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Revolta estudantil: na exata medida?

Lúcio Flávio Pinto - Junho 2007
 

As três universidades estaduais de São Paulo - USP, Unicamp e Unesp - constituem um oásis no panorama do ensino superior brasileiro: têm autonomia financeira real. Para os seus orçamentos são drenados, desde 1989, 9,57% da arrecadação do ICMS de um Estado que concentra um terço da riqueza nacional. São quatro bilhões de reais ao ano, metade para a mais antiga e famosa, a Universidade de São Paulo, e a outra metade partilhada quase igualitariamente entre a Universidade de Campinas e a Universidade do Estado de São Paulo. Nesse dinheiro ninguém tasca. Como nas três universidades há 170 mil alunos matriculados, o investimento resulta em R$ 24 mil por aluno (custo mensal de R$ 2 mil per capita).

Como, então, os estudantes partiram para uma manifestação de protesto tão drástica, ocupando, há três semanas, o prédio da reitoria da USP e lá se mantendo como se estivessem em estado de guerra? Porque um decreto de março do governador José Serra teria violado a autonomia universitária, atrelando as universidades a uma nova secretaria, de ensino superior, e transferindo-lhe o poder de movimentar as rubricas orçamentárias, que antes era dos reitores.

O ato teve, de fato, visível caráter concentrador, tecnocrata e autoritário. Mas não era total e, agora, não é mais decisivo, embora persista (parece que houve preocupação de curto prazo e estreita visão na sua formulação, fomentando divergências na sua interpretação). O novo secretário já não é mais, automaticamente, o presidente do Cruesp, o conselho dos reitores, como foi tentado. Voltou-se à situação anterior, de ocupação do cargo por um dos três reitores. A autonomia financeira foi mantida integralmente como era. A mudança que ficou - e veio para melhorar as coisas - foi a da alimentação diária, em tempo real, do Siafem, o sistema de todas as contas públicas. O fornecimento dos dados era mensal, desde 1997, o que causava uma permanente defasagem de 30 dias entre o ato e o seu registro. Agora a transparência é imediata, facilitando o controle público.

Nenhuma das situações, mesmo as reais, justifica a radicalidade do movimento dos estudantes da USP, a não ser que os motivos preponderantes sejam outros e, a distância dos acontecimentos, eles sejam invisíveis, mesmo ao observador mais atento. As universidades paulistas são privilegiadas pela vinculação dos seus recursos à maior fonte de receita pública, o ICMS. Têm que corresponder a essa condição excepcional prestando contas à sociedade, que lhes assegura esse benefício. O elemento mais benéfico nessa história é a informação. Quanto mais abundante e confiável ela for, melhor. Ao outro lado do país, e ao lado mais sacrificado, o impulso dos estudantes da USP chega com um halo de épater la bourgeoisie. Antediluviano, pois.

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Lúcio Flávio Pinto é o editor do Jornal Pessoal, de Belém, e autor, entre outros, de O jornalismo na linha de tiro (2006).



Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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