemia.


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