Por que os casados "também" devem praticar o
sexo seguro?

Repórter: Ana Maria Reis
15/02/2001

Não leve a AIDS para casa foi o tema da última campanha nacional do Governo, lançada em dezembro de 2000, para o controle da epidemia. Questionável ou não (as ONG´s a consideram desrespeitosa e machista), ela ampara o fato inegável de que o padrão epidemiológico da AIDS mudou. A mudança mais significativa ocorreu no avanço da doença entre as mulheres. No Brasil, entre elas, o crescimento da AIDS é nove vezes maior que entre os homens.

 

Não existe o grupo, mas sim, o comportamento de risco
Sabe-se que conter uma epidemia é um problema de grande proporção. Já a transmissão do vírus HIV é um problema ainda de maior grau, pois sua principal via de contágio é um assunto delicado para a maioria da população: a sexualidade do indivíduo. "Além de ser uma epidemia recente, o problema de saúde pública que se tornou a AIDS choca-se com o caráter comportamental de risco", explica a coordenadora do Centro de Orientação e Apoio Sorológico (COAS/JF), Maria Luiza Stheling. Para ela, a grande dificuldade está em lidar com os tabus, valores pessoais, familiares, ético-morais de cada indivíduo a apresentar o comportamento de risco.

"Sim, comportamento de risco, porque não se pode falar em grupos, já que todas as categorias sexuais estão expostas à transmissão da doença",explica Stheling rechaçando a expressão muito utilizada anteriormente "grupo de risco". Nos centros de apoio ao paciente soropositivo, é trabalhado o conceito de que risco é risco e que ele precisa ser graduado. "Ninguém quer desestimular as relações, mas pôr fim ao contato de líquido com líquido", fala a coordenadora do COAS/JF sobre o papel fundamental dos preservativos no trabalho de contenção da epidemia. "Fazer sexo sem preservativo é um comportamento de risco gravíssimo", finaliza.

Risco é risco, e ele pode estar
dentro de casa

Em 1985, para cada 99 homens infectados, havia uma mulher contaminada. Passada uma década, essa relação caiu para uma mulher infectada para cada 4 homens, em média. Estes números não se restringem ao Brasil, mas aos demais países tidos como "em desenvolvimento". Mas, afinal, quem está levando a AIDS para dentro de casa?

Para as ONGs/AIDS do país, a culpa não é só do "marido infiel" como deixa suspeitar a recente campanha nacional do Governo. No site www.aids.org.br, o Fórum de ONGs do Estado de São Paulo, que congrega mais de 50 grupos, mantém uma página-protesto contra as campanhas publicitárias do Ministério da Saúde. De acordo com o que foi escrito na carta, a campanha Não leve a AIDS para casa é machista porque considera que a população feminina é incapaz de adotar medidas de sexo seguro.

A coordenadora do Centro de Orientação e Apoio Sorológico (COAS/JF), Maria Luiza Stheling, fala que tratar da possibilidade de AIDS dentro de uma relacionamento estável, seja em um casamento ou namoro, onde normalmente são abertas concessões deste nível, é caminhar em um campo minado, onde várias questões estarão em jogo. "Primeiramente, a auto-estima do casal, depois a confiança mútua posta em xeque, o problema da auto preservação, passando pelo constrangimento da desconfiança, quando se pede para o parceiro usar preservativos ou fazer o teste de HIV", enumera Maria Luiza.

Lidar com a traição é o principal problema
entre casais em exposição ao HIV

Por que é ainda tão difícil convencer casais de que eles devem praticar o sexo seguro? "Por estarmos lidando com a possibilidade de um terceiro na relação", responde a coordenadora do Centro de Orientação e Apoio Sorológico, Maria Luiza Stheling. Mas se é impossível prever que um encontro amoroso extraconjugal aconteça durante uma relação estável, a prevenção continua sendo a melhor saída para os casais que vivem esta situação.

"O que dificulta é que normalmente o auto cuidado bate com o impulso, pois a sexualidade nem sempre é racional. Não são planejados, nem podem ser previstos os encontros amorosos. Somando o fato de que, a sedução, desejo e excitação fazem baixar o nível de consciência", analisa a Coordenadora que ainda adverte sobre o preconceito de que "o sexo seguro é considerado mecanicista e higiênico, algo que bate com o animalesco do desejo".

Diálogo ainda é a melhor forma de prevenção
A maior arma de quem trabalha com indivíduos expostos ao risco de contaminação da AIDS e outras DSTs é o diálogo. No Centro de Apoio e Orientação Sorológico, os casais são convidados a assitir palestras dentro de um trabalho educativo. As mulheres são aconselhadas a praticar sexo com preservativos e pedir aos parceiros que realizem o teste.

A realidade através dos números
De 75% a 85% das infecções se devem a relações sem proteção e quase três quartos dessas infecções são produto de relações heterossexuais. Muitas mulheres foram infectadas por maridos que não praticaram sexo seguro fora do casamento (e nem dentro).

Segundo o Ministério da Saúde, o número de casos de AIDS femininos acumulados no Brasil, entre 1995 e 1996, era de 1.978 - destes, 1.002 através de relações sexuais não protegidas.

Peste gay agora também é problema de marido e mulher
Descoberta em 1981, a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) ganhou as manchetes dos jornais sob o rótulo de peste gay. Entre 1980 e 1988, a participação proporcional das categorias de exposição homo e bissexuais era de 53,8%, passando, em 1990, para 26%.

Já a transmissão nas relações heterossexuais que representavam 3,1% dos casos notificados em meados da década de 80, em 1994, salta para 27%. Em Juiz de Fora, em 1987, para um caso feminino notificado, exitiam 7 masculinos. Dez anos depois, eram 94 casos masculinos de AIDS no município contra 48 femininos.

 


Outras informações no:
Centro de Apoio e Orientação Sorológica (COAS/JF)
Instituto das Clínicas
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Atendimento
De segunda-feira à sexta-feira, de 8h às 12h e de 13h30 às 17h30.
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