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Linhagens do pensamento político

Brasílio Sallum Jr. - Outubro 2007
 

Gildo Marçal Brandão. Linhagens do pensamento político brasileiro. São Paulo: Hucitec, 2007.

Linhagens do pensamento político brasileiro é um grande livro. A um só tempo é uma contribuição inestimável ao estudo do "pensamento sociopolítico" brasileiro - pujante área de investigação das ciências sociais - e densa reflexão sobre o Brasil.

Seu tema está posto já de início com todo o vigor. Trata-se de examinar a possibilidade de distinguir no Brasil famílias intelectuais, famílias que se conservam na história brasileira como linhagens de idéias, sem que na maioria das vezes os seus próprios autores, os intelectuais que as produzem, tenham tido consciência de seu parentesco.

Gildo Marçal Brandão desenvolve sua perspectiva de análise, de um lado, contra o historicismo, que circunscreve e isola cada obra e cada autor nas suas circunstâncias, e, de outro, contra o idealismo culturalista, que imagina estar a história intelectual brasileira presa a matrizes ideológicas ‘transepocais’ vigentes desde a Ibéria da época dos descobrimentos. O pressuposto do Autor é que "nenhuma grande constelação de idéias pode ser compreendida sem levar em conta os problemas históricos aos quais tenta dar respostas e sem atentar para as formas específicas em que é formulada e discutida; ao mesmo tempo que nenhuma grande constelação de idéias pode ser inteiramente resolvida em seu contexto".

Nesta linha ele sugere, reelaborando sugestão de Oliveira Vianna, que desde o século XIX o pensamento político brasileiro vem se alinhando em torno de duas grandes linhagens, a do idealismo orgânico e a do idealismo constitucional. E que nos anos 1950 elas passaram a dividir o espaço intelectual com o marxismo de matriz comunista, sugerido por ele mesmo em obra anterior, sobre a trajetória do Partido Comunista Brasileiro, e com o radicalismo de classe média, identificado por Antonio Candido.

Note-se que tais linhagens têm data. Com efeito, a hipótese que se explora no livro é que as linhagens mencionadas são produtos de certas formas históricas e não que derivam de uma espiritualidade especial presente desde sempre por estas bandas a partir da construção da primeira feitoria.

É claro que não é tarefa fácil examinar uma hipótese como esta. Exige domínio sobre uma vasta bibliografia, produzida ao longo de mais de século, e sobre a história brasileira desde a independência. O Autor não se gaba disso, mas o leitor atento não deixará de notar a facilidade e o brilho com que transita pela história do pensamento sociopolítico brasileiro, chamando a atenção dos que o acompanham para afinidades e contrapontos entre autores e idéias, contemporâneos ou distanciados no tempo. Trata-se, pois, de uma reflexão sobre o Brasil que honra a universidade.

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Brasílio Sallum Jr. é professor titular de Sociologia da Universidade de São Paulo.



Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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