LUSAIL, QATAR (FOLHAPRESS) - A cada lance importante, eles se manifestavam. Quando era a Argentina no ataque, ouvia-se vaias. Quando a Arábia Saudita cruzava o meio de campo, gritos de incentivo. Foi assim durante o jogo todo. Um show à parte.
A mudança de postura dos jogadores sauditas depois do intervalo foi determinante para a vitória. Mas não dá para desconsiderar o papel dos torcedores do país do Oriente Médio, que, se não estavam em maioria no estádio Lusail nesta terça-feira (22), ao menos faziam seus cânticos ecoarem de tal forma que contagiaram o time em campo.
Com o triunfo de virada, por 2 a 1, veio o momento de euforia. "Para nós, essa vitória é como o 7 a 1 da Alemanha sobre o Brasil. Era difícil imaginar aquilo, como é difícil imaginar o que nós vivemos aqui hoje", disse Feras Alghamdi, 27.
"Eu não sei se vamos passar da fase de grupos. Mas essa vitória já é uma emoção incrível. Estou chocado", acrescentou Aziz Alkhareef, 29. Em sua sexta participação em Mundiais, os sauditas buscam repetir o feito de seu ano de estreia, em 1994, quando chegaram às oitavas.
Por isso os dois amigos mal conseguiam conter a emoção para falar. O semblante deles refletia a alegria dos milhares de sauditas que estão no Qatar para acompanhar a Copa do Mundo.
Segundo o Comitê Supremo para Entrega e Legal, os torcedores da Arábia Saudita são os que mais compraram ingressos para o torneio. Ao longo da competição, são esperados mais de 500 mil visitantes do país que faz fronteira com os qatarianos.
A presença deles nas arquibancadas do estádio Lusail é um marco na reaproximação dos sauditas com o Qatar. Isso só voltou a ser possível desde o ano passado, quando a Arábia Saudita anunciou a reabertura de suas fronteiras com o vizinho depois de três anos de rompimento das relações entre as nações do Oriente Médio.
"Desde que as fronteiras foram abertas, é incrível voltar aqui. Tenho amigos que moram aqui e é bom poder revê-los", diz Raed, 33, gerente de vendas. Ele preferiu não dizer seu sobrenome, enquanto um amigo ao lado dele o orientava sobre quais perguntas da reportagem ele deveria responder.
A Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Bahrein e o Egito passaram a impor embargos diplomáticos, comerciais e de viagens ao Qatar em meados de 2017, quando acusaram o vizinho de apoiar o terrorismo. Os bloqueios, no entanto, também foram vistos como uma tentativa de punir os qatarianos por sua proximidade com o Irã.
Em 2019, por exemplo, o Qatar também foi a sede do Mundial de Clubes. Na ocasião, o Al-Hilal representou a Arábia Saudita na competição, mas mesmo com o clube jogando a poucos quilômetros de sua casa, contou com poucos torcedores em seus jogos, incluindo a semifinal contra o Flamengo e a disputa do terceiro lugar contra o Monterrey, do México.
A reaproximação das duas nações foi considerada uma das últimas vitórias do governo do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump. O republicano concentrou seus esforços em aproximar os países árabes de Israel e, desta forma, isolar ainda mais os iranianos.
Apesar de pequeno, com um território de 11.437 km², menor do que o estado brasileiro de Sergipe, o Qatar tem uma grande importância estratégica internacional como um dos países mais ricos do mundo. A riqueza vem de sua produção de gás natural, reserva que compartilha com o Irã.
A potência muçulmana xiita é a principal rival regional da Arábia Saudita, governada por mulçumanos sunitas.
Além disso, os EUA mantêm cerca de 10 mil militares no emirado, onde possuem uma base aérea. O pacto estimulado pelo governo americano foi chamado de Acordo do Século. Trata-se de um plano para acabar com anos de conflitos no Oriente Médio, porém é visto como uma ação pró-Israel, pois desconsidera diversas reivindicações da Palestina.
Foi com esse pano de fundo que os sauditas organizaram uma grande festa em Lusail. Acostumados a dominarem as arquibancadas em todos os jogos da Argentina, os hermanos também perderam essa batalha.
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