BRASÍLIA, DF, RIO DE JANEIRO, RJ E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O recuo do governo na ofensiva para emplacar o ex-ministro Guido Mantega na presidência da Vale foi negociado com o conselho de administração da companhia, que acenou com outro cargo ao indicado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A desistência de Mantega foi antecipada pela coluna Painel. O movimento é uma sinalização para a mineradora privada escolher outro nome para o cargo de presidente, sem reconduzir Eduardo Bartolomeo, cujo mandato termina em maio.

A notícia aliviou investidores, que temiam pela ingerência política na companhia. As ações da Vale chegaram a subir mais de 2% durante o pregão desta sexta-feira (26). Fecharam em alta de 1,66%.

Uma ala do conselho da empresa entende que é melhor negociar um candidato de consenso, em nome de um bom relacionamento com o governo. Por isso, o processo de sucessão na companhia, que deveria ser concluído em janeiro, foi suspenso.

A avaliação da gestão Bartolomeo por comitê interno, que deveria recomendar ou não sua recondução, nem sequer chegou a ser concluída na reunião desta semana. A sucessão também não será debatida pelo conselho na próxima semana, como era esperado.

A troca no comando da Vale se tornou uma obsessão do presidente da República, que vinha pressionando pela indicação de Mantega.

Na quinta-feira (25), Lula chegou a criticar a gestão da companhia em redes sociais, ao mesmo tempo em que a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, defendia Mantega, também em postagem na internet.

Nesta sexta, Gleisi voltou a se manifestar sobre o caso, lembrando uma multa bilionária aplicada à Vale e a BHP pela tragédia de Mariana (MG), em 2015, e classificando como manipulação e preconceito contra Lula e Mantega notícias que vinculavam a queda das ações da empresa ao risco político.

A reportagem apurou que o recuo é resultado de conversa entre Lula e o presidente do conselho de administração da Vale, Daniel Stieler.

No encontro, Stieler teria comunicado ao presidente da República que Mantega não seria eleito pelo conselho atual.

O próprio ex-ministro já se sentia incomodado com a exposição pública de seu nome em um processo sem garantia de resultado positivo.

Lula decidiu, então, voltar atrás. Porém, ele mantém negociações para um cargo para Mantega na diretoria ou em subsidiária da empresa.

O governo ainda quer ter influência na escolha do novo presidente da Vale. Dependente de decisões de ministérios e autarquias federais para suas operações, a mineradora entende que compensa ter um nome com bom trânsito político.

Nos últimos dias, surgiu o nome de Murilo Ferreira, que foi eleito para a presidência da mineradora em 2011 com o apoio da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). O ex-presidente da Cosan, Luiz Henrique Guimarães, é outro citado como candidato.

O processo de sucessão na companhia deve se estender pelo mês de fevereiro: se o conselho decidir pela troca no comando, o estatuto da Vale prevê a contratação "de empresa de padrão internacional, reconhecida por sua expertise na seleção de executivos globais" para indicar candidatos.

A palavra final sobre o novo presidente é do conselho de administração, que é composto por 13 membros, a maior parte deles sem ligação com grandes acionistas.

Apenas Previ (com duas cadeiras), Bradesco e a japonesa Mitsui (com uma cadeia, cada) têm representantes no conselho. Uma quinta vaga considerada não independente pertence a representante dos empregados da companhia.

Procurado no início da noite, por intermédio de sua assessoria, a Presidência da República não havia se manifestado até a publicação deste texto.

Apontado como um dos negociadores do governo e entusiasta da indicação de Mantega, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, negou nesta sexta que Lula estivesse tratando de sucessão na mineradora.

"O presidente Lula nunca se disporia a fazer uma interferência direta em uma empresa de capital aberto, listada em bolsa, uma corporation, que tem a sua governança e a sua natureza jurídica que deve ser preservada", afirmou. "Até porque o Brasil é um país que respeita contrato, que tem regulação estável", disse.

Silveira aproveitou a entrevista coletiva na frente do ministério para negar que ele mesmo tenha tratado de qualquer indicação à Vale em conversas com os conselheiros da empresa com quem tem contato.

"Eu, em nenhum momento, fiz uma referência de indicação do governo a nenhuma vaga da Vale. Nenhuma. Nenhuma", afirmou.

Gleisi, no entanto, havia saído em defesa de Mantega. Segundo ela, injustiças teriam sido cometidas contra o ex-ministro em relação à sua responsabilidade na recessão iniciada no fim do governo Dilma.

"Pouquíssimos brasileiros são tão qualificados quanto Guido Mantega para compor o conselho da Vale, uma empresa estratégica para o país e na qual o governo tem participação e responsabilidades, mesmo depois de sua privatização danosa ao patrimônio público", escreveu a petista no X (antigo Twitter).

Já Lula criticou a gestão da mineradora. "Hoje faz 5 anos do crime que deixou Brumadinho debaixo de lama, tirando vidas e destruindo o meio ambiente. 5 anos e a Vale nada fez para reparar a destruição causada", escreveu.

A indicação de Mantega era vista como uma tentativa de ingerência do governo em uma empresa privada.


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