Papai tem que morar em outra cidade. E agora? Cada vez mais famílias passam por essa situação e
não sabem qual a forma correta de lidar com ela

Marinella Souza
*Colaboração
29/02/2008

Em um país constantemente em crise, onde as oportunidades estão cada vez mais limitadas, cada vez mais famílias têm que se separar e não sabem como lidar com a situação.

O engenheiro eletricista André Luiz Souza Dias da Silva sabe bem o que é isso. Há dez anos ele saiu de Juiz de Fora, sua cidade natal para tentar a vida na capital nacional. De repente, surgiu uma proposta irrecusável no Maranhão e a estabilidade da família se viu ameaçada pela primeira vez.

Com dois filhos em idades diferentes, André optou pela verdade. Com o mais velho, então com sete anos, ele conversou abertamente, mas a reação do garoto não foi das melhores.

"Eu falei para ele que estava indo para uma cidade que não conhecia e não sabia se tinha escola, hospital, médico, enfim, uma estrutura adequada para que ele, a mãe e a irmã de sete meses vivessem. Com isso, eles teriam que voltar para Juiz de Fora. Ele ficou estarrecido, sem saber o que dizer", relembra.

O pequeno Guilherme Guimarães Dias da Silva teve medo de nunca mais ver o pai e, embora aparentemente bem, começou a dar problemas na escola. A mãe Lílian Guimarães Dias da Silva recorda o período difícil. "Quando chegava a hora de ir para escola ele não queria ir. Estava tão abalado que chegava a passar mal de verdade e chorava muito. Foi preciso muita conversa e pulso firme para que tudo voltasse ao normal".

Foto da  família Com o olhar tristonho, o garoto, que está com 13 anos, admite que foi muito difícil ficar sem o pai. "Ele estava morando muito longe, só nos víamos de três em três meses e por poucos dias... eu sentia muita falta dele na hora das brincadeiras".

Apesar da pouca idade, a pequena Isabella, então com sete meses também sentiu os efeitos dessa mudança. "Quando eu chegava em casa ela estranhava, chorava, não queria vir no meu colo. Só se acostumava depois de muito tempo, e aí já estava na hora de voltar ao trabalho. Foi difícil, mas sobrevivemos".

Para a psicóloga Ana Stuart, todo esse processo, apesar de doloroso, foi muito importante para o crescimento interno dessas crianças. "Nós sempre ensinamos nosso filhos a viverem, nunca a perderem. A melhor forma de ensinar isso são nas pequenas perdas e nas mudanças".

Ana garante que André e Lílian fizeram o correto ao contar a verdade para os filhos. Segundo a psicóloga, por mais difícil que seja, o melhor caminho é contar a verdade, explicar os motivos da mudança e deixar claro que ela só está acontecendo pelo bem de todos.

Como lidar com a distância

Uma vez passado o impacto inicial, vem uma nova questão: como continuar participando da vida familiar e lidar com a distância de forma natural.

A receita da família Dias da Silva é simples: manter o diálogo sempre. Mesmo afastado, André mantinha contato com a mulher todos os dias e os pequenos sempre que queriam falavam com pai.

Em casa, o engenheiro se desdobrava para dar atenção aos três amores e ainda encontrava tempo para visitar os demais parentes. "O importante é estar sempre perto e saber dividir o tempo".

Foto de pai e filhos Mesmo sem saber, André agiu de acordo com o que Ana considera ideal. "Normalmente os pais voltam para casa cheios de saudade dos filhos e/ou da mulher e aí podem cair em duas situações: ou se dedicam integralmente aos filhos ou se esquecem deles para ficar só com a mulher. Nenhum dos dois casos é o melhor, tem que saber dosar".

Depois de terem se separado mais uma vez, a família Dias da Silva fixou pouso novamente em Juiz de Fora. André? Está no Rio de Janeiro e vem todos os finais de semana.

Já crescidas, as crianças entendem melhor a distância. O engenheiro conta que foi mais fácil contar para Isabella do que para o Guilherme. "Ela já está com seis anos e tem noção de tempo. Sabe que uma semana é pouco. Guilherme sofreu mais da primeira vez justamente porque passávamos muito tempo separados", acredita.

Relacionamento do casal

Se para as crianças não é fácil suportar a distância, para a mamãe também é bastante complicado. Mesmo sabendo que é para o bem do conjunto familiar, a saudade é um fator que pesa. "É difícil ficar longe, mas a gente tem que confiar e não perder o foco. Estávamos nos sacrificando para dar o melhor para nossos filhos".

Para André o segredo para o casamento se manter estável e o amor em alta, mesmo depois de tantas idas e vindas, continua sendo o diálogo. "A gente sempre conversa muito, todas as decisões são tomadas em conjunto e temos a certeza de estar fazendo o melhor para nossos filhos".

Foto do casal Com 15 anos de casamento eles apostam no bom humor para manter o ritmo da relação e não causar prejuízos. Estão sempre brincando, fazendo piadas um com o outro e isso ajuda a diminuir a distância.

André conta que optou por deixar a família na cidade por uma questão de segurança. "Apesar do Rio ser uma cidade com toda a infra-estrutura de que eles precisam, é muito violenta. Não podia arriscar. Aqui em Juiz de Fora, temos mais do que infra- estrutura, temos qualidade de vida e a ajuda do resto da família".

Apesar de não tomar nenhuma decisão sem antes consultar a esposa, André admite que, se a oportunidade fosse boa e ela não quisesse se mudar novamente, tentaria convencê-la, se não tivesse jeito iria mesmo assim pelo bem da família.

Embora cansada das mudanças, Lílian admite que faria o que for pelo bem dos filhos. "Se fôssemos só nós dois, iria com ele para qualquer lugar. Mas temos que pensar nos meninos, eles estão numa fase que não dá mais para ficar indo e vindo a toda hora".

Para manter a relação saudável, Ana dá a dica para as mulheres que se vêem obrigadas a se separarem de seus maridos por motivos de trabalho: "Ela também tem que saber dividir. Não pode ser boazinha demais e deixar o marido só por conta dos filhos, nem querê-lo só para si. È preciso muita maturidade para lidar com essa situação sem prejudicar a vida de casal e a familiar", arremata.

*Marinella Souza é estudante de Comunicação Social da UFJF


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