SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Líderes latino-americanos publicaram nesta quarta-feira (24) uma carta de apoio à vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner.

A defesa coletiva vem na esteira de um pedido de prisão de 12 anos para Cristina feio pelo promotor Diego Luciani na segunda (22), em processo no qual ela é acusada de chefiar um esquema de associação ilícita e fraude ao Estado no período em que foi presidente da República, entre 2007 e 2015.

Luciani também solicitou que Cristina seja inabilitada a concorrer a cargos públicos para o resto da vida e que sejam devolvidos aos cofres públicos 5,3 bilhões de pesos (R$ 200 milhões).

"Esta perseguição visa retirar Cristina Kirchner da vida pública, política e eleitoral, bem como enterrar os valores e ideais que ela representa, com o objetivo final de implementar um modelo neoliberal", lê-se na carta, assinada pelos presidentes do México, Colômbia e Bolívia.

A carta também foi assinada pelo presidente argentino, Alberto Fernandez, que disse na segunda que sua vice foi vítima de uma "perseguição judicial".

Apesar de não ter assinado o documento, Pedro Castillo, presidente do Peru, repostou a carta com a mensagem: "Minha solidariedade à vice-presidente da república irmã Argentina".

Gabriel Boric, presidente do Chile, também não assinou. A reportagem questionou sua assessoria sobre a ausência de seu nome, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

Cristina, uma das principais figuras políticas do país, lidera a ala mais linha-dura da coalizão peronista de centro-esquerda que governa a Argentina desde o final de 2019.

O processo atual começou ainda naquele ano, e espera-se que os juízes emitam um veredito dentro de alguns meses. A vice-presidente, que também preside o Senado, goza de imunidade parlamentar que a protege tanto da prisão quanto da inabilitação política.

Uma sentença contra Kirchner só poderá se tornar efetiva caso seja ratificada pela Suprema Corte ou se ela perder a imunidade parlamentar. De todo modo, Cristina poderia apelar de qualquer veredito, possivelmente atrasando a decisão final por anos.

Também foram pedidas penas entre 5 e 12 anos para outros 12 acusados, entre eles o ex-ministro Julio De Vido e o empresário Lázaro Báez, que foi beneficiado por concessão de obras sem licitação nos governos de Cristina e de seu antecessor e marido, Néstor Kirchner.

À crise política se soma a econômica, com uma inflação local de 70% nos últimos 12 meses, valor recorde dos últimos 30 anos. A previsão é que chegue a 90% até o final do ano, o que faz com que o país tenha o ritmo mais alto de aumento de preços do continente, superando até mesmo a Venezuela.

Esses números, no entanto, podem ser conservadores porque, a partir de setembro, estão previstos aumentos nas tarifas de energia elétrica, gás e água. Calcula-se que a inflação possa chegar a 300%. Outro elemento que deve alimentar o aumento de preços é uma aguardada desvalorização do peso argentino.

A crise fez com que o presidente argentino criasse um "superministério" da Economia, que ganhou esse nome por agregar as pastas de Economia, Desenvolvimento Produtivo e Agricultura e Pesca, antes independentes. Fernández nomeou para chefiar a pasta o advogado Sergio Massa, que em seguida anunciou um pacote de medidas para tentar dar estabilidade ao país, em difícil situação cambial e inflacionária.

Mais do que recuperar a economia, a Casa Rosada espera que a mudança possa representar também uma salvação para seu governo. Impopular, o presidente Alberto Fernández se vê mergulhado em uma profunda crise política que o separa de sua vice em uma disputa por poder.

Nessa tensão, Cristina tem levado a melhor: foi dela a indicação de Massa para o superministério. Segundo analistas, Massa agirá como uma espécie de primeiro-ministro, respondendo a Cristina e, na prática, coroando o escanteamento de Fernández.

A vice-presidente, porém, sempre foi crítica de políticas de ajuste fiscal no governo. Ela não foi à cerimônia de posse de Massa no início de agosto.


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