SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Uma das joias da coroa para mostrar ao mundo as conquistas de desenvolvimento da China." É assim que a CRRC apresenta os trens de alta velocidade que saem de suas fábricas.
O tom grandioso e nacionalista no site da empresa não é à toa. Controlada pelo governo chinês, a companhia é a maior fabricante de suprimentos ferroviários do mundo, com 180 mil funcionários e 46 subsidiárias.
Nesta quinta-feira (29), a gigante estatal saiu vencedora do leilão do trem que vai ligar São Paulo a Campinas, em um consórcio encabeçado pela Comporte, holding brasileira ligada à família Constantino, fundadora da Gol.
O projeto prevê investimentos de R$ 14,2 bilhões e, além da criação do expresso de média velocidade, também inclui a implementação de um "trem parador" de Jundiaí a Campinas e a concessão da linha 7-rubi da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).
Embora a Comporte tenha maior participação no consórcio (60%), o peso do grupo fica por conta da gigante chinesa, que já teve conversas com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) para instalar uma fábrica de trens em São Paulo.
Com sede em Pequim, a CRRC tem rendimento anual na faixa dos R$ 170 bilhões, segundo dados de 2023 da revista Fortune. A companhia tem contratos de venda com países como Alemanha, Suíça e Japão, e é fabricante de trens usados nos Estados Unidos, México, Portugal e Turquia. Nos últimos anos, saiu vencedora de leilões para construir linhas de metrô em Medellín e Bogotá.
No Brasil, a CRRC forneceu os trens para o metrô e Supervia do Rio de Janeiro e também será responsável pelos novos trens da linha 15-prata do metrô de São Paulo.
Mas além de acumular contratos, a CRRC também vem enfrentando turbulências. A principal delas acontece nos EUA e vem se arrastando desde 2019.
Durante o governo do então presidente Donald Trump, o Congresso americano aprovou uma legislação proibindo que agências de trânsito usem recursos federais para comprar vagões fabricados por estatais chinesas.
O projeto ganhou apoio bipartidário dos parlamentares, que temiam que vagões "inteligentes" pudessem espionar atividades militares ou roubar dados de americanos pelo Wi-Fi.
Segundo o jornal The Washington Post, a CRRC foi um dos motivos para a criação lei, já que a estatal chinesa era uma das concorrentes em contratos de metrôs importantes, como o de Washington D.C.
A possibilidade de a companhia levar o contrato levantou preocupações em membros do Congresso de que os trens pudessem ser construídos com capacidades para o governo chinês espionar a capital dos EUA.
O movimento, contudo, também foi atribuído por alguns especialistas ao objetivo de Trump punir Pequim por taxas impostas a empresas americanas e pela redução do investimento chinês no país.
Entre 2014 e 2016, a CRRC ganhou uma série de contratos para fornecer trens para locais como Chicago e Los Angeles. O gigante chinês montou inclusive fábricas nos EUA para atender aos pedidos.
De acordo com o Washington Post, críticos diziam que as vitórias da companhia só ocorriam por causa dos subsídios fornecidos por Pequim, que lhe permitia superar os preços dos concorrentes.
Na ocasião, a CRRC contestou a afirmação, dizendo que as propostas que perdeu eram prova de que não pretendia monopolizar os mercados. A empresa ainda chamou a acusação de espionagem de "ridícula", afirmando que nunca controlou nenhum de seus carros depois de entregue.
Recentemente, foi a vez de a União Europeia iniciar sua ofensiva contra o grupo. Em fevereiro deste ano, o bloco começou a investigar a CRRC mirando os subsídios chineses. O processo pode, inclusive, impedir a empresa de ganhar um contrato na Bulgária.
A assessoria da CRRC não foi localizada pela reportagem para comentar.
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