RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - A Ferj (Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro) diz que alertou sobre os riscos no jogo entre Brasil e Argentina, realizado na noite desta terça-feira (21) no Maracanã. Em uma reunião no dia 16 de novembro, a federação classificou a partida como bandeira vermelha na escala de risco. O órgão afirma, porém, que o alerta foi ignorado pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol).
Uma briga entre torcedores atrasou o início do jogo. A confusão ocorreu no setor sul inferior e começou durante o hino da Argentina, tocado antes do brasileiro. Segundo relatos de quem estava no estádio, torcedores brasileiros vaiavam enquanto a canção era apresenta.
Não havia no setor divisão entre as torcidas, apesar da rivalidade histórica entre brasileiros e argentinos. Fotos e vídeos da confusão mostram pessoas com sangramentos no rosto e na cabeça após confronto com policiais.
Ao todo, 17 pessoas foram encaminhadas ao posto do Juizado do Torcedor e Grandes Eventos no Maracanã, conforme informou a Justiça do Rio. Eles firmaram um acordo para o pagamento de multa por terem provocado tumulto e praticado desacato, resistência, furto, entre outros crimes.
Segundo o Tribunal de Justiça, apenas um torcedor, Roberto Jefferson Gomes Peixoto, foi punido com medida cautelar de afastamento dos estádios e comparecimento ao juízo. A reportagem ainda não conseguiu localizar a defesa dele.
Uma torcedora argentina também foi presa sob suspeita de injúria racial por ter chamado uma mulher de "pedaço de macaco". Na manhã desta quarta-feira (22), a Justiça decretou a prisão preventiva de Maria Belen Mautecci. A reportagem também não conseguiu contato com os advogados dela.
A reunião em que a Ferj alertou sobre os riscos da partida contou com a presença de, além da CBF, representantes do Consórcio Maracanã, que administra o estado, do Ministério Público, da Polícia Militar, da Secretaria de Ordem Pública, da Guarda Municipal, da Defensoria Pública, do Juizado do Torcedor e de outros órgãos públicos responsáveis pelo entorno do Maracanã. A ata dessa reunião foi divulgada primeiro pela ESPN e confirmada pela reportagem.
Esse tipo de reunião é comum para definir como será a organização e a segurança do jogo. No entanto, segundo a federação estadual, o alerta de bandeira não foi levado a sério pelas autoridades presentes.
No dia seguinte à reunião, o presidente da Ferj, Rubens Lopes da Costa Filho, emitiu comunicados ao Ministério Público, ao Juizado Especial do Torcedor e ao Consórcio Maracanã afirmando que qualquer questionamento sobre o jogo entre Brasil e Argentina deveria ser direcionado diretamente à CBF. Desde então, diz a federação, o órgão não participou de mais nenhuma conversa sobre a partida.
"Vimos informar que a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro não recebeu nenhuma atribuição da Confederação Brasileira de Futebol no sentido de exercer qualquer atividade ou função referente à organização/operacionalização da partida", diz o comunicado enviado pelo presidente da Ferj.
Ele completa: "No caso em questão, toda a responsabilidade operacional, de segurança, tributária, financeira e qualquer outra cabe única e diretamente à CBF".
A CBF, por sua vez, afirmou que o plano operacional para a partida foi aprovado sem qualquer ressalva ou recomendação em uma reunião feita na última segunda-feira (20), em que participaram representantes do Consórcio Maracanã, da PM, da Conmebol e de demais empresas que atuam no estádio. A Ferj não participou desse encontro.
Inicialmente, a CBF havia dito que a organização do Maracanã estava por conta do consórcio que administra o estádio. Depois, em nota divulgada nesta madrugada, disse que "o planejamento da partida foi realizado de forma cuidadosa e estratégica pela CBF, em conjunto e em constante diálogo com todos os órgãos públicos competentes, especialmente a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro".
A confederação ainda afirmou que a torcida mista era de conhecimento da PM e das demais autoridades públicas e que ela é o "padrão em competições organizadas pela Fifa e pela Conmebol".
A nota da CBF também cita a reunião do dia 16, da qual a Ferj participou e fez o alerta sobre a bandeira vermelha. A confederação, no entanto, não fala sobre os riscos que foram apontados. Sobre as alegações da federação estadual, o órgão afirma que são declarações políticas feitas por um grupo contrário à atual gestão da CBF.
O Consórcio Maracanã e o Ministério Público ainda não responderam sobre as reuniões e a falta de divisão das torcidas, apesar do alerta de risco. Já os órgãos municipais afirmaram que a atuação deles se limita ao entorno do estádio e que não possuem gerência do que acontece dentro do Maracanã.
A PM, por sua vez, disse que a falta de divisão das torcidas se deu pela venda de ingressos sem distinção, que foi definida pela organização do evento.
Em um novo posicionamento divulgado na tarde de quarta, a Polícia Militar informou que só foi informada de que não haveria divisão de torcida na reunião do dia 16. A corporação completa que, nessa data, as vendas do ingresso já tinham começado e os bilhetes estavam esgotados.
"No dia 16, todos os ingressos já tinham sido vendidos. É importante pontuar que, inicialmente, a venda para torcedores argentinos foi direcionada para o setor sul do estádio [local onde ocorreu o confronto entre torcedores]. Contudo, o setor acabou liberado para todos os torcedores, transformando a área, que deveria ser restrita, em arquibancada mista", disse a PM, em nota.
Rubens Lopes, presidente da Ferj, também é vice-presidente da CBF. Ele, no entanto, tem uma relação conflituosa com o atual mandatário da confederação, Ednaldo Rodrigues.
Na época da escolha do presidente da CBF, em março do ano passado, Lopes deu seu apoio a Rodrigues, que na época já ocupava o cargo interinamente. Eles, porém, romperam a relação e, desde então, o presidente da Ferj tem marcado uma posição contrária à CBF e criticado a gestão do ex-aliado, chamando-a de centralizadora.
Já a ala ligada a Rodrigues afirma que Lopes queria assumir a operacionalização do jogo no Maracanã, no lugar do consórcio que administra o estádio, para beneficiar a Ferj com ingressos e cargos para organizar a partida.
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