SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Alarmado com a derrota no primeiro jogo da final do Campeonato Paulista, Abel Ferreira traçou uma estratégia para a partida de volta. O plano passou por arriscar a estreia na Copa Libertadores, exigir mais do elenco do ponto de vista motivacional, produzir um vídeo a ser mostrado aos jogadores e, claro, analisar de maneira obsessiva o que o Água Santa poderia fazer e qual seria a resposta.

O resultado foi a goleada do Palmeiras por 4 a 0 no último domingo (9), no Allianz Parque, e a conquista de mais um título paulista. Foi o terceiro do clube nos últimos quatro anos. É o período mais vencedor da equipe no Estadual desde os anos 1990, quando foi campeã em 1993, 1994, 1996, com derrota para o Corinthians na final de 1995.

"[Os atletas] não encararam [o Água Santa] como um adversário que poderia nos bater, e precisávamos de um banho de humildade para pisar na Terra. O treinador, também. Não somos invencíveis e hoje fomos muito melhores. Meus jogadores aprenderam essa lição", disse o técnico após o título e antes de ter a entrevista interrompida pelos atletas, que jogaram água gelada na cabeça do chefe.

Não foi o placar o que mais irritou Abel, embora sua personalidade compulsiva não engula resultados negativos. O problema foi a apatia mostrada pelo Palmeiras no revés por 2 a 1 na partida de ida. A formação de Diadema poderia ter vencido por uma diferença maior. No Allianz, o Palmeiras dominou as ações e teve chance para obter uma goleada mais elástica.

Em reunião com a presidente Leila Pereira depois da queda em Barueri, o português manifestou o interesse em levar para a Bolívia um time reserva. A proposta era, claro, poupar os titulares para os 90 minutos que decidiriam o troféu estadual. Estava implícito haver o risco de derrota na altitude de La Paz e de começar mal a Copa Libertadores.

Leila apoiou a ideia e disse que, se houvesse alguma polêmica, ela assumiria 100% da responsabilidade pela derrota. O Palmeiras perdeu por 3 a 1, mas as cobranças de torcedores e conselheiros não chegaram. Isso serviu para estreitar a relação entre treinador e mandatária.

O trabalho com os titulares, a semana inteira, não se baseou exatamente nos erros cometidos no primeiro jogo da final contra o Água Santa. Segundo pessoas ligadas aos jogadores, Abel foi de propósito na jugular. Repetia que a atuação havia sido inaceitável do ponto de vista anímico e que aquilo não poderia se repetir. Um dos mais exigidos foi Gabriel Menino.

No jogo de volta, o meio-campista foi um dos melhores em campo. Fez dois gols e participou de outro. Tornou-se uma ameaça ofensiva constante.

"Ele é um jogador extraordinário, com capacidade incrível, mas não pode ter moral. Tem de estar sempre com a faca aqui", explicou Abel, apontando com o dedo para o próprio pescoço.

Os que foram cobrados responderam. Quem recebeu palavras de incentivo, também. Endrick teve um de seus melhores desempenhos pela equipe profissional. Não apenas fez um gol mas correu o tempo inteiro, também a ajudar na marcação. Na etapa complementar, deu um carrinho forte em Thiaguinho, do Água Santa, quase na entrada da área de defesa, e recuperou a bola para iniciar um contra-ataque.

Para turbinar a motivação, Abel conversou com sua comissão técnica e, com ela, idealizou um vídeo exibido antes da saída da Academia de Futebol para o Allianz Parque.

A TV Palmeiras foi responsável por colocar em prática o projeto do técnico: familiares dos atletas foram levados ao centro de treinamento e, posicionados em locais estratégicos do complexo, filmados usando máscaras dos rostos dos próprios jogadores. Pais, irmãos, filhos e mulheres gravaram mensagens de incentivo e de amor.

Os integrantes do elenco levaram os parentes ao CT para o que seria a gravação de um vídeo para o clube, mas não tinham ideia do que se tratava. Quando as imagens foram mostradas, minutos antes da ida ao estádio, alguns deles choraram.

O sucesso veio, mas com desgaste. Abel Ferreira confessou não saber até quando vai conseguir levar isso adiante porque constatou, para surpresa de zero pessoa, quanto seu trabalho o consome.

"Minha mulher diz que tenho menos cabelo e que os fios estão brancos. Não sei se ela vai deixar continuar muito mais. Fui fazer exames há três meses, e deu arritmia no coração. Nunca havia tido isso na vida", disse.


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