Ailton Alves Ailton Alves 8/9/2009


Gritos e sussurros

torcedor griandoAté mesmo para espantar a solidão da qual são vítimas, os goleiros gritam demais.

Se bem que, para falar a verdade, os goleiros gritam também clamando por ela, a solidão. Reparem, caros leitores: falta na intermediária do campo, a grande área está infestada de gente(os jogadores de linha), a bola é lançada e afastada por um zagueiro. E o goleiro desembesta a gritar “saí, saí”, como se dissesse: me deixem sozinho em minha ilha deserta.

Os goleiros gritam também por necessidade, desespero ou revolta.

Não faz muito tempo e Gonçalves, o arqueiro Carijó, estava nessa situação terceira, de gritar de forma revoltada. Calhou de estar, ele, naquela situação escrita por Handke e filmada por Wenders: a do medo do goleiro diante do pênalti.

A marca da cal num campo de futebol é algo muito próximo de um pelotão de fuzilamento. Fica lá, o artilheiro, dono absoluto da situação e da bola, a onze metros da rede, e um goleiro, abrindo os braços como se fosse Jesus Cristo chamando as criancinhas, acreditando piamente que consegue, assim, cobrir os sete metros (o latifúndio compreendido entre uma trave e a outra). Eles, os arqueiros, se mexem, se adiantam, olham nos olhos do algoz. Eles, os atacantes, têm 1.001 possibilidades, incluindo a terrível paradinha, que só existe para humilhar o colega de profissão.

Mas...estava a escrever sobre a situação vivida por Gonçalves, do Tupi, diante do Madureira. O Galo perdia o jogo por 1 a 0 e o time carioca tinha essa tal condição, de um pênalti a seu favor. O atacante chutou, o goleiro pegou e gritou – no caso, de felicidade.

Porém, não se passaram nem três minutos e a façanha de pegar o pênalti (e evitar que o placar ficasse mais dilatado) foi esquecida, pois a defesa bobeou e o Madureira fez o gol que estava mais fácil na jogada anterior. Gonçalves – não poderia ser diferente - gritou como se xingasse os próprios companheiros.

Então, os gritos dos goleiros são normais e compreensíveis.

O que não é comum é o silêncio deles – e pior, o murmúrio.

E não foi senão outra coisa o que aconteceu em Goiânia, no último sábado, na partida entre o Atlético Goianense e o Vasco da Gama.

Bem próximo ao final da partida, pênalti para o Vasco. Após as reclamações de praxe, a bola foi colocada na marca da cal e a grande área foi esvaziada para a cobrança do tiro livre. Tudo, enfim, seguia os trâmites legais. Até que se deu o inusitado: o goleiro, já postado debaixo da baliza, ao invés de esperar o fuzilamento, saiu da sua placidez e caminhou tranquilamente em direção ao árbitro. Poderiam, os torcedores, esperar qualquer coisa, até que ele agredisse o responsável por aquele seu momento de constrangimento. Mas, não. Contrariando todas as regras, até o manual de sobrevivência dos arqueiros, ele, o goleiro, de nome Márcio, sussurrou algo no ouvido do árbitro.

Nunca saberemos ao certo o que o goleiro sussurrou no ouvido do árbitro. O que ficou do episódio, no entanto, é que Márcio – que acabou se adiantando e pegando a penalidade - traiu a categoria, desde sempre propensa a gritar e não sussurrar.



Ailton Alves   é jornalista e cronista esportivo
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