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A política de Djalma Maranhão (1915-1971)

Cláudio de Oliveira - Novembro 2015
 

Dedicado à memória do jornalista Ticiano Duarte
No centenário do ex-prefeito de Natal cumpre ressaltar sua relevância política. Interlocutor de líderes nacionais como o presidente João Goulart e o governador de Pernambuco Miguel Arraes, Djalma Maranhão é lembrado pelo jornalista Marco Antônio Tavares Coelho, ex-deputado federal, em encontro na Cinelândia, Rio de Janeiro, em 14 de março de 1964, um dia depois do comício da Central do Brasil:
[...] deparei também com Djalma Maranhão[...]. Chamou-me porque desejava transmitir sua angústia a alguém da direção do PCB. Não me esqueço de sua figura e de seus gestos. Alto e gordo, moreno, deu-me a impressão de um urso ao caminhar em minha direção. Pegou em meu braço e com energia foi explodindo: "Vocês estão loucos? Não estão vendo que vamos ser liquidados?" Foi nesse diapasão que ele desfiou a análise de nossa marcha para o precipício. Contestei o que dizia. Entretanto, a força de seus argumentos era inegável. Registro essa opinião de Djalma Maranhão porque, antes do golpe de Estado, foi o único, dentre as pessoas com responsabilidade política, de quem ouvi um julgamento certeiro sobre a real situação que enfrentávamos [1].

Djalma se opunha à radicalização política de então, considerada artificial e sem apoio na sociedade. Talvez três fatos da juventude possam explicar suas posições moderadas. Em 1935, aos 20 anos, foi preso após o levante armado da Aliança Nacional Libertadora, organizada pelo antigo PCB. Mesmo comunistas como o pernambucano Cristiano Cordeiro, um dos fundadores do partido, recusaram-se a participar do movimento. Para ele, sem apoio popular seria uma ação de quartel sem chance de sucesso [2]. Em 1945, Djalma foi expulso do PCB, no qual ingressara ainda garoto, e não por acaso chamou a direção local de "aventureira" [3]. Antes, em 1939, havia participado da fundação do Diário de Natal junto com intelectuais de tendência liberal-democrática, com o objetivo de combater o nazifascismo na Europa e, implicitamente, de se opor à ditadura do Estado Novo no Brasil, implantada por Getúlio Vargas em 1937. As chamadas frentes únicas antifascistas eram entendidas como a união de todos os democratas com o objetivo de restabelecer a democracia.

Depois de obter a legalidade em 1945, o PCB teve seu registro cassado em 1947. Perseguido e jogado à clandestinidade, assumiu posições de extrema-esquerda. Fora do partido em 1945, Djalma tomou caminho oposto ao adotar uma postura mais ampla. Juntou-se então a Café Filho, que, entre 1954 e 1955, exerceu a Presidência da República. No leito do cafeísmo, que no Rio Grande do Norte exerceu um papel progressista, Djalma se elegeu deputado estadual em 1954, pela Aliança Social Progressista, formada entre o PSP e o PTN. Pelo acordo do PSP com a UDN, que levou Café Filho a apoiar a eleição de Dinarte Mariz ao governo potiguar em 1955, Djalma foi nomeado prefeito de Natal em 1956.

Após o suicídio de Vargas em 1954 e a divulgação do relatório de Nikita Khruschev em 1956, no qual o novo líder soviético denunciou os crimes de Josef Stalin, o PCB reviu sua linha política sectária. Já em 1955, Luiz Maranhão, então o principal dirigente do PCB no estado, apoiou a candidatura a presidente de Juscelino Kubitschek, um liberal-democrata do centrista PSD, eleito em aliança com o PTB. Em 1958, o PCB adotou um caminho reformista ao atuar pelas reformas de base dentro do regime democrático e constitucional.

Com a nova política, no Rio Grande do Norte em 1960, o PCB participou da Cruzada da Esperança, a coligação vitoriosa que reuniu comunistas, socialistas, trabalhistas e liberais e que elegeu Djalma novamente prefeito de Natal e Aluízio Alves, dissidente da UDN, ao governo do estado. Em 1962, Djalma Maranhão filiou-se ao PSB, partido pelo qual pretendia se candidatar em 1965 ao governo do Rio Grande do Norte.

O clima de radicalização política nacional que se seguiu afastou os dois líderes. Djalma foi deposto pelo golpe de Estado de 1964 e obrigado ao exílio no Uruguai, onde morreu em 1971. Aluízio, apesar de ter apoiado a deposição de João Goulart, também foi vítima do regime autoritário. Em 1969, por força do AI-5, teve seu mandato de deputado cassado e seus direitos políticos suspensos por dez anos.

Luiz Maranhão, irmão de sangue e de ideias de Djalma, sobreviveu até 1974, quando foi preso no DOPS de São Paulo e torturado até a morte. Mas teve tempo suficiente para participar da organização do MDB em 1966, a frente democrática que, após uma longa resistência, conseguiu vencer o regime autoritário com a eleição de Tancredo Neves a presidente em 1985. Foi uma frente semelhante, o bloco progressista na Constituinte, sob o comando de Ulysses Guimarães, que nos legou a Carta de 1988, a mais democrática e de mais garantias sociais de nossa história. Para reverenciar a memória de Djalma Maranhão em seu centenário, lembremo-nos da atualidade de sua política de união dos partidos democráticos com base em um programa comum de desenvolvimento nacional e de melhoria das condições de vida da população.

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Cláudio de Oliveira é jornalista e cartunista.

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Notas

[1] Tavares Coelho, Marco Antonio. Herança de um sonho. As memórias de um comunista. Rio de Janeiro: Record, 2000.

[2] Entrevista ao jornalista Ricardo Noblat. Pernambuco: Jornal do Commercio, 12 ago. 1979.

[3] Moacyr de Góes. De pé no chão também se aprende a ler. São Paulo: Cortez, 1991.

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Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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