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Revendo o futuro

Fausto Matto Grosso - Novembro 2020
 

Na semana passada andei lendo diversos artigos e análises de cenários para 2022. Quase tudo que se escreveu terá que ser reescrito. Costuma-se dizer que as eleições municipais pouco dizem sobre a política nacional, que existe autonomia entre elas. Mas 2020 foi diferente: no conjunto dos resultados tivemos um verdadeiro tsunami político.

Antes, grande parte dos cenaristas colocava como incertezas críticas a situação de Bolsonaro e do PT e faziam as hipóteses de fortalecido/enfraquecido para cada um desses protagonistas. Acontece que esses atores saíram quase descartados como polos de aglutinação de forças. Deixaram de ser polarizadores.

Bolsonaro anunciara que não apoiaria nenhum candidato. Isso poderia ter sido feito, principalmente porque era um presidente sem partido. Mas acabou se metendo com candidatos fracos, derrotados ou prestes a sê-lo. Saiu menor do que entrou. O Centrão tornou-se maior do que ele.

Considerando o número de prefeituras conquistadas, saíram fortalecidos partidos tradicionais de direita e centro-direita, como MDB - embora em tendência de queda -, PP, PSD, DEM, PL, todos com expressivo crescimento. O protagonismo que tinha Bolsonaro pode se transferir para esse bloco, com destaque para o DEM, em processo de expressiva recuperação, vencedor em três das seis capitais que encerraram a eleição em primeiro turno: Salvador, Florianópolis e Curitiba. O DEM também disputa com favoritismo no segundo turno do Rio de Janeiro. Além de presidir a Câmara dos Deputados e o Senado, é umas das opções de filiação de Luciano Huck.

Já na esquerda e centro-esquerda, reina a divisão. O PT, que era a sua coluna vertebral, acumula derrotas desde 2016. Na sociedade foi duramente atingido pelos escândalos de corrupção e, na dinâmica das relações com outros partidos do seu campo, foi vítima do seu próprio hegemonismo. Este partido tem dificuldade de aceitar parceiros, apenas apoiadores. É ilustrativo disso o seu conflito com Ciro Gomes em 2016. O seus tradicionais aliados têm buscado voo próprio, como o PSB, o PCdoB e o PDT, mas todos ficaram enfraquecidos na última eleição. Saíram menores do que entraram.

No campo da esquerda, apareceu como novidade o PSOL, surgido como uma dissidência de esquerda do PT em 2004, por discordância com a linha do partido. Nesta eleição o PSOL destacou-se ao levar Guilherme Boulos para o segundo turno em São Paulo.

PSOL e Cidadania, na esquerda, foram os únicos partidos que cresceram em 2020.

O primeiro pode repetir a trajetória do PT, mas parte de uma posição ainda muito débil nacionalmente. Boulos pode repetir Lula, mas ainda precisará de tempo para ampliar sua musculatura partidária. Na eleição de São Paulo, o PSOL mostrou um discurso mais moderado, o que lhe abre perspectiva mais promissora.

O Cidadania, sucedâneo do PCB e do PPS, tem avançado na perspectiva de articulação com os movimento cívicos, tendo incorporado várias lideranças desses, com ajuda de Luciano Huck. Podem vir daí inovações na estrutura dos partidos com repercussões no arranjo partidário brasileiro.

Em síntese, o projeto Bolsonaro foi derrotado fragorosamente e o Partido dos Trabalhadores deixou de ser um polo dinâmico de esquerda brasileira. Os cenários de 2022 precisam ser reescritos.

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Engenheiro e professor aposentado da UFMS

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Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil

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