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Corrupção: buraco sem limite?

Lúcio Flávio Pinto - Julho 2017
 


A revista Época considerou Aldemir Bendine o 32º brasileiro mais influente em 2009. Ele acabara de assumir a presidência do Banco do Brasil, onde trabalhava há 31 anos. O presidente Lula (no cargo havia seis anos) lhe deu a missão de recuperar a mais antiga instituição financeira do país. Na época, ainda o maior banco brasileiro (perdeu a posição a seguir para o Itaú).

Bendine se saiu tão bem que, quatro anos depois, o portal iG o elevou para a 11ª posição entre os mais poderosos. Já a revista Istoé Dinheiro lhe deu o título de empreendedor do ano nas finanças nacionais. Dois anos depois, a presidente Dilma Rousseff o designou para a maior empresa do Brasil, a Petrobrás.

Na época, ele teria que fechar o balanço do segundo semestre de 2014, que a PriceWaterhouse se recusara a avalizar sem a inclusão do prejuízo de 6,2 bilhões de reais causado pela corrupção dentro da companhia, que resultara no início da Operação Lava-Jato, em março de 2014. Bendine fechou as contas, com o maior prejuízo da história, de R$ 21 bilhões.

Fez um emocionado e emocionante discurso saudando a nova fase, que voltava a dar dignidade à empresa e aos seus funcionários. A fase negra passara, assegurou ele, do alto dos seus 50 anos e 37 vida pública como técnico, formado em administração pela PUC do Rio.

Teria continuado à frente da Petrobrás se a presidente Dilma Rousseff não tivesse sido derrubada pelo processo de impeachment. Saiu da Petrobrás quando Michel Temer assumiu a presidência da república. Ainda assim, Bendine podia ter se aposentado com uma biografia brilhante e digna.

Ao invés disso, ontem ele foi preso pela Polícia Federal. Ficará em prisão temporária por cinco dias, por ordem do juiz Sérgio Moro, no 42º capítulo da Lava-Jato. Uma versão inteiramente oposta à da história oficial de Bendine circulava pela força-tarefa da LJ havia mais de dois anos.

A história se baseava nos depoimentos de Marcelo Odebrecht e de um importante executivo da sua empresa, Fernando Reis. Em delação premiada, eles admitiram que pagaram propina a Bendine, depois de tentarem resistir a investidas que ele vinha fazendo para receber dinheiro ilícito.

Primeiro, se oferecendo para facilitar o refinanciamento de dívida de subsidiária da empreiteira. Depois, no golpe mortal, ameaçando prejudicar a empresa junto à Petrobrás, com quem ela mantinha alguns dos seus maiores contratos.

Bendine começou a receber o pagamento parcelado (de 15 em 15 dias) dos três milhões que a Odebrecht finalmente aceitou lhe fazer um mês depois de assumir a presidência da estatal do petróleo e antes da cena armada para demarcar a volta da Petrobrás a um padrão de decência. Nessa época, o nome dele já estava na agenda das investigações. Era certo que a polícia chegaria a ele.

Chegou ontem pelo receio de que ele fugisse para o exterior, aproveitando-se da condição de filho de italianos (como outro integrante do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato). Bendine estava com passagem marcada para Portugal hoje.

Será que um cidadão com a trajetória do ex-presidente de duas instituições tão poderosas como a Petrobrás e o Banco do Brasil, que decide sobre centenas de milhões ou mesmo bilhões de reais, é capaz de se sujar por fração desse volume de dinheiro e pôr a perder o conceito (mesmo que falso, mas com aceitação pública) criado ao longo de quase quatro décadas de vida?

Impressionante e assustadora se tornou a corrupção no Brasil. Espantosa, se a versão que levou Bendine à cadeia for mesmo a verdadeira. Uma corrupção cujo fundo não tem fim. Quanto mais se cava, mais fundo surge. Nesse ritmo, até onde irá o Brasil para identificá-la e colocá-la sob um padrão de dignidade autêntico, não a simulação de Bendine & Cia?

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Lúcio Flávio Pinto é o editor do Jornal Pessoal, de Belém, e do blog Amazônia hoje – a nova colônia mundial. Entre outros, é autor de O jornalismo na linha de tiro (2006), Contra o poder. 20 anos de Jornal Pessoal: uma paixão amazônica (2007), Memória do cotidiano (2008) e A agressão (imprensa e violência na Amazônia) (2008).

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Fonte: Jornal Pessoal & Gramsci e o Brasil.

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