SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A forte reação do mercado em relação às ações da Petrobras um dia após à divulgação de seus resultados de 2023 mostra preocupação dos investidores com as escolhas da estatal na alocação de recursos no futuro, segundo especialistas consultados pela reportagem.
Na noite de quinta (7), a petroleira anunciou que encerrou 2023 com lucro líquido de R$ 124,6 bilhões. O resultado -o primeiro da gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT)- representa uma queda de 33,8% em relação aos R$ 188,3 bilhões de 2022.
O mercado abriu nesta sexta-feira (8) com as ações da petroleira derretendo mais de 10%.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, criticou em sua conta do X (ex-Twitter) a ênfase dada à queda no lucro da Petrobras.
"Manchetes gritam que o lucro da Petrobras caiu 33% no primeiro ano de Lula, mas escondem que o resultado foi até melhor que o das petroleiras gringas. Lucros da Chevron, da Shell e da ExxonMobil caíram entre 35% e 40%. O que houve no mundo do petróleo em 2023 foi um retorno aos preços praticados antes da guerra da Ucrânia, mas querem é falar mal do Lula. Não é ignorância, é má-fé", escreveu.
No entanto, segundo relatório do Itaú BBA, os resultados da Petrobras vieram em linha com as estimativas do banco. A grande decepção do mercado foi a falta de distribuição de dividendos extraordinários.
"A Petrobras informou que destinou R$ 43,9 bilhões (US$ 8,9 bilhões) do lucro remanescente do exercício para suas reservas de capital, devolvendo apenas os dividendos ordinários neste trimestre. Os investidores esperavam que a empresa fosse cautelosa em relação ao pagamento de dividendos extraordinários, mas o consenso era que seria algo em torno de US$ 3 bilhões a US$ 5 bilhões", diz o relatório do banco.
Em caso de aprovação pelo conselho da Petrobras dos proventos anunciados, a companhia pagará dividendos totais de R$ 72,4 bilhões em relação ao exercício do ano passado, sendo que o mercado esperava um valor na casa dos R$ 90 bilhões.
Segundo os analistas do Itaú, o desapontamento deverá acrescentar preocupações entre investidores sobre a alocação de capital da empresa no futuro.
Para o economista Adriano Pires, o primeiro ano da estatal sob a gestão de Lula foi bom. Pires -que chegou a ser indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a presidência da Petrobras mas acabou não assumindo- lembra que o mercado esperava mudanças "desastrosas" na companhia que acabaram não se concretizando, como na política de preços dos combustíveis.
Contudo, ele acredita que 2023 foi um ano atípico para o perfil de uma gestão petista. Neste ano, Pires diz que os contornos traçados para a Petrobras durante a campanha eleitoral de Lula estão ganhando forma.
"Parece que a empresa está caminhando para voltar à gestão do PT no passado, durante o governo de Dilma Rousseff, quando a companhia mais agradava o governo do que os acionistas".
O economista enxerga a Petrobras tirando o foco da exploração do petróleo de novo, para voltar a investir em refinarias, aquisições e outros projetos que podem comprometer a lucratividade da empresa.
"Parece que a petroleira está começando a abrir mão da disciplina do capital como antes, numa volta ao passado que preocupa os investidores", afirma Pires.
Já o economista André Roncaglia, professor de economia da Unifesp, doutor em economia do desenvolvimento pela FEA-USP, acredita que a atual gestão da Petrobras está buscando um equilíbrio entre os interesses público e dos acionistas.
"O atual governo mudou definitivamente a gestão da companhia. Claro que o mercado teria uma resposta negativa à retenção dos dividendos, porque os investidores têm uma visão mais de curto prazo", diz.
Roncaglia enxerga a Petrobras iniciando uma gestão com um olhar maior para o longo prazo, ao tirar o foco unicamente da exploração de petróleo e investir em projetos como o de energias renováveis, refinarias e fertilizantes.
"A Petrobras é a maior empresa do Brasil. Então ela não pode responder unicamente aos interesses financeiros", afirma.
Para o economista, o movimento das ações da Petrobras deve se normalizar aos poucos e ser mais afetado pelos preços internacionais do petróleo do que pelos ruídos políticos.
Em relatório publicado nesta sexta (8), o BTG Pactual reiterou recomendação de compra para a ação da Petrobras. O banco reconheceu que, embora os dividendos estejam de acordo com o que tem sido anunciado para a nova política de remuneração da petroleira, foi decepcionante até mesmo para os investidores mais pessimistas.
Mas os analista do BTG Pedro Soares, Thiago Duarte e Henrique Pérez citaram a falta de certeza sobre o destino da quantia retida na reserva de capital e disseram que, para utilizá-la para outro fim que não a remuneração de acionistas, será preciso alterar o estatuto da companhia.
"Embora não pensemos que isso possa ser descartado, também pensamos que é possível uma reavaliação da decisão de não distribuir dividendos extras", dizem, acrescentando que os mecanismos de governança corporativa da Petrobras devem prevalecer.
Em teleconferência de resultados da Petrobras, nesta sexta-feira, o diretor financeiro e de relacionamento com investidores da companhia, Sergio Caetano, afirmou que os dividendos extraordinários da estatal retidos no ano de 2023 serão utilizados exclusivamente para dividendos.
"Essa reserva não será destinada para investimentos. Não é para acordo tributário. Para fusão. Não está destinada para tapar prejuízo, que não está no cenário", afirmou. "Foi destinada para dividendos e será usada para dividendos".
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