MADRI, ESPANHA (FOLHAPRESS) - Um sorveteiro chamou a atenção na Itália ao mostrar nas redes sociais, com voz embargada, sua conta de luz deste mês, quatro vezes mais cara que a do mesmo período no ano passado.
"Oi, pessoal. Eu estou desmoralizado, chocado. Hoje chegou o boleto de energia elétrica. Não preciso dizer nada. [Mais de] ? 5.000. No ano passado, no mesmo período, ? 1.370. E, em 2021, a energia já tinha aumentado", diz no vídeo Cristian Bulgarelli, da gelateria Punto Gi, da pequena Carpi, cidade de 71 mil habitantes na província de Modena.
Conforme Bulgarelli mostra, a conta de luz medida entre 1º e 31 de julho deste ano chegou com o valor de ? 5.128,99 (cerca de R$ 26,7 mil); em 2021, fora de ? 1.371,33 (R$ 7.140) para o mesmo período. "Isso apesar de ter gastado menos kWh agora", disse Bulgarelli à reportagem na tarde desta sexta (19).
Segundo os boletos, o kWh saltou de ? 0,09 para ? 0,53 no período de um ano, um aumento de 489%. "Vamos pagar. Vamos usar o dinheiro que estávamos economizando desde o início do ano."
A data de vencimento é na próxima terça (23) e o consumo está correto, segundo ele mesmo confirmou no relógio de eletricidade. O aumento de julho não foi uma completa surpresa para Bulgarelli: a conta de maio já havia chegado com quase o dobro do valor de 2021, cerca de ? 2.200 (R$ 11,5 mil); em junho, subiu para ? 3.300 (R$ 17,1 mil).
"Culpo o governo italiano, que não colocou limites de aumento às companhias de energia para proteger os cidadãos", diz. De fato, a gestão federal está pagando parte do pato da conta de Bulgarelli. "Alguns políticos estão usando meu post como propaganda. E estão levando minha voz à frente."
No momento, a Itália passa por (mais um) momento de fervura política, com eleições legislativas marcadas para o dia 25 de setembro ?nas quais a ultradireita poopulista, com Giorgia Meloni à frente, é a favorita para liderar uma coalizão.
"Recebi essa conta como consequência da minha atividade econômica, mas é um problema que todos os italianos estão enfrentando nesse momento", afirma o sorveteiro. Segundo ele, a repercussão do vídeo fez com que o jornal local e a Gazzetta di Modena criassem uma campanha de mobilização para auxiliar pequenos comerciantes da região.
"Nós, italianos, devemos nos unir para não deixar as coisas correndo nesse ritmo. É hora de se fazer ouvir. Fiz o vídeo como denúncia, não para ter desconto no boleto ou para fazer pessoas me ajudarem a pagar", esclarece.
O aumento nos custos de energia na Europa guarda ligação direta com a Guerra da Ucrânia ?como parte das sanções impostas à Rússia pela invasão do vizinho, a União Europeia acertou uma meta de redução na importação do gás e um embargo à compra de petróleo de Moscou.
Um dos efeitos dessa guerra secundária foi a inflação, que está comendo o salário da população em diversos setores. O índice anual na zona do euro em julho atingiu 8,9%.
Bulgarelli é um dos três donos da gelateria Punto Gi, que abriu em 2014 com os sócios Michele Sarda e Riccardo Ferreti. Além dos três, eles contam apenas com uma funcionária esporádica, porém registrada.
O trio cobra ? 21 (R$ 109) por quilo de sorvete e, segundo suas contas, produz cerca de 11 mil quilos nos seis ou sete meses em que a casa fica aberta por ano ?nas estações frias, ela não funciona. São 30 sabores e bolos de sorvete bastante caprichados.
O rapaz tem uma companheira, mas diz que não pensa em ter filhos com a situação econômica atual. "Para quem tem 30 anos na Itália e precisa se manter sem a ajuda dos pais, ainda pagar aluguel, é uma realidade muito difícil. Ter um filho hoje no país é um compromisso econômico muito pesado."
Ele nasceu numa cidadezinha próxima a Carpi e cresceu dentro da sorveteria de seus pais, a gelateria Punto G. "Colocamos a letra i a mais em Punto Gi para não ficar igual", diz ele, que explica a conotação sexual do nome de seu negócio. "É para ser reconhecido de forma fácil e cativante, com um sorriso."
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Colaborou Adriane Hagedorn
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